Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
13/06/2004 - 06h33

Chico Buarque completa 60 anos e é homenageado

Publicidade

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Folha de S.Paulo

Dentro de seis dias, ele terá 60 anos. Nessa data querida, Chico Buarque, um dos definidores centrais da cultura nacional das últimas quatro décadas, não estará no Brasil. Nestes anos de vida, tem estado avesso aos holofotes e ao discurso, distante de palcos em que seja o ídolo principal e dos discos de músicas inéditas (que não freqüenta desde 1998).

Não significa que tenha resolvido se ausentar. Em sua década dos 50, publicou livros que redirecionaram sua produção artística, rumo a uma literatura de intricado labirinto de personalidades espelhadas. Na música, foi se transformando num homem que ainda é o mesmo que norteou um país --mas é outro, oposto.

Hoje Chico se irrita com a identificação entre sua produção musical nos anos 60 e 70 e um heroísmo militante de resistência contra a ditadura.

Não parece casual, então, que a efeméride venha marcada pelo lançamento, nos próximos dias, da caixa de CDs "Francisco" (BMG, R$ 650, em média).

Ali se agrupará a obra do compositor e cantor de 87 em diante, quando mergulhou numa musicalidade jobiniana, intimista, cujo imaginário flutua em sonhos confusos parecidos com os dos narradores de "Estorvo" (91), "Benjamim" (95) e "Budapeste" (2003).

Em 84 Chico lançara "Vai Passar", uma espécie de réquiem para o período ditatorial, que se esvairia mesmo com a derrota do movimento pelas eleições diretas, de que o samba-enredo tratava.

Naquele dia-ano, Chico resolveu quebrar o espelho. Esperara ansiosamente pela festa democrática, desistiu dela assim que sentiu seu cheiro --herói do porvir, argumentou em silêncio que o porvir que vinha não era satisfatório.

Mesmo apoiando o PT de Lula nas quatro primeiras eleições diretas pós-ditadura, afastou-se da politização na música em ritmo idêntico ao do reencontro com a musicalidade contemplativa de Tom Jobim (1927-94).

"Francisco" (87), o abre-alas desse admirável mundo novo, ainda continha a picardia subversiva de "Bancarrota Blues" (uma regravação). Mas o estandarte se abrigava em outras mãos, as do lirismo triste tipo "Todo o Sentimento" e "Estação Derradeira".

Dali por diante, o Brasil continuaria a associá-lo teimosamente com o herói que desafiou a ditadura munido de baionetas como "Apesar de Você" (70), "Cálice" (73), "Jorge Maravilha" (74, do alter ego Julinho da Adelaide, inventado para driblar a Censura antibuarquiana), "Corrente" (76) etc. Chico, divergente de seu público, passaria a não se enxergar mais naquele espelho.

O disco "Chico Buarque" (89) preparou, no diapasão desse dilema, a entrada nos anos 90. Nele e em tudo que fez a partir de lá, em música ou em literatura, o autor passou a opor resistência de igual magnitude contra a dureza da realidade, em favor da proteção de um universo paralelo irreal, feito de sonhos (e pesadelos).

Quis ser cada vez menos celebridade. Nunca parou de crescer como celebridade. Para seu público fiel, foi virando mansa esfinge.

Seus trabalhos, embora não menos intensos, se tornaram menos empolgados, menos comunicativos. A estranheza diante de um suposto esmorecimento do herói não raro bateu no espelho como pressão pela volta do líder político --cargo que Caetano Veloso já ocupava com zelo e prazer.

Chico disse não, não e não. Suportou opiniões sobre uma angulação supostamente "menor" de sua obra de maturidade em comparação com os anos heróicos (reunidos na caixa "Construção", 2001, Universal, cerca de R$ 570).

Se isso puder ser verdade parcial, ainda assim a produção recente guarda lancetas como "Paratodos" (93), reflexão sobre o auto-exílio equiparável à do "Estrangeiro" (89) de Caetano.

Trata-se de "um dos momentos mais fortes na trajetória de Chico, algo como um reencontro dele com a cultura nacional-popular, com sua própria obra e com as ilusões perdidas da juventude", nas palavras de Fernando de Barros e Silva, no volume dedicado a ele na série "Folha Explica".

É um de vários lançamentos-eventos que marcarão a conversão de Chico aos 60, entre caixa de CDs e livros e ainda uma mostra na Biblioteca Nacional do Rio (prevista para julho).

Incorporando um autor ausente suspenso no ar, que é filho do Julinho da Adelaide dos anos de repressão e irmão do ghost-writer de "Budapeste", Chico Buarque, ao que parece, vai escapulir de todas as homenagens. Ah, mas se diz por aí que voltou a compor.

Leia mais
  • Chico hoje prefere rotina caseira e literária à musical
  • Período de exílio de Chico Buarque será tema de tese na Itália
  • Chico Buarque faz "fortuna crítica" como escritor
  • Ensaio capta a utopia e a dor do Brasil que não somos

    Especial
  • Arquivo: veja o que já foi publicado sobre Chico Buarque
  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página