31/10/2001
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10h55
Filme de Imamura explora sexualidade e fábulas da senilidade
TIAGO MATA MACHADO da Folha de S.Paulo
Taro é um intelectual à beira da mendicância que lega, em sua morte, uma obsessão aos amigos: encontrar o tesouro de sua juventude, uma estátua budista de ouro que ele roubou de um templo de Kyoto no pós-guerra.
Yosuke (Mitsu Aizawa), um arquiteto falido com tendência a perdedor, faz seu o sonho de Taro. Vai parar na vila indicada, onde espera encontrar o tesouro num pote escondido "na casa florida ao lado da ponte vermelha".
O tesouro que encontra, no entanto, é outro: uma mulher orgástica que, em seu gozo, ejacula um jato de água quente. Saída de um romance de Yo Henmi, Saeko (Misa Shimizu) é uma das personagens mais representativas da vazão de sexualidade e irracionalidade que a geração de Imamura proporcionou. Tal é a lição reichiana que Taro transmite a Yosuke: esqueça as trivialidades e se lance na lascívia; as pessoas desaprenderam a lidar com desejos.
Mas, enquanto sua geração, a da nouvelle vague japonesa, centrava-se nos "contos cruéis da juventude", Imamura nunca deixou de se preocupar com a velhice e de invocar as superstições de um Japão místico adormecido. Aos 75 anos, ele parece interessado no poder de fabulação da senilidade.
Eis o papel que desempenham os inúmeros velhos de "Água Quente sob uma Ponte Vermelha", entretidos em inventar e reinventar as histórias de suas vidas, poder de fabulação que também caracteriza o personagem do jovem atleta que treina na cidade. Este não fabula o passado, mas o futuro: quer ganhar uma medalha olímpica, ser presidente de seu país e ter Yosuke como ministro.
Seguindo a fabulação de Imamura, chegamos à "Odisséia": Yosuke é uma espécie de Ulisses que se deixou perder pela sereia. Mas tudo bem: sua Penélope, a mulher à espera, só quer o divórcio, e ele só quer mesmo saber da água quente de Saeko, a sereia cujo último namorado morreu misteriosamente afogado.
Água Quente sob uma Ponte Vermelha Direção: Shohei Imamura Produção: Japão/França, 2001 Quando: hoje, às 17h50, no Espaço Unibanco, e amanhã, às 18h40, no Cinearte
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