27/09/2001
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04h36
Zizi Possi desliza entre a geleira e a perfeição no álbum "Bossa"
da Folha de S.Paulo
Bossa nova é o novo mote da cantora Zizi Possi, 45, após a conclusão de um exaustivo ciclo italianizado e o CD de revisão "Puro Prazer" (99). "Bossa", o novo disco, adota o nome e algo da retórica do movimento carioca da virada dos anos 50 para os 60.
É um meio mote (ainda bem), talvez destinado a atrair vendas de discos comparáveis às dos exaustivos CDs em italiano, beneficiados por novelas globais tipo "mundo cão" de Manoel Carlos. Em "Bossa", só "Caminhos Cruzados" (Tom Jobim-Newton Mendonça) diz respeito ao núcleo original da bossa nova.
De resto, Zizi faz versões elegantes, "soft", de canções de Djavan ("Capim"), Cazuza, Bebel Gilberto e Dé ("Preciso Dizer que te Amo", a mais convincente e aveludada do CD), Gilberto Gil ("Preciso Aprender a Só Ser"), Sergio Mendes ("So Many Stars", em arranjo de doer) e até Beatles ("Yesterday", arrastada e moldada no provincianismo de envernizar pop brasileiro de estúdio e músicos de orquestra britânicos).
Cantora que alternou fases bregas -talvez falsamente bregas- e chiques -talvez falsamente chiques-, Zizi ainda paga os dividendos daquela inconstância.
Parte do repertório de "Bossa" tende ao supermercado, naquele esquema "precisamos agradar a vários tipos de freguês". Por isso há duas desérticas canções em espanhol ("Sabrás que te Quiero" e "Yo Tengo un Pecado Nuovo"), flerte para, quem sabe, uma futura fase hispânica, pós-Itália... Por isso há uma inédita (e belamente interpretada) de Herbert Vianna ("Eu Só Sei Amar Assim"). Por isso há até uma segunda versão de "Preciso Dizer que te Amo", meio eletrônica.
É um exagero temático, e Zizi é, ainda hoje, uma cantora exagerada. Fez cama, nos últimos anos, por sobre uma inegável sofisticação, feita de habilidade vocal e obsessiva ênfase no "cool". Quer ser leve e diáfana ao absoluto, mas isso é um evidente exagero.
É preciso mirar o artista como semideus para admirar a Zizi que se construiu nos anos 90, ela parece mulher afeita à fleuma de deusa de perfeição. Para nem todos, no entanto, é possível crer em deuses aqui na Terra.
É a ambição ao sagrado o que, em Zizi Possi, continua a soar artificial - não sempre, mas, sim, em muitos momentos de "Bossa".
A artista borrifa a alma quente (que poderia jorrar, tal o alcance vocal que possui) com gelo picadinho, e elegância e sofisticação se consumam em tensão glacial. Menos nos arredios e arrepiantes gemidos de gata brava de "Preciso Dizer que te Amo". (PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Bossa Artista: Zizi Possi Lançamento: Universal Quanto: R$ 25, em média
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