Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
25/10/2003 - 08h53

Travesti do Brasil é matéria de tragédia em "Tiresia"

Publicidade

ALCINO LEITE NETO
editor de Domingo

Existem outras coisas interessantes no filme francês "Tiresia", além do fato curioso de ter como personagem um travesti brasileiro interpretado também por dois brasileiros --primeiro, uma atriz (Clara Choveaux); depois, um ator (Thiago Teles).

Existe por exemplo a ousadia do diretor Bertrand Bonello em abordar sem meias-palavras a condição transexual (como nas cenas que exibem abertamente a nudez hermafrodita de Tiresia).

Existe a preocupação de realizar uma tragédia contemporânea que se inspira no mito grego que dá nome ao filme (Tirésias foi homem e depois mulher antes de ser punido com a cegueira pela deusa Atenas e virar um adivinho).

Existe a pretensão de Bonello de misturar a sexualidade e o sagrado para demonstrar como eles estão interligados (um mesmo ator faz o intelectual perverso e um padre carregado de dúvidas).

Existe ainda o esforço de confrontar e embaralhar paganismo e catolicismo, razão e fé, natureza e imitação, feminino e masculino...

Existem tantas coisas interessantes no filme que é o caso de perguntar se não é exatamente isso que atrapalha "Tiresia": este excesso de intenções e temas que leva o diretor a realizar cada cena como se estivesse empunhando a chave dos enigmas da existência. Tanta coisa que Bonello tem dificuldades para terminar o filme.

Formalmente, "Tiresia" busca a contenção nas imagens e o rudimentar nas falas, um pouco como se Bresson filmasse com Pasolini. Mas Bonello nada tem da objetividade desses diretores, que souberam se colocar como poucos na fronteira entre realismo e mito.

As sequências de "Tiresia" são sobrecarregadas de solenidade e simbolismos. E, detrás dos silêncios inquisitivos, as cenas vão inoculando uma discursividade fastidiosa. Exceto o protagonista Tiresia, todos os demais personagens se esgotam rapidamente: são como peças de uma demonstração.

O filme tem duas partes (ou "tempos"): antes e depois de o intelectual cegar Tiresia --é uma das melhores cenas (a outra é a longa sequência dos travestis no Bois de Boulogne, em Paris).

A primeira parte, mais bem realizada, tem ainda a graça de ser estrelada por Clara Choveaux, filha de brasileira e francês, ex-modelo, bela atriz de impressionante força cênica, que por si só é razão para assistir ao filme. Vê-la exibir um falo portentoso e a barba incontrolável torna ainda mais impactante a sua presença.

Avaliação:

Especial
  • Veja a programação, sinopses e as notícias da Mostra BR de Cinema de São Paulo
  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página