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20/06/2000
-
05h20
ALVARO MACHADO
da Folha de S. Paulo
João Silvério Trevisan tem um "passado de lutas" pela causa homossexual no Brasil, parte delas detalhada nas páginas de seu dossiê "Devassos no Paraíso", lançado originalmente em 1986 com 332 páginas e agora revisto, atualizado e relançado pela Record com 588 páginas profusamente ilustradas.
Tanto a trajetória pessoal como o talento de ficcionista de Trevisan colocam-no em posição privilegiada para levar a bom termo a tarefa a que se propôs em "Devassos": um exaustivo levantamento histórico do comportamento homossexual no país.
Mas existe o lado do militante apaixonado, que fez a publicação original inchar desmesuradamente com especulações sociológicas, julgamentos arriscados e batalhas contra moinhos de vento. Esse destempero desequilibra em especial os quatro longos capítulos de introdução às partes essenciais do livro _as narrativas sobre os tais "devassos no paraíso", ou seja, os europeus e americanos fascinados com a liberalidade de costumes sexuais nos trópicos, bem como a descrição de sua repressão, pela Inquisição ou pelo regime militar.
O patrulhamento algo "fóbico" do machismo brasileiro já existia no livro de 86, cujo capítulo dedicado ao teatro, por exemplo, diz que Oswald de Andrade debocha de homossexuais e que Nelson Rodrigues destila "paranóia homofóbica" em suas peças.
Apesar de iniciar o livro com citações de Pier Paolo Pasolini e com uma reflexão sobre o "homossexual sob controle da mentalidade empresarial", o autor comemora, à pág. 367, "a definitiva inserção de homossexuais no mercado", passando a enumerar triunfalmente fenômenos recentes provocados por uma liberalidade ligada à máquina do consumo. Isso quando sua própria compilação já fez ver que os séculos anteriores registraram atitudes sexuais que tornam brincadeira inofensiva a cultura homo atual.
Assim, as páginas mais contundentes localizam-se nos capítulos sobre as recuperações históricas. Entre elas, o caso do argentino Tulio Carella, que deu aula de teatro no Recife por um ano e foi expulso do país em 62. Admiráveis também são as páginas dedicadas à paixão suicida da paisagista Lota Macedo Soares pela poeta norte-americana Elizabeth Bishop, no Rio; à aventura do ator Carlo Mossy, que foi "animal de estimação" do lendário falsário Fernand Legros; ou ao caso do cantor George Michael com um fã brasileiro, morto em 93.
É uma lástima que a figura do editor esteja quase em extinção no Brasil: ele teria contido a ânsia enciclopédica do autor, evitando que se impingisse ao público as cansadas homossexualidades de Da Vinci ou Michelangelo ou a grosseria de certa teoria sobre o caráter homoerótico dos rituais cristãos.
Devassos no Paraíso
Autor: João Silvério Trevisan
Editora: Record
Lançamento: dia 24, a partir das 21h
Onde: Museu da Imagem e do Som (av. Europa, 158, São Paulo)
Quanto: R$ 50
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'Devassos no Paraíso': Trevisan alterna história e militância
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da Folha de S. Paulo
João Silvério Trevisan tem um "passado de lutas" pela causa homossexual no Brasil, parte delas detalhada nas páginas de seu dossiê "Devassos no Paraíso", lançado originalmente em 1986 com 332 páginas e agora revisto, atualizado e relançado pela Record com 588 páginas profusamente ilustradas.
Tanto a trajetória pessoal como o talento de ficcionista de Trevisan colocam-no em posição privilegiada para levar a bom termo a tarefa a que se propôs em "Devassos": um exaustivo levantamento histórico do comportamento homossexual no país.
Mas existe o lado do militante apaixonado, que fez a publicação original inchar desmesuradamente com especulações sociológicas, julgamentos arriscados e batalhas contra moinhos de vento. Esse destempero desequilibra em especial os quatro longos capítulos de introdução às partes essenciais do livro _as narrativas sobre os tais "devassos no paraíso", ou seja, os europeus e americanos fascinados com a liberalidade de costumes sexuais nos trópicos, bem como a descrição de sua repressão, pela Inquisição ou pelo regime militar.
O patrulhamento algo "fóbico" do machismo brasileiro já existia no livro de 86, cujo capítulo dedicado ao teatro, por exemplo, diz que Oswald de Andrade debocha de homossexuais e que Nelson Rodrigues destila "paranóia homofóbica" em suas peças.
Apesar de iniciar o livro com citações de Pier Paolo Pasolini e com uma reflexão sobre o "homossexual sob controle da mentalidade empresarial", o autor comemora, à pág. 367, "a definitiva inserção de homossexuais no mercado", passando a enumerar triunfalmente fenômenos recentes provocados por uma liberalidade ligada à máquina do consumo. Isso quando sua própria compilação já fez ver que os séculos anteriores registraram atitudes sexuais que tornam brincadeira inofensiva a cultura homo atual.
Assim, as páginas mais contundentes localizam-se nos capítulos sobre as recuperações históricas. Entre elas, o caso do argentino Tulio Carella, que deu aula de teatro no Recife por um ano e foi expulso do país em 62. Admiráveis também são as páginas dedicadas à paixão suicida da paisagista Lota Macedo Soares pela poeta norte-americana Elizabeth Bishop, no Rio; à aventura do ator Carlo Mossy, que foi "animal de estimação" do lendário falsário Fernand Legros; ou ao caso do cantor George Michael com um fã brasileiro, morto em 93.
É uma lástima que a figura do editor esteja quase em extinção no Brasil: ele teria contido a ânsia enciclopédica do autor, evitando que se impingisse ao público as cansadas homossexualidades de Da Vinci ou Michelangelo ou a grosseria de certa teoria sobre o caráter homoerótico dos rituais cristãos.
Devassos no Paraíso
Autor: João Silvério Trevisan
Editora: Record
Lançamento: dia 24, a partir das 21h
Onde: Museu da Imagem e do Som (av. Europa, 158, São Paulo)
Quanto: R$ 50
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