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07/03/2002 - 04h41

Exposição no centro Pompidou, em Paris, reúne obras do surrealismo

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ALCINO LEITE NETO
da Folha de S.Paulo, em Paris

Seis televisores planos marca Samsumg ocupam o corredor que leva até a entrada da megaexposição "A Revolução Surrealista", no Centro Georges Pompidou (Beaubourg), inaugurada ontem em Paris e uma das principais mostras do ano na França.

As TVs mostram simultaneamente o filme "A Idade do Ouro" (1930), de Luís Buñuel e Salvador Dalí. Um homem bate num cego. Chuta um cachorro. Joga um frade pela janela. Uma mulher chupa com volúpia o dedo de uma estátua. Ela grita: "Que alegria termos matado nossos filhos".

O visitante não vai encontrar a mesma emoção depois da entrada, mas terá muito com que se divertir. A exposição do Beaubourg é uma das maiores já produzidas a respeito do surrealismo. Em 2.200 m2 do museu, reúne 200 pinturas, 200 obras sobre papel, 70 fotografias, mais uma centena de esculturas, livros e objetos.

Além de Buñuel e Dalí, estão todos lá: Max Ernst, Joan Miró, René Magritte, Pablo Picasso, André Masson, Jean Arp, Alberto Giacometti, Man Ray, Roberto Matta, Francis Picabia, Yves Tanguy, sem falar no papa do movimento, o escritor André Breton, e seu séquito literário: Paul Éluard, Louis Aragon, René Crevel...

É preciso um bom senso de humor para percorrer todo o espaço. A paródia, o jogo e a indisciplina são o legado mais duradouro que o surrealismo deixou de sua guerra de guerrilhas contra os valores burgueses e ocidentais. Muito da provocação política e moral se esgotou, mas também a força de boa parte das obras, atreladas que estavam aos princípios programáticos do movimento, definidos pela primeira vez no "Manifesto do Surrealismo", de 1924.

Não há como deixar de ver, porém, que o surrealismo marcou toda a arte posterior, como quis mostrar o historiador de arte alemão Werner Spies, curador da mostra no Beaubourg. Os surrealistas desenvolveram a sua criação em vários rumos, consolidando todo um conjunto de práticas -colagens, ready-mades, performances, instalações, escrita automática, fotomontagens etc.- que não abandonariam mais a arte.

"Revolução Surrealista" está dividida em 20 espaços, onde as obras foram dispostas em ordem cronológica, dominadas pelas pinturas, mas num sistema de circulação feito de surpresas, com pequenas salas anexas, vitrines e recuos, que permitem incisões no plano histórico.

A exposição abre com uma série notável de seis pinturas da fase metafísica do italiano Giorgio De Chirico (1888-1978), considerado pelos surrealistas como um de seus precursores. Está lá o "Retrato Premonitório de Guillaume Apollinaire", poeta francês (1880-1918) que não pertenceu ao movimento, mas criou o termo "surrealismo", em 1917.

Continua com Max Ernst, um dos artistas dominantes na exposição. A mostra apresenta "Au Rendez-Vous des Amis" ("No Encontro dos Amigos", 1922), o célebre retrato dos principais surrealistas ao lado de Dostoiévski, e um vasto número de pinturas. Mais interessante que elas, porém, são as maravilhosas colagens de "A Mulher de 100 Cabeças" (1929), transgressões de típicas cenas domésticas burguesas.

O catalão Joan Miró (1893-1983) comparece já nas primeiras salas e vai pontuar toda a mostra. Spies ressaltou em entrevista que a noção de abstração é "incompatível com o surrealismo, porque toda a sua pintura parte de uma realidade tangível". Talvez por isso mesmo a pintura de Miró, afinal abstratizante, tenha melhor sobrevivido ao movimento, ao lado das de André Masson (1896-1987).

O figurativismo de René Magritte (1898-1967), por exemplo, com 16 obras expostas, redundou em geral numa pintura enregelada e sem vibração, com poucas exceções, como o perturbador "Moça Comendo um Pássaro (O Prazer)", de 1926. O mesmo ocorre com Dalí (1904-1989), cujos 27 trabalhos aparecem no meio da exposição, impregnando-a de espetacularização kitsch.

Tudo isso transcorre num clima de curiosidade pelas obsessões surrealistas e a inventividade das obras, realizadas com o objetivo de liberar as forças do inconsciente para quebrar a ordem racional repressora e revolucionar a vida. As formas sexuais onipresentes e as simbologias perversas ganham, porém, ares de classicismo, quando se pensa na selvageria da racionalidade técnica que, hoje, tomou conta do mundo e planificou as reivindicações do desejo num novo sistema de controle.
 

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