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07/01/2007 - 11h20

Melhor do Brasil é o brasileiro de apito

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GUILHERME ROSEGUINI
MARIANA LAJOLO
da Folha de S.Paulo

Aos 14 anos, o garoto negro pulava os muros do que hoje é o estádio Anacleto Campanela, em São Caetano do Sul, nos fins de semana. Com barreiras da pista de atletismo, criava a quadra. E, raquete em punho, dava os primeiros golpes na bolinha.

Um dia foi pego em flagrante. Mas, em vez de broncas, recebeu convite para trabalhar e jogar de verdade. Começava ali a levar o tênis a sério.

Profissional, Carlos Bernardes ganhou o mundo e hoje se destaca no que faz. Alcança com freqüência as rodadas finais dos eventos e já decidiu um Grand Slam, série de torneios mais importante do tênis.
Não se trata, porém, de um novo Gustavo Kuerten ou de uma promessa capaz de tirar o tênis brasileiro do lodaçal.

Bernardes é árbitro. Sua biografia só mimetiza a de uma série de especialistas que brilham em esportes em que o país definha ou nem esteve na elite.

O tênis do Brasil, por exemplo, não tem hoje um atleta no top 100. Entre juízes, porém, Bernardes reina. Foi o primeiro estrangeiro a atuar em final de Grand Slam, nos EUA, em 2006 --antes a honra era de nascidos nos país-sede. Esteve também no histórico duelo do ex-número um do mundo Andre Agassi com James Blake em 2005.

"Estava 2 a 0 para o Blake, o público estava saindo quando o Agassi iniciou a reação. Parecia um jogo de futebol. Foi um delírio, o melhor jogo que já vi", diz. Bernardes começou por acaso, após curso em São Paulo, em 1986. Naquela época, poucos esportes investiam sistematicamente na arbitragem.

Ruben Marcio Dinard de Araújo, 59, seguiu o mesmo caminho. Em 82, via com o pai um torneio de natação. Um juiz faltou, e o responsável pelo evento chamou um conhecido do time de basquete do Fluminense para salvá-lo. Era Dinard. Hoje, ele ostenta no currículo dez Mundiais, cinco Pans e quatro Olimpíadas. De 1996 a 2000, respondeu pela arbitragem na federação internacional.

"Segui a regra sempre à risca, sem exceções, sem pensar se este ou aquele era ou não uma estrela. Por isso, eu me meti em polêmicas. E ganhei respeito." As tais polêmicas não são pequenas. No Mundial da Austrália-1998, desclassificou Scott Goodman nos 200 m borboleta. Favorito ao ouro, o australiano queimara a largada. Vaia geral das arquibancadas.

"A coisa esquentou, mas estava convicto", afirma.
A lista não pára por aí: os brasileiros Gustavo Borges e Fernando Scherer e Franziska Van Almsick, alemã recordista mundial, já foram suas vítimas.

Para esses árbitros, o sucesso no esporte foi fruto, sobretudo, de um esforço pessoal. Bernardes, por exemplo, bancava do próprio bolso idas ao exterior atrás de convites para atuar. Hoje, responde à ATP (Associação dos Tenistas Profissionais), no grupo da elite que reúne cerca de dez juízes.

O investimento específico na capacitação da arbitragem é um processo recente. O Brasil ficou 30 anos sem árbitros na federação internacional de remo. Em 2006, a confederação nacional resolveu transformar esse cenário, bancou cursos e capacitou voluntários. Cinco foram aprovados e podem atuar fora do país.

Na água, os resultados não são expressivos. Em Atenas-2004, o país nem sequer teve chance de lutar por medalhas.

No ciclismo, dois juízes têm status de "comissário internacional" e podem arbitrar grandes eventos. Na última Olimpíada, a melhor colocação de um brasileiro foi um 18º lugar. O basquete tem casos notórios dessa discrepância. Seu último grande feito foi o bronze feminino em Sydney-2000. Já juízes viram de perto momentos históricos do esporte.

Mas, mesmo para profissionais de elite como Dinard, viver da arbitragem não é fácil.

No Brasil, por exemplo, juízes de natação ganham cerca de R$ 250 por etapa em torneios. Em Olimpíadas e Mundiais, viagem, estadia e alimentação são custeada pela Fina, e recebem bolsa de US$ 1.800. O mesmo ocorre em outras searas.

"Na primeira viagem para os EUA, ficamos em seis no mesmo quarto para economizar", diz Bernardes, que, na época, praticamente não falava inglês. "Eu estava no banho e falei para um colega pedir sabonete na recepção. A camareira trouxe pratos de sopa. Ele confundiu soup [sopa] com soap [sabonete]", conta às gargalhadas.

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