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24/07/2004 - 09h12

Com Balé da Cidade, bossa nova se transforma em outra bossa

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INÊS BOGÉA
crítica da Folha

"Eu quis amar mas tive medo. Eu quis salvar meu coração." Dançando invisivelmente no espaço do teatro, os versos de "Água de Beber" (Tom Jobim/Vinicius de Moraes) abrem sozinhos a nova coreografia de Henrique Rodovalho para o Balé da Cidade, inspirada na (e intitulada) "Bossa". Já definem as alegrias e tristezas que estão pela frente, e abrem "todas as portas" para as ironias azuis desse balé, que estreou anteontem no Municipal, num programa que inclui boas remontagens de "Lac", "Adagietto" e "Máscaras do Tempo".

Movimentos