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19/10/2003 - 03h34

Diretor Rogério Sganzerla indica derrocada do cinema

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SILVANA ARANTES
da Folha de S.Paulo

O cineasta Rogério Sganzerla, 57, percorreu, em 35 anos de carreira, um caminho que vai do filme-soma ("O Bandido da Luz Vermelha", 1968) ao antifilme ("O Signo do Caos", 2003).

Os rótulos às criações foram dados pelo próprio autor, habituado a acompanhar seus lançamentos no cinema com manifestos, em que ressalta os significados da obra, escancara as angústias do criador e, não raro, critica o que considera empobrecido ou empobrecedor no ambiente artístico à sua volta.

Hoje, quando "O Signo do Caos" estréia em São Paulo, na programação da 27ª Mostra BR de Cinema, a disposição de Sganzerla para provocar discussões não é diferente. A forma de fazê-lo, sim. Com a saúde fragilizada por um câncer, o cineasta torcerá de longe (está hospitalizado) para que a platéia deixe a sessão (no Cineclube Directv, às 22h10) sentindo-se "baratinada" e até mesmo "deformada pelo filme".

As declarações do diretor registradas neste texto foram colhidas pelo ator e colaborador do cineasta Roberto Ronchezel, a partir de perguntas da Folha.

Para Sganzerla, "O Signo do Caos" é um "antifilme", porque contrário aos "superfilmes", às grandes produções que caracterizam o cinema atual e sua derrocada histórica --"Nós não temos um cinema à altura de nosso século"-- e regional --"Aqui em São Paulo, perdeu-se a sintaxe do cinema e perdeu-se também até a dignidade do cinema", diz.

O que teria feito o cinema parar no tempo, segundo Sganzerla, é a ausência do espírito transformador à maneira dos que fizeram essa arte avançar, como o diretor espanhol Luís Buñuel (1900-1983).

"Estou vendo muita aliteração e pouca incorporação. Temos bons cineastas. Eu vejo aí bons filmes, algumas surpresas, mas é só diluição. Acho que tudo isso foi anunciado por [Stanley] Kubrick [1928-1999] e pelos maiores cineastas americanos da década de 50. Eles ainda não estavam a serviço dessa diluição controlada pela burocracia sentimental."

Tema constante das reflexões de Sganzerla, o cinema é também o próprio assunto de "O Signo do Caos". Em imagens em preto e branco de um corredor com um alçapão, espaço que se estrutura como uma alfândega num cais de porto, censores avaliam e determinam a destruição de materiais cinematográficos.

O argumento de Sganzerla é inspirado na passagem pelo Brasil, em 1942, do cineasta norte-americano Orson Welles (1915-1985) que não conseguiu concluir o longa que vinha filmar, "It's All True" (É Tudo Verdade).

Em abril deste ano, Sganzerla falou à Folha sobre o novo filme: "É uma defesa do cinema. Mas eu também acuso a figura do curador, aquele que agiganta orçamentos, como sendo o grande intermediário, o grande parasita da nossa tumultuada indústria cinematográfica".

Nos depoimentos dados nesta semana, o diretor disse que os realizadores não devem se culpar pela situação do cinema. "Os produtores...", dizia, num pensamento assim completado por Helena Ignez, sua mulher e atriz deste mais recente e de quase todos os filmes seus: "Os produtores que se tornaram reprodutores".

Na estréia de "O Bandido da Luz Vermelha", a cruzada de Sganzerla era "em direção ao filme brasileiro liberador, revolucionário também nas panorâmicas, na câmara fixa e nos cortes secos". A esse uso da linguagem cinematográfica, incomum para a época, chamou de "cinema fora-da-lei".

Dez anos mais tarde, lançou outro filme ("Abismu - O Abismo") e outro manifesto: "Terei uma mensagem a transmitir? Pois seja essa: em arte, o Brasil, em vez de andar, carangueja".

Hoje, Sganzerla diz que o rótulo fora-da-lei, além de coerente com o seu cinema, "que sempre foi de ruptura", tentava escapar "da zona rígida e delimitada" de demarcação da mídia. "Quis que eles pudessem não definir a zona que nós escolheríamos para definir os nossos propósitos". Com "O Signo do Caos", Sganzerla permanece um cineasta indefinível.

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