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01/04/2004 - 19h46

"É preciso desrespeitar a obra literária", diz diretora de "Benjamim"

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MARCELO BARTOLOMEI
Editor de entretenimento da Folha Online

Adaptação do romance de Chico Buarque, "Benjamim" estréia nesta sexta-feira, dia 2, em 25 salas de cinema do país. Para Monique Gardenberg, 45, diretora do filme, é preciso desrespeitar a obra literária na hora de fazer um filme.

"Benjamim" mostra as consequências do regime militar no Brasil, se utilizando da paixão de Benjamim Zambraia (Paulo José) e Castana Beatriz/Ariela Masé (Cleo Pires) para contar a história.

Depois de dispensar dez roteiros diferentes --o primeiro teria ficado muito próximo ao livro--, a cineasta conseguiu definir como seria seu segundo filme, uma história densa, mas que rememora o período da ditadura militar, cujo golpe acaba de completar 40 anos.

Divulgação
A diretora Monique Gardenberg (à dir.) e Cleo Pires; veja fotos de "Benjamim"
Leia trechos da entrevista:

Folha Online - Depois de "Jenipapo" (1996), por que você demorou tanto para fazer outro filme?

Monique Gardenberg -
Eu me preparava para um projeto internacional, que seria rodado na Polônia, baseado em fatos reais. Desenvolvi, fui contratada e tive que interromper tudo por causa da morte da minha irmã. Aos poucos eu lembrei de "Benjamim", que eu tinha lido em 96 e que falava da perda de alguém amado e da maneira como essa pessoa pode "reencarnar". Daí eu quis fazer este filme, falar disso, falar da possibilidade de isso acontecer e do sentimento que isso traz.

Folha Online - Como começou "Benjamim"?

Monique -
Comecei a desenvolver o roteiro ainda em 98 e trabalhei nele quase dois anos. Primeiro fiz tudo sozinha e depois chamei o Jorge Furtado para fazer parte do trabalho. O Chico [Buarque] acompanhava as diversas versões do roteiro. Ele leu e a gente comentava, ao mesmo tempo em que ele dizia que o filme era o filme e o livro era o livro. Ele não era nada possessivo nesse sentido, queria mesmo que eu tivesse toda liberdade. Mas foi ele quem deu luz à toda essa gente. Quando eu comecei a criar algumas cenas e a escrever as falas, eu gostava de ouvir a opinião dele sobre a coerência das personagens. Algumas vezes, ele dizia que o Benjamim não falaria algumas coisas. Foi interessante trabalhar com ele para obter esta coerência para cada personagem. No total, o roteiro teve 11 tratamentos.

Folha Online - O que mais mudou desde o primeiro tratamento do roteiro?

Monique -
No início, era uma transcrição muito próxima do livro. Mas para fazer um bom cinema é preciso desrespeitar a obra literária. Não na essência, mas na forma. É preciso eleger algumas coisas das quais você queira falar. O Chico devaneia muito. Você tem que querer contar uma história só. Fico até com pena porque o Alyandro [interpretado por Chico Diaz] tem toda a história dele, que não é ruim. O tempo todo, na história, é preciso se policiar. No início, era muito próximo ao livro, mas depois eu fui fazendo as escolhas e dando uma secada no roteiro. Mandei para o Jorge [Furtado], que deu todo um encadeamento técnico e lógico para o roteiro, para as indas e vindas. Mas ele revelava algumas coisas muito cedo que eu não queria revelar. Veio outro tratamento. Senti falta de mais emoção e criei algumas cenas para passar isso, a relação de Benjamim com a Ariela/Castana.

Algumas coisas do filme não existem no livro. Naquela cena em que eles jogam vôlei, ela chega e ele se joga no mar não existe. Levar ela ao cinema, por exemplo, não existe. Na verdade, ele ia sozinho. Criei algumas cenas e situações que dessem um pouquinho do estado dele de menino apaixonado que foge da mulher ao invés de ir atrás, criando este clima mais romântica.

Folha Online - O que você espera que o filme provoque nos espectadores? Quem é o público do filme?

Monique -
Acho que o filme é muito emocionante. Ele pode se comunicar pela emoção. A narrativa dele não é linear, portanto, ele exige do espectador. Não acho que isso seja ruim porque o espectador quer isso. Acho que o pessoal de outras gerações tem mais dificuldades. O filme vai pegar fundo as pessoas que têm a minha idade, 45, que viveram todas estas coisas que o filme vai retratando como pano de fundo do Brasil.

Eu acho que eu fui muito generosa e protegi muito minhas personagens. Todas elas têm um lado com que você simpatiza, por mais terrível que possa ser. Você sente compaixão ou afeição... Eu consegui fazer um Benjamim adorável. No fim, eu sinto que uma turma fica um pouco revoltada, mas isso não deveria acontecer. Ele vivia atormentado.

Folha Online - Você mudaria alguma coisa no filme, como as características criadas para as personagens?

Monique -
Não. A história do Chico ["Benjamim"] é genialmente construída. Ariela, quando criancinha, é vítima da maior violência que uma pessoa pode viver. Depois, ela se aproxima da violência, e casa logo com um policial, que é ligado a grupos de extermínio que, na verdade, nada mais são que a herança dessa direita, as mazelas do autoritarismo da ditadura militar. É uma coisa tão perfeita que ele faz, o Benjamim ser vítima da esquerda porque ele entrou para a história como um dedo-duro, sendo que ele só era um garoto vaiodoso, alienado e apaixonado. Essa coisa cruel que acontecia muito de não ter perdão, fazendo o sujeito viver o resto da vida isolado.

Acho que é um retrato muito bem construído de uma época, das consequências dessa história do Brasil na vida de muita gente.

Folha Online - Qual sua idéia do cinema nacional atualmente? O que falta, quais as vantagens e diferenças da época que fez "Jenipapo"?

Monique -
Vejo com muito entusiasmo. Quando lancei o "Jenipapo" estávamos exatamente na época da retomada. Vieram "Carlota Joaquina", "Terra Estrangeira", "Jenipapo", um seguido do outro. Acho que hoje a gente consegue produzir mais filmes e também acho que temos temas mais diversos. Tinha uma fixação muito no Nordeste, mas temos hoje algo mais próximo da nossa realidade. Melhor termos um blockbuster brasileiro que um americano. É um momento muito áureo.

Estão surgindo talentos, que eu acho que mostram uma veia autoral muito forte. Gostei muito do "Amarelo Manga", do "Bicho de Sete Cabeças", do "Cidade de Deus", sem entrar na discussão se é válido ou não, são grandes diretores, grandes contadores de histórias. Ao mesmo tempo, esse sucesso de nomes que já não estão mais limitados a Xuxa e a Renato Aragão, como "Carandiru", "Lisbela e o Prisioneiro", "Os Normais", fazem com que o mercado aumente e conquiste mais público. O cinema brasileiro está com quase 25% do mercado, antes era 8%. Uma coisa puxa a outra. Com isso, vamos produzir mais e companhias estrangeiras que podem investir começaram a fazer isso pesadamente. A Globofilmes está dando uma super força neste processo, de projeção do filme nacional para o público brasileiro.

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