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17/04/2004 - 07h55

Dicionário decifra labirintos do "nordestinês"

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XICO SÁ
crítica da Folha

O leso, além de cibito, era um lopreu, abirobado, cheio de munganga. Entrou abaixadinho na fubuia e por uma peinha de nada, um culhonésimo, não fez uma emboança naquele brega quando lhe chamaram de pirobo.

Calma, não se avexe, eis a tradução do arrazoado acima: o idiota, além de esquelético era um demônio, amalucado, dado a caretas e trejeitos. Bebeu cachaça sem piedade e por muito pouco não provocou uma confusão sem fim quando foi chamado de gay.

São os vastos falares do Brasil, que não cabem nos Aurélios e Houaiss e carecem de decifradores mais regionalizados. Caso do novo "Dicionário do Nordeste", do jornalista e pesquisador Fred Navarro. O recifense, que já havia contribuído com outra obra do gênero, o livro "Assim Falava Lampião" (98), agora exibe, com o enxerimento necessário, 5.000 expressões do "nordestinês".

Além de escarafunchar a linguagem oral da sua terra, Navarro juntou ao seu embornal de vocábulos a colaboração de outros dicionaristas que produziram versões estaduais da fala nordestina. Aqui entra, por exemplo, a "Grande Enciclopédia Internacional de Piauiês", de Paulo José Cunha. Todos comparecem com os devidos créditos.

Na apresentação, o autor adverte que o livro não tem caráter acadêmico. Marcos Bagno, professor de Lingüística da Universidade de Brasília, autor de "Preconceito Lingüístico: O Que É, como se Faz", diz, no prefácio, que há até uma vantagem na pesquisa ter sido feita por um não-especialista.

"Este dicionário tem, justamente por isso, a possibilidade de atrair um público muito mais amplo e diversificado do que os parcos leitores de obras acadêmicas de circulação restrita (e deficiente)", escreve Bagno. Ele aponta a existência de um descompasso, quase um abismo, entre o que se produz nos meios acadêmicos em termos de conhecimento da língua falada pelos brasileiros.

Para ampliar ao máximo o seu léxico nordestino, Navarro, além da memória afetiva e pesquisa de campo, se amparou de uma penca de bons autores, músicos, cineastas e jornalistas nascidos na região. De Gilberto Freyre ao forrozeiro brega Genival Lacerda ("Ele tá de olho é na botique dela..."). Na literatura tem muito do mundo de Graciliano Ramos --o que enriquece bastante o livro--, Osman Lins, José Américo de Almeida, Marilene Felinto, Waly Salomão e Wilson Freire, ótimo poeta do sertão pernambucano.

A música também vem sortida. Tem o recifense Edu Lobo com o seu enfeitado "Cordão da Saideira", Luiz Gonzaga, Tom Zé, o cearense Fausto Nilo, Gilberto Gil, Naná Vasconcelos, e grupos como Mundo Livre S/A, Nação Zumbi e Comadre Florzinha.

O "Dicionário" é obra de importância que tem a bênção e matriz no potiguar Câmara Cascudo, um dos homens mais sábios do Brasil, tão importante na literatura de formação do país quanto Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Hollanda. Com o seu livro, Navarro mostra que é mesmo um "tampa-de-Crush", como se diz, em Pernambuco, a respeito dos arretados, velhos e bons.

Avaliação:

Dicionário do Nordeste
Autor:
Fred Navarro
Editora: Estação Liberdade
Quanto: R$ 36 (403 págs.)
 

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