Publicidade
Publicidade
11/05/2004
-
03h30
THIAGO NEY
da Folha de S.Paulo
A primeira regra para falar com Chuck Palahniuk é: não fale sobre Chuck Palahniuk. Pelo menos, não logo de início.
Autor de "Clube da Luta", o escritor norte-americano gosta de conversar sobre a quase obsessão em fazer humor com episódios trágicos, sobre as referências anticonsumo presentes em suas histórias ou sobre sua escrita enxuta e direta. Mas fica incomodado quando se torna o assunto.
Aos 42 anos, Chuck Palahniuk teve, assim como as tramas de seus livros, uma vida insólita. Ex-mecânico de caminhões, teve o pai assassinado com a namorada pelo ex-marido dela. O acusado está no corredor da morte. Quando era adolescente, seu avô cometeu suicídio após matar a mulher.
Em entrevista à Folha, por telefone, de sua casa em Portland, no Oregon, Palahniuk explica por que recomendou a pena de morte ao assassino de seu pai e comenta "Cantiga de Ninar", que acaba de ser lançado no país (saiu nos EUA em 2002). No livro, um jornalista e uma corretora que vende casas mal-assombradas saem em jornada para destruir os exemplares de um livro que contêm uma antiga canção africana que tem o poder de matar crianças.
Folha - Em entrevista, o sr. disse que "Cantiga de Ninar" é seu livro mais impactante. Por quê?
Chuck Palahniuk - Acho que os signos são mais impactantes, são horríveis. São simbolizações de força, de magias, há as crianças que vão morrendo. É um tipo diferente de impacto daquele de "Clube da Luta", por exemplo.
Folha - O sr. já comentou que tira muitas das histórias de seus livros a partir de experiências próprias. De onde veio "Cantiga de Ninar"?
Palahniuk - Estava num shopping procurando presente de casamento para um amigo. Uma amiga, formada em história, começou a discorrer sobre como os nossos mais fortes e sagrados símbolos vêm de culturas que foram dominadas pela nossa. E nós reduzimos esses símbolos a simples objetos de decoração. Então pensei: "E, se existisse um símbolo poderoso, de um outro povo, que, não importa o quanto fosse domesticado e explorado por nós, mantivesse sua força e continuasse a ter efeito sobre as pessoas?".
Folha - O sr. concorda com a idéia de que "a civilização precisa ser destruída para ser salva"?
Palahniuk - É uma fantasia, uma idéia romântica que as pessoas têm. Antes da virada do século, todos estavam preocupados com o bug do milênio, e acho que isso se deve ao fato de que as pessoas são apaixonadas pela idéia de um fim da civilização, porque isso possibilitaria um recomeço. E elas ficaram com o coração partido porque nada aconteceu. Mas provavelmente todos cometeriam os mesmos erros se tivessem uma segunda chance. De certa forma, meus livros tratam de criar um modelo de sociedade e fazê-lo funcionar até quebrar.
Folha - O sr. começou a escrever após os 30 anos. O que o motivou?
Palahniuk - Só com 31 anos consegui comprar minha casa num lugar onde não havia TV nem rádio, e eu passava o tempo lendo. E foi ali que percebi que havia poucos livros que eu realmente gostaria de ler. Se eu não tivesse comprado aquela casa, provavelmente estaria sentado assistindo à TV.
Folha - "Clube da Luta" foi seu primeiro livro e tornou-se um fenômeno cultural. Como o sr. vê o livro hoje? Gosta de falar sobre ele?
Palahniuk - "Clube da Luta" contém uma grande idéia. Gostaria de tê-lo escrito com mais cuidado, porque nunca esperava que alguém fosse publicá-lo, então escrevi muito rápido, com muita energia e raiva... Algumas seqüências estão no livro apenas porque foram histórias contadas por meus amigos, e eu havia prometido a eles que seriam incluídas.
Folha - Na época em que seu pai morreu, o sr. recomendou a pena de morte para o assassino. O sr. é a favor desse tipo de punição?
Palahniuk - Para esse homem, pelos crimes que ele cometeu, sou a favor. Não serei sempre a favor, mas nessa circunstância, sim.
Folha - Aqui no Brasil, há alguns anos, um homem entrou num cinema e atirou em várias pessoas, durante uma sessão de "Clube da Luta". Depois ele disse que adorava o filme. O sr. soube do caso? Como lidar com esse tipo de coisa?
Palahniuk - Não sabia. Quando escrevia "Clube da Luta", contei a amigos sobre algumas idéias, como a de garçons que urinam na comida ou de projecionistas inserindo imagens pornográficas em filmes "familiares". Um amigo disse para eu não escrever isso, pois poderiam imitar. Mas, assim que o livro saiu, centenas de pessoas me disseram: "Adorei a história. Sou um garçom e urino na comida muitas vezes". Acho que você pode retratar essas coisas, rir delas e, assim, tira o poder delas. Daí as pessoas vão desistir de fazer isso. Sempre haverá pessoas loucas, e você pode ou reagir com horror, o que lhes dará mais poder, ou rir antes disso acontecer, para que as pessoas sejam menos atraídas em fazê-las acontecer.
CANTIGA DE NINAR
De: Chuck Palahniuk
Editora: Rocco
Quanto: R$ 36,50 (280 págs.)
Autor de "Clube da Luta" fala sobre a origem de seu novo livro
Publicidade
da Folha de S.Paulo
A primeira regra para falar com Chuck Palahniuk é: não fale sobre Chuck Palahniuk. Pelo menos, não logo de início.
