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16/07/2004 - 03h49

Othon Bastos recebe homenagem em Brasília

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PEDRO BUTCHER
crítica da Folha

O ator baiano Othon Bastos será homenageado amanhã no Festival Internacional de Cinema de Brasília, com o lançamento do quarto volume dos "Cadernos do Cine Academia", perfil escrito por Cláudio Valentinetti, e a exibição de três de seus filmes mais representativos: "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), "O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro" e "São Bernardo" (1971).

Bastos, 44 anos de carreira e 30 filmes no currículo, queria ter feito mais cinema. De formação teatral (ele começou nos anos 50, no Teatro do Estudante de Pascoal Carlos Magno, no Rio) e especialização shakespeariana (na tradicional Webber Douglas Academy, de Londres), Bastos se realizou diante da câmera, tendo trabalhado com os mais importantes diretores do cinema novo e da retomada do cinema brasileiro.

Aos 71 anos, com energia de garoto, o ator comenta os filmes que fez com paixão contagiante. Adora imitar os diretores com quem trabalhou, alterando a voz e ampliando os gestos para falar do barroco Glauber Rocha e baixando o tom para mostrar como Walter Salles dirige os atores. Bastos está na novela "Cabocla" e em breve volta às telas em "Irmãos de Fé", filme do padre Marcelo Rossi. Em entrevista à Folha, ele faz balanço de sua carreira.

Folha - Como o cinema entrou na sua vida?
Othon Bastos -
Quando Alex Viany fez "Sol sobre a Lama", na Bahia. Foi meu primeiro filme, em 1960. Em seguida conheci Glauber. Ele tinha 18, 19 anos, mas já era respeitadíssimo. Ficamos amigos. Um tempo depois, com a Sociedade de Teatro dos Novos, começamos a fazer espetáculos inspirados em cordéis com a técnica de Brecht, que Glauber viu e adorou.

Folha - Por isso ele o chamou para fazer "Deus e o Diabo"?
Bastos -
Não, quem estava escalado era o Adriano Lisboa, um homem bonitíssimo, louro, de olhos azuis, alto, para duelar com o Maurício do Valle, aquele armário. Mas na última hora Adriano optou fazer outro filme, "Crime no Sacopã", do Roberto Pires.

Folha - "Deus e o Diabo" transformou-se muito na filmagem?
Bastos -
Bastante. O roteiro original era bem mais tradicional, tinha flashbacks etc. Foi depois das conversas sobre Brecht e a experiência do teatro de cordel que o Glauber resolveu mudar tudo. Numa viagem de carro de Salvador a Monte Santo, com o roteiro na mão, fomos trocando tudo.

Folha - Como nasceu o gestual do Corisco?
Bastos -
Corisco, na Bahia, é aquele fogo de artifício que você acende e ele sai rodando, alucinado. Pensei em fazer isso com o personagem, e o Glauber adorou a idéia. Foi uma loucura, um cangaceiro ficar rodando, como uma louca. Mas Corisco é ágil, pensa rápido, e aquilo combinou bem com nossas idéias. O filme foi feito todo pensado a partir da técnica de Brecht, que de certa forma é também a técnica do contador.

Folha - Depois de "Deus e o Diabo", por que você ficou quatro anos sem filmar?
Bastos -
Porque as pessoas só me ofereciam cangaceiros e bandidos violentos. Além disso, virei um ator do Glauber, pertencia a ele. Antes de me chamar, as pessoas ligavam para ele primeiro. Glauber gargalhava e dizia: "Não sou agente do Othon". Depois ligava para mim: "Vou querer 20%!".

Folha - Com "Os Deuses e os Mortos" (1970), de Ruy Guerra, você ganhou seu primeiro prêmio em cinema, no Festival de Brasília.
Bastos -
É um filme que adoro, que também não ia fazer. Quase todos os filmes que fiz foram por acaso. O Bentinho de "Capitu", do Paulo César Saraceni, por exemplo, seria o Gianfrancesco Guarnieri, que não pôde fazer. O Ruy filmaria com o Walmor Chagas, mas ele teve uma hepatite.

Folha - Qual a diferença entre Glauber e Ruy?
Bastos -
Glauber era épico; Ruy é a razão. Glauber leva o ator no impulso. Com Ruy, a gente ensaiava cinco, seis horas antes de rodar. Quando ele achava que estava pronto, chamava o grande Dib Lutfi: "A cena é essa, ande com a câmera, não atrapalhe os atores".

Folha - Alguns consideram seu melhor trabalho Paulo Honório de "São Bernardo", de Leon Hirszman.
Bastos -
Existem três filmes especialmente importantes na minha carreira: "Deus e o Diabo", "São Bernardo" e "Os Sermões", de Julio Bressane. "São Bernardo" eu quase não aceitei. A gente abre o livro de Graciliano Ramos e lê que Paulo Honório é ruivo, tem mãos enormes e lábios grossos, e esse, obviamente, não sou eu. Mas Leon me convenceu, dizendo que queria enfatizar o lado político.

Folha - Você trabalhou com Walter Salles e Laís Bodanzky. A nova geração de cineastas é acompanhada por nova geração de atores?
Bastos -
Sem dúvida, está surgindo uma geração talentosíssima, com nomes como Rodrigo Santoro, Lázaro Ramos, Wagner Moura. Espero que tenham mais chance de fazer cinema. Eu queria ter feito mais, mas fica difícil com a produção interrompida a toda hora. Tenho a impressão de que o cinema brasileiro está engatinhando para uma permanência maior, mais industrial. Isso é importante, gera oportunidades e, com o tempo, melhores filmes.

Especial
  • Arquivo: veja o que já foi publicado sobre Othon Bastos
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