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10/07/2006 - 08h30

Expulsão na final mancha carreira vitoriosa de Zidane

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THIAGO ARANTES
da Folha Online

Um cartão vermelho, erguido pelo árbitro argentino Horácio Elizondo aos 5min do segundo tempo da prorrogação, encerrou a carreira do francês Zinedine Zidane, 34. Melhor jogador de uma geração que deu ao país seu único título mundial, o meia saiu de cena na final da Copa do Mundo-06, depois de agredir o zagueiro Marco Materazzi com uma cabeçada.

Em seu último jogo como profissional, "Zizou" tinha tudo para escrever mais uma página gloriosa. Independentemente do resultado da partida --que terminou empatada e teve a vitória da Itália por 5 a 3 nos pênaltis--, era favorito para receber o prêmio de melhor jogador do Mundial.

Com a expulsão, a segunda de Zinedine em Copas, a França perdeu seu líder. Superior durante todo o segundo tempo, a equipe de Raymond Domenech criava melhores oportunidades de gol e o camisa 10 organizava as ações do meio campo. Foi de Zidane o último gol da equipe no Mundial: de pênalti, aos 7min da etapa inicial.

A derradeira imagem do jogador, se dirigindo cabisbaixo rumo ao vestiário, tem ares de anticlímax e mancha uma trajetória que começou no subúrbio da cidade francesa de Marselha, no início dos anos 80.

Filho de imigrantes argelinos, o jovem Yazid --seu nome do meio, pelo qual era mais conhecido na infância-- foi vítima do preconceito dos colegas franceses. Para driblar esta barreira, valeu-se das coincidências que o ligavam a um jogador.

Pela origem norte-africana e pelo sobrenome, passou a dizer que era primo de Djamel Zidane, atacante da seleção argelina que derrotou a Alemanha por 1 a 0 na Copa do Mundo de 1982. Credenciado pelo "parentesco", Zinedine ganhou o respeito dos garotos da região e ganhou lugar nos times infantis.

Foi no bairro de classe média de La Castellane que Zidane deu seus primeiros dribles e fez os primeiros gols. O sonho distante de tornar-se um jogador profissional começou a tomar contornos de realidade no fim de 1986. Aos 14 anos, em um torneio escolar, o garoto chamou a atenção de Jean Varraud, olheiro do Cannes, clube modesto que se revezava entre a primeira e a segunda divisão do país.

Entusiasmado, o caça-talentos convidou Zinedine para fazer um teste na equipe. Depois de ser aprovado, o jovem deixou a família e mudou-se para a capital do cinema europeu, mais famosa por seu festival de filmes do que propriamente pelo futebol ali praticado.

Em Cannes, Zidane foi "adotado" por Jean Claude Elineau, diretor do clube. Apostando no talento que tinha em suas mãos, o dirigente hospedou o jovem jogador em sua casa e pagou suas despesas.

O bom desempenho de Zinedine nas categorias de base o levou, aos 16 anos, em 1988, ao time profissional. A estréia, sob o comando do treinador Luis Fernandéz --ex-jogador da seleção francesa-- aconteceu no dia 20 de maio de 1989, contra o Nantes.

Embora tivesse seu talento reconhecido pela equipe, o jovem foi lançado aos poucos no time profissional. O primeiro gol só aconteceria quase dois anos depois da estréia, em fevereiro de 1991, também diante do Nantes. Seu esforço foi reconhecido pelo presidente do clube, Alain Pedretti: Zidane ganhou seu primeiro carro.

Durante o restante daquele ano, já titular e destaque da equipe, o meia começou a despertar o interesse de clubes mais tradicionais. A melhor proposta foi do Bordeaux --que acabara de voltar à primeira divisão e tentava se reerguer após três títulos na década de 80. Seduzido pela possibilidade de atuar em um clube de maior projeção, Zinedine deixou Cannes ao lado de Véronique, sua noiva, com quem se casaria em 1993.

Na chegada em Bordeaux, o meia conheceu dois de seus maiores amigos e companheiros na carreira: o atacante Christophe Dugarry e o lateral-esquerdo Bixente Lizarazu. A equipe apostava no talento dos três jovens para voltar às conquistas que marcaram os anos anteriores.

Zidane firmou-se no time e ajudou na campanha do quarto lugar na temporada 1993/1994. Aos 21 anos, tornou-se forte candidato a uma vaga na seleção da Argélia, que não se classificara para o Mundial dos Estados Unidos. Com ascendência argelina, poderia defender a equipe sem problemas. Mas o treinador Abdelhamid Kermali não atendeu aos apelos de torcedores e imprensa. Disse que o jogador era "lento demais", e não o convocou.

Se os argelinos não o queriam, aos franceses Zidane muito interessava. Após o fracasso da geração de Eric Cantona e Jean Pierre Papin --que não conseguiu a classificação para a Copa de 1994-- a seleção nacional passava por uma reformulação para não repetir o fiasco no torneio que organizaria, quatro anos depois.

Aimé Jacquet, que acabara de assumir o cargo, apostou nos jovens para montar sua equipe. Entre as caras novas estava o promissor meia do Bordeaux. A estréia na seleção nacional, no dia 17 de agosto de 1994, diante da República Tcheca, teve contornos históricos.

Aos 18min da segunda etapa, os franceses perdiam por 2 a 0. Foi então que Jacquet colocou o reserva Zidane em campo. O meia entrou, marcou duas vezes e empatou o jogo. Começou ali a trajetória que só se encerraria neste 9 de julho de 2006.

