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07/08/2001
-
04h49
da Folha de S. Paulo
"As dúvidas crescem, não devemos duvidar, não queremos duvidar, queremos continuar com a crença intacta, a certeza, o ideal. Nas noites insones, nos contemplamos, Zélia e eu, um nó na garganta, vontade de chorar."
Jorge Amado e Zélia Gattai estão exilados em Praga, entre 1951 e 1952, quando começam a conhecer o terror stalinista. Isso acontece ainda antes que, já com Nikita Kruschev no poder na então União Soviética, a partir de 1953 e sobretudo após 1956, ele fosse divulgado ao mundo.
Em vários trechos de suas memórias, semiexpostas no livro "Navegação de Cabotagem", de 1992, Amado vai revelando a decepção com o comunismo e sobretudo com Josef Stálin, o "Zé dos Bigodes", como o apelidava o camarada Oscar Niemeyer.
Stálin era seu ídolo na época em que militou no Partido Comunista Brasileiro, entre meados dos anos 30 e 1955, quando pede sua desfiliação. "Fui stalinista de conduta irreprochável, subchefe da seita, se não bispo ao menos monsenhor, descobri o erro, custou trabalho e sofrimento, deixei a missa em meio, saí de mansinho", revisa ele em suas memórias.
"É uma questão geracional. Nos anos 30 há uma grande polarização entre a direita e a esquerda. Todo mundo toma partido, e há um enorme contingente de intelectuais que se liga ao Partido Comunista, não só Jorge Amado. Quando ele se decepciona, muitos se decepcionam também", diz o cientista social Albino Rubim, autor do livro "Marxismo, Cultura e Intelectuais no Brasil" (Edufba).
Militante aplicado, o escritor chegaria a se tornar deputado federal pelo Partido Comunista, e cassado dois anos mais tarde. A militância influencia a literatura: escreve "O Cavaleiro da Esperança" (1942), biografia de Luiz Carlos Prestes, e atinge o ápice em termos de engajamento em 1958, com a publicação da trilogia "Os Subterrâneos da Liberdade".
Embora afirmasse a "continuidade" de sua obra, o rompimento com o partido causaria uma guinada rumo ao início da carreira, quando a região do cacau e seus personagens eram o foco central de sua ficção. Surge então "Gabriela, Cravo e Canela" (1958).
Ao abandonar o comunismo, Jorge Amado descobre o humor. Ele próprio, porém, atribui a leveza desta segunda (ou terceira) fase de sua literatura mais ao amadurecimento que ao "desengajamento"."O escritor novato é sério demais. Precisei amadurecer para alcançar o humor", argumentava.
Apesar de já não-militante, Jorge Amado continuou se definindo como um escritor "voltado para o povo". O que não o impediu de aproximar-se de um representante da elite baiana, um "coronel" como os que retratou em seus livros: Antonio Carlos Magalhães.
Contradições do materialista que simpatizava com o candomblé, ou do ex-comunista que seguiu flertando com o socialismo, como deixa claro em uma de suas últimas entrevistas, ao jornal português "Expresso", em 1998: "O contrapeso para o capitalismo só pode ser o socialismo. Só resta o socialismo, mais nada".
Leia mais notícias sobre a morte de Jorge Amado
Rompimento com PC alavanca carreira
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"As dúvidas crescem, não devemos duvidar, não queremos duvidar, queremos continuar com a crença intacta, a certeza, o ideal. Nas noites insones, nos contemplamos, Zélia e eu, um nó na garganta, vontade de chorar."
Jorge Amado e Zélia Gattai estão exilados em Praga, entre 1951 e 1952, quando começam a conhecer o terror stalinista. Isso acontece ainda antes que, já com Nikita Kruschev no poder na então União Soviética, a partir de 1953 e sobretudo após 1956, ele fosse divulgado ao mundo.
Em vários trechos de suas memórias, semiexpostas no livro "Navegação de Cabotagem", de 1992, Amado vai revelando a decepção com o comunismo e sobretudo com Josef Stálin, o "Zé dos Bigodes", como o apelidava o camarada Oscar Niemeyer.
Stálin era seu ídolo na época em que militou no Partido Comunista Brasileiro, entre meados dos anos 30 e 1955, quando pede sua desfiliação. "Fui stalinista de conduta irreprochável, subchefe da seita, se não bispo ao menos monsenhor, descobri o erro, custou trabalho e sofrimento, deixei a missa em meio, saí de mansinho", revisa ele em suas memórias.
"É uma questão geracional. Nos anos 30 há uma grande polarização entre a direita e a esquerda. Todo mundo toma partido, e há um enorme contingente de intelectuais que se liga ao Partido Comunista, não só Jorge Amado. Quando ele se decepciona, muitos se decepcionam também", diz o cientista social Albino Rubim, autor do livro "Marxismo, Cultura e Intelectuais no Brasil" (Edufba).
Militante aplicado, o escritor chegaria a se tornar deputado federal pelo Partido Comunista, e cassado dois anos mais tarde. A militância influencia a literatura: escreve "O Cavaleiro da Esperança" (1942), biografia de Luiz Carlos Prestes, e atinge o ápice em termos de engajamento em 1958, com a publicação da trilogia "Os Subterrâneos da Liberdade".
Embora afirmasse a "continuidade" de sua obra, o rompimento com o partido causaria uma guinada rumo ao início da carreira, quando a região do cacau e seus personagens eram o foco central de sua ficção. Surge então "Gabriela, Cravo e Canela" (1958).
Ao abandonar o comunismo, Jorge Amado descobre o humor. Ele próprio, porém, atribui a leveza desta segunda (ou terceira) fase de sua literatura mais ao amadurecimento que ao "desengajamento"."O escritor novato é sério demais. Precisei amadurecer para alcançar o humor", argumentava.
Apesar de já não-militante, Jorge Amado continuou se definindo como um escritor "voltado para o povo". O que não o impediu de aproximar-se de um representante da elite baiana, um "coronel" como os que retratou em seus livros: Antonio Carlos Magalhães.
Contradições do materialista que simpatizava com o candomblé, ou do ex-comunista que seguiu flertando com o socialismo, como deixa claro em uma de suas últimas entrevistas, ao jornal português "Expresso", em 1998: "O contrapeso para o capitalismo só pode ser o socialismo. Só resta o socialismo, mais nada".
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