Autor de "Clube da Luta", o escritor norte-americano gosta de conversar sobre a quase obsessão em fazer humor com episódios trágicos, sobre as referências anticonsumo presentes em suas histórias ou sobre sua escrita enxuta e direta. Mas fica incomodado quando se torna o assunto.
Aos 42 anos, Chuck Palahniuk teve, assim como as tramas de seus livros, uma vida insólita. Ex-mecânico de caminhões, teve o pai assassinado com a namorada pelo ex-marido dela. O acusado está no corredor da morte. Quando era adolescente, seu avô cometeu suicídio após matar a mulher.
Em entrevista à Folha, por telefone, de sua casa em Portland, no Oregon, Palahniuk explica por que recomendou a pena de morte ao assassino de seu pai e comenta "Cantiga de Ninar", que acaba de ser lançado no país (saiu nos EUA em 2002). No livro, um jornalista e uma corretora que vende casas mal-assombradas saem em jornada para destruir os exemplares de um livro que contêm uma antiga canção africana que tem o poder de matar crianças.
Folha - Em entrevista, o sr. disse que "Cantiga de Ninar" é seu livro mais impactante. Por quê?
Chuck Palahniuk - Acho que os signos são mais impactantes, são horríveis. São simbolizações de força, de magias, há as crianças que vão morrendo. É um tipo diferente de impacto daquele de "Clube da Luta", por exemplo.
Folha - O sr. já comentou que tira muitas das histórias de seus livros a partir de experiências próprias. De onde veio "Cantiga de Ninar"?
Palahniuk - Estava num shopping procurando presente de casamento para um amigo. Uma amiga, formada em história, começou a discorrer sobre como os nossos mais fortes e sagrados símbolos vêm de culturas que foram dominadas pela nossa. E nós reduzimos esses símbolos a simples objetos de decoração. Então pensei: "E, se existisse um símbolo poderoso, de um outro povo, que, não importa o quanto fosse domesticado e explorado por nós, mantivesse sua força e continuasse a ter efeito sobre as pessoas?".
Folha - O sr. concorda com a idéia de que "a civilização precisa ser destruída para ser salva"?
Palahniuk - É uma fantasia, uma idéia romântica que as pessoas têm. Antes da virada do século, todos estavam preocupados com o bug do milênio, e acho que isso se deve ao fato de que as pessoas são apaixonadas pela idéia de um fim da civilização, porque isso possibilitaria um recomeço. E elas ficaram com o coração partido porque nada aconteceu. Mas provavelmente todos cometeriam os mesmos erros se tivessem uma segunda chance. De certa forma, meus livros tratam de criar um modelo de sociedade e fazê-lo funcionar até quebrar.
Folha - O sr. começou a escrever após os 30 anos. O que o motivou?
Palahniuk - Só com 31 anos consegui comprar minha casa num lugar onde não havia TV nem rádio, e eu passava o tempo lendo. E foi ali que percebi que havia poucos livros que eu realmente gostaria de ler. Se eu não tivesse comprado aquela casa, provavelmente estaria sentado assistindo à TV.
Folha - "Clube da Luta" foi seu primeiro livro e tornou-se um fenômeno cultural. Como o sr. vê o livro hoje? Gosta de falar sobre ele?
Palahniuk - "Clube da Luta" contém uma grande idéia. Gostaria de tê-lo escrito com mais cuidado, porque nunca esperava que alguém fosse publicá-lo, então escrevi muito rápido, com muita energia e raiva... Algumas seqüências estão no livro apenas porque foram histórias contadas por meus amigos, e eu havia prometido a eles que seriam incluídas.
Folha - Na época em que seu pai morreu, o sr. recomendou a pena de morte para o assassino. O sr. é a favor desse tipo de punição?
Palahniuk - Para esse homem, pelos crimes que ele cometeu, sou a favor. Não serei sempre a favor, mas nessa circunstância, sim.
Folha - Aqui no Brasil, há alguns anos, um homem entrou num cinema e atirou em várias pessoas, durante uma sessão de "Clube da Luta". Depois ele disse que adorava o filme. O sr. soube do caso? Como lidar com esse tipo de coisa?
Palahniuk - Não sabia. Quando escrevia "Clube da Luta", contei a amigos sobre algumas idéias, como a de garçons que urinam na comida ou de projecionistas inserindo imagens pornográficas em filmes "familiares". Um amigo disse para eu não escrever isso, pois poderiam imitar. Mas, assim que o livro saiu, centenas de pessoas me disseram: "Adorei a história. Sou um garçom e urino na comida muitas vezes". Acho que você pode retratar essas coisas, rir delas e, assim, tira o poder delas. Daí as pessoas vão desistir de fazer isso. Sempre haverá pessoas loucas, e você pode ou reagir com horror, o que lhes dará mais poder, ou rir antes disso acontecer, para que as pessoas sejam menos atraídas em fazê-las acontecer.
CANTIGA DE NINAR
De: Chuck Palahniuk
Editora: Rocco
Quanto: R$ 36,50 (280 págs.)
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Alice Braga produzirá nova série brasileira original da Netflix
- Sem renovar contrato, Fox retira canais da operadora Sky
- Filósofo e crítico literário Tzvetan Todorov morre, aos 77, em Paris
- Quadrinhos
- 'A Richard's estava perdendo sua cara', diz Ricardo Ferreira, de volta à marca
+ Comentadas
- Além de Gaga, Rock in Rio confirma Ivete, Fergie e 5 Seconds of Summer
- Retrospectiva celebra os cem anos da mostra mais radical de Anita Malfatti
+ EnviadasÍndice