Com lugar garantido na seleção, faltava no currículo uma campanha memorável à frente do Bordeaux. Quis o destino que a trajetória vitoriosa não acontecesse no campeonato francês, mas na Copa da UEFA, segundo torneio mais importante do continente europeu. O vice-campeonato de 1996 --com derrota para o poderoso Bayern de Munique na final-- abriu o mercado para os jogadores da equipe.

Dugarry acabou contratado pelo Milan, Lizarazu transferiu-se pra o Atlético de Bilbao e Zidane aceitou uma proposta de 3 milhões de libras (12 milhões de reais) para defender a Juventus, mais vencedora equipe do futebol italiano.

Comandado por Marcello Lippi --técnico da seleção italiana na Copa-06-- o time de Turim deu a Zidane seu primeiro título importante como profissional: o Mundial Interclubes de 1996. As conquistas na carreira passariam a ser comuns dali em diante, a começar pelo bicampeonato italiano e a Supercopa da Itália.

Na seleção, Zinedine tornou-se o principal organizador das jogadas no meio-campo e era o maior candidato a ídolo na era pós-Platini. A boa campanha na Eurocopa-96 --quando a equipe foi eliminada pela República Tcheca nas semifinais, nos pênaltis-- mostrou que a nova geração organizada por Aimé Jacquet estava no caminho certo.

A expectativa e a pressão por um bom desempenho no Mundial de 1998 eram enormes. E, aos 26 anos, Zidane sentiu o peso de carregar a equipe nas costas. Depois de uma performance regular na vitória por 3 a 0 sobre a África do Sul, chutou um saudita no segundo jogo da primeira fase. Expulso, foi suspenso por dois jogos e só voltou a campo nas quartas-de-final, diante da Itália.

Em um dos jogos mais tensos do Mundial, contra os tricampeões, começou a exercer o papel de líder. Depois de um empate sem gols no tempo regulamentar e na prorrogação, foi o primeiro a pegar a bola para a decisão por pênaltis. Depois de converter sua cobrança, assistiu à vitória por 4 a 3, que levou os franceses à semifinal.

O melhor desempenho de Zidane naquele torneio ficou guardado para a decisão. Na final, contra o tetracampeão Brasil, marcou dois gols de cabeça --algo raro na carreira-- na vitória por 3 a 0, que deu o primeiro e único título ao país.

Dois anos depois, novamente sob o comando do meio-campista, a seleção da tradicional camisa azul conquistou, diante da Itália, o título da Eurocopa. O bom desempenho de Zinedine nas duas decisões, aliado às apresentações na Juventus, renderam ao jogador o prêmio de melhor jogador do mundo, dado pela Fifa, nas temporadas 1998 e 2000.

Em 2001, após cinco anos de conquistas no futebol italiano, foi comprado pelo Real Madrid. O valor da transferência, estimado em 66 milhões de euros (184 milhões de reais), foi o recorde envolvendo um jogador até então. Na Espanha, "Zizou" foi um dos pilares da construção dos chamados "Galácticos" --um projeto para ter uma equipe formada apenas por estrelas--, encabeçado pelo presidente do clube madrilenho, Florentino Pérez.

Na temporada 2001/2002, veio o único título que faltava na carreira internacional: o da Copa dos Campeões da Europa. Com um belo gol da entrada da área, Zidane selou a vitória por 2 a 1 sobre o Bayer Leverkusen.

Depois da alegria pelo título, veio o Mundial do Japão/Coréia, em que o meia passou alguns dos piores momentos de sua carreira. Machucado, viu os franceses perderem para o Senegal por 1 a 0 e empatarem sem gols com o Uruguai. No sacrifício, entrou em campo diante da Dinamarca, mas viu a seleção campeã mundial eliminada após nova derrota. A França deixou a Copa sem marcar gols.

O primeiro título espanhol pelo Real Madrid veio na temporada 2002/2003 e foi acompanhado por mais uma eleição como melhor jogador do mundo pela Fifa --a terceira de Zidane, recordista na honraria ao lado do brasileiro Ronaldo.

Na Eurocopa de 2004, Zidane afirmou que faria seu último torneio oficial pela seleção, aos 32 anos. A decisão foi reiterada após derrota para a Grécia, por 1 a 0, nas quartas-de-final.

O adeus transformou-se em "até logo" depois de um início claudicante dos franceses nas eliminatórias do Mundial da Alemanha. O time, comandado pelo desconhecido treinador Raymond Domenech, empatou sem gols em casa com Israel, Irlanda e Suíça. Preocupado com a situação da equipe e atendendo a pedidos de imprensa e torcedores, Zidane reavaliou sua decisão e ajudou na classificação para o torneio.

O meia preparou-se especialmente para a Copa do Mundo. Em abril, anunciou que se aposentaria do futebol profissional após o torneio. Na estréia, contra a Suíça, fez pouco: o placar de 0 a 0 refletiu a falta de ações ofensivas das duas equipes.

Diante da Coréia, novamente Zidane foi apagado. Só chamou a atenção por levar seu segundo cartão amarelo, o que o fez perder a partida contra Togo, última da primeira fase.

Na primeira partida da segunda fase, de volta à equipe, o meia começou a série de boas atuações que levaram os franceses à final. Contra a Espanha, comandou o meio campo ao lado de Vieira e fez o terceiro gol na vitória de 3 a 1.

Mas foi contra o Brasil, de quem já havia sido carrasco em 1998, que Zinedine fez aquela que é considerada sua melhor partida na seleção nacional. Aproveitando-se da apatia do adversário, dominou as ações, distribuiu "chapéus" e foi o autor do cruzamento para o único gol do jogo, marcado por Thierry Henry.

Na semifinal, diante da equipe portuguesa, foi menos brilhante mas igualmente decisivo e marcou, de pênalti, o gol da vitória por 1 a 0, que levou os franceses à segunda decisão de sua história.

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