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21/07/2004 - 08h57

Diretor Ilo Krugli assopra utopias com o grupo Ventoforte

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VALMIR SANTOS
enviado a São José do Rio Preto

Uma lembrança. Quando tinha sete, oito anos, o menino não pôde ir com os colegas de escola a uma apresentação teatral. Faltava-lhe dinheiro para o ingresso e para o transporte. No dia seguinte, soube em sala de aula como fora a peça. Moldou-a à imaginação, memorizou as falas e, pouco tempo depois, chamou a turma para brincar de teatro com aquela mesma história que, em adulto, descobriu tratar-se de "O Príncipe Feliz", do inglês Oscar Wilde.

Foi ali que Ilo Krugli, 73, considera ter enraizado o carismático contador de histórias que é.

"O sofrimento não é um mero trampolim para a criação do artista. Não sou tudo o que sou porque fui pobre. Como criança, eu merecia muito mais", diz Krugli, com medo da equação perversa de que se ganha pelo déficit.

Ator, diretor, dramaturgo e artista plástico, Krugli faz teatro em meio a retalhos, sucatas, bonecos, poemas, música, dança, atores e público, tudo e todos comungados no espírito de festa que imprime às apresentações.

Quem assiste à montagem de "Victor Hugo, Onde Você Está?", uma das atrações de hoje do Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto, por exemplo, vai deparar com elementos cênicos e dramatúrgicos que transitam naturalmente os universos do adulto e da criança.

Tem sido assim desde o primeiro espetáculo da companhia Ventoforte, "Histórias de Lenços e Ventos" (1974), que lançou o grupo no Rio de Janeiro, 30 anos atrás, e assoprava liberdade em tempos de ditadura militar.

E dentro do guarda-chuva curatorial do FIT Rio Preto, que mira as Américas, Krugli é dos nomes mais pertinentes.

Filho de pais judeus poloneses que imigraram para a Argentina, onde militavam em sindicatos, ele passou a infância e adolescência em Buenos Aires.

Atingida a maioridade, procedeu como a maioria de sua geração, descontente com o "eurocentrismo" do país, e desbravou novos horizontes.

Viajou para a Bolívia, Peru, Chile e Brasil, sempre mambembando com seu teatro de animação. "Minha identidade é latino-americana", diz Krugli, cujo castelhano não arrefece.

No Brasil, chegou em 1961, mas viajou constantemente. Durante passagem por Santiago, uniu-se a um grupo local, dissolvido pelo Exército após o golpe do general Pinochet, em 1973. Krugli foi preso. Solto, voltou ao Brasil, onde fixou residência de vez. "Fui atropelado por um regime militar, mas logo seria obrigado a lidar com outro", diz, referindo-se à ditadura brasileira (1964-85).

Morou no Rio. Nos anos 70 e 80, trabalhou com intelectuais que ajudaram a forjar seu talento com as artes cênicas, ainda que oriundos de áreas distintas: os educador Augusto Rodrigues e Anísio Teixeira; o poeta Ferreira Gullar; a psiquiatra Nise da Silveira etc.

A partir de 1981, o grupo se mudou para São Paulo, em busca de melhores condições de trabalho (recentemente, ganhou a Lei de Fomento ao Teatro).

Em 1985, seus integrantes ocuparam terreno abandonado no Itaim Bibi, bairro nobre da capital paulista. Hoje, regularizado, Krugli mora nos fundos. "Passo dia e noite com a mão na massa", afirma o dramaturgo.

Em Rio Preto, ele apresenta as duas partes de "Victor Hugo", uma a cada noite, com personagens marginalizados de obras do escritor francês (mendigos, ciganos, crianças exploradas etc).

Krugli diz que estava internado em 2001, com problemas de alergia, quando sonhou com uma mulher que chamava o tempo todo pelo nome do autor. Daí o insight para o espetáculo adulto que, segundo o ator, reivindica do público a "potência mágica" das crianças diante do encanto e do medo.

O jornalista Valmir Santos e a fotógrafa Lenise Pinheiro viajam a convite da organização do festival

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