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21/09/2001 - 03h41

Globo veta piadas sobre atentados nos EUA

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ARMANDO ANTENORE
da Folha de S.Paulo

Eles não costumam poupar nada nem ninguém. Fatos políticos, filmes, novelas, crises conjugais de personalidades, competições esportivas e mesmo tragédias lhes servem de mote para piadas.

Na noite de terça-feira, porém, os sete humoristas do "Casseta & Planeta, Urgente!" não fizeram uma única gracinha sobre os ataques terroristas sofridos por Nova York e Washington. A Globo exibiu o programa normalmente, só que deixou de fora o principal assunto da semana.

Anteontem, Marcelo Madureira, 42, um dos integrantes da trupe, explicou o motivo à Folha: a cúpula da emissora vetou os quadros que abordavam o tema. O grupo chegou a gravá-los na segunda-feira. Terça à tarde, depois de ver o programa pronto, Mário Lúcio Vaz, responsável pela área artística, julgou melhor suprimir aqueles trechos.

Eram quase 14h quando avisou os humoristas. Eles tentaram negociar por telefone e pessoalmente (Bussunda e Cláudio Manoel participaram de uma reunião na sala de Vaz). Às 19h, concordaram em ceder. Ontem, a Central Globo de Comunicação confirmou os cortes e esclareceu que não se tratou de "uma decisão unilateral" da emissora, "mas consensual".

Entre os trechos que caíram, estava a pesquisa interativa "Quem é o atual inimigo número um da humanidade?". Os telespectadores poderiam escolher uma das três respostas: Felipão bin Laden, Malvadma bin Laden ou Maluf bin Laden.

Folha - Por que o "Casseta & Planeta" da última terça-feira não mencionou os atentados?
Marcelo Madureira -
Na verdade, escrevemos e gravamos uns quadros sobre o assunto, só que a direção da Globo preferiu não os mostrar. Ponderou que, devido à comoção do momento, o público iria reagir mal.

Folha - E vocês, reagiram como?
Madureira -
Ouvimos as alegações da emissora, respeitamos, mas confesso que, entre nós, ainda não chegamos a um consenso. É lógico que, de início, ficamos chateados e tentamos argumentar em favor das piadas.
Dissemos que o humor tem uma função catártica. Rir das tragédias contribui para suportá-las e entendê-las. Isso o Platão e o Freud já falaram. Não é nenhuma descoberta. A Globo, no entanto, está preocupada com a gravidade de tudo o que aconteceu e não quer ofender ninguém. Nós, por outro lado, não desejamos passar a imagem de que somos um bando de irresponsáveis. Acabamos, então, acatando as explicações da direção.

Folha - O episódio arranha o relacionamento de vocês com a Globo?
Madureira -
Não, em absoluto. A relação da gente com a emissora é de altíssimo nível. Cumprimos nosso papel de fazer as piadas, e a Globo cumpriu o dela -de analisar o que uma "broadcast" deve ou não transmitir. Foi uma decisão difícil para as duas partes. Nós, do "Casseta", habitamos um mundo "piadocêntrico". Comemos, dormimos e respiramos humor. A Globo vive em um universo bem mais amplo. Nesse sentido, creio que possui maior sensibilidade para dimensionar a reação da audiência.

Folha - Recentemente, a emissora os impediu de satirizar a cantora Sandy. Agora, houve outro veto. Não é proibição demais?
Madureira -
De fato, no caso da Sandy, houve veto. Mas, desta vez, não. Houve conversa. Sem contar que a decisão atual é temporária. Toda semana, reavaliaremos o tema. A Globo não descartou a possibilidade de permitir as brincadeiras em um próximo programa.

Folha - Dá para contar uma das piadas que não entraram no ar?
Madureira -
Não me lembro. Juro. Mas basta olhar o nosso site (www.cassetaeplaneta.com.br). Colocamos a maioria ali.

Folha - Como vocês se sentem escrevendo piadas sobre algo indubitavelmente dramático?
Madureira -
Sentimo-nos um pouco deprimidos, claro. É uma sinuca de bico. Depois dos atentados, discutimos muito de que maneira deveríamos tratá-los. E resolvemos o seguinte: evitar rir da tragédia em si, das mortes, das explosões. Procuramos centrar o foco nos terroristas. Ridicularizar o Bin Laden e seus adeptos. Mostrar a loucura dos caras, o absurdo do ato que praticaram. Buscar isolá-los politicamente. Neste instante, o humor precisa ajudar a combater o terrorismo -e o melhor jeito de fazê-lo é sacaneando os terroristas. Jamais zombaríamos dos americanos ou dos muçulmanos.

Folha - Mas o Bush também merece umas piadas, não?
Madureira -
Merece, sim. Ocorre que, agora, não daria pé. Poderia soar como desrespeito às vítimas.

Folha - Poupando o Bush, vocês não correm o risco de comprar o maniqueísmo norte-americano de que o mundo vai travar uma guerra do bem contra o mal?
Madureira -
De certo modo, vai mesmo. Terrorista não representa povo nenhum. Representa apenas a destruição. A humanidade deve repudiá-los e os comediantes, escrachá-los.

Folha - O humor tem limite?
Madureira -
Tudo tem limite.

Leia mais no especial sobre atentados nos EUA
 

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