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17/07/2004 - 10h50

Expedição do Teatro da Vertigem vai a comunidade do Santo Daime

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IVAN DELMANTO
especial para a Folha Online

Em um dos momentos mais inusitados da viagem, o grupo Teatro da Vertigem visitou uma comunidade de correntes do Santo Daime, encontrando uma realidade incompreensível em Porto Velho (Rondônia). Acompanhe:

Terça-feira, 13/7/2004: Daime

Em Porto Velho (Rondônia), ficamos abrigados em uma pequena chácara, sede de uma das correntes do Santo Daime. A acolhida e nossa estadia foram inundadas pela doçura de todos da comunidade.

Depois de uma entrada de terra, avistam-se algumas casas de madeira bem rústica, cercando o pequeno templo.

O templo, erguido em tábuas de madeira branca, tem uma estrutura bastante precária, com bancos simples e um teto pintado de azul, com nuvens que parecem crateras de papelão e estrelas de papel laminado.

Tudo por aqui parece de papel, como se fôssemos dissolver ou voar com o vento, a qualquer momento.

No altar, uma grande bandeira do Brasil, coberta por retratos amarelados dos fundadores do Daime (que nasceu na região de Brasiléia, no Acre).

No centro, um retrato do Marechal Rondon forma com as mensagens sobre Deus, Pátria, Cristo e Legalismo, escritas em bandeiras penduradas no teto, um conjunto absurdo e incompreensível, digno dos melhores momentos que encontramos no Vale do Amanhecer de Tia Neiva.

O Daime surgiu na floresta, quando os seringueiros aprenderam com os indígenas a usar os efeitos da erva alucinógena Ayahuasca em curas físicas e espirituais.

Desde sempre, encontrou seus membros junto a extratos sociais menos favorecidos, principalmente do campesinato. Isso explica, em parte, a influência dos valores militares em todos os ritos --desde o uniforme utilizado pelos fiéis, chamado de farda, até os símbolos patrióticos dentro de uma estrutura de poder altamente hierarquizada--, já que muitas vezes o Exército representa a única possibilidade de ascensão social.

A sensação do contato com uma realidade incompreensível não provém apenas de quem não conhece a religião e está observando tudo com uma lente de aumento do pesquisador da metrópole do Sul.

O incompreensível aqui é ar que se respira e se engole vivo. E não é o incompreensível dos mistérios da fé; é o caótico de uma realidade que, misturada com as danças, os cantos e o efeito alucinógeno da erva, desaba como uma avalanche.

A realidade, assim como os lemas sem sentido e o hinário recheado de clichês feitos do nada, é um texto escrito em todas as línguas do universo, Babel que não pode ser lida e nem vivida sem a proteção do mergulho em rocha lisa e impermeável ao mundo, cercada de silêncio escuro

E é uma rocha que aquece e faz esquecer, como nenhuma outra, exatamente porque não pode ser lida.

Ivan Delmanto é pesquisador e coordenador teórico e de dramaturgismo do projeto Vertigem BR3, do Teatro da Vertigem. Escreve periodicamente um "Diário de Viagem" para a Folha Online, narrando a experiência do grupo pelo interior do Brasil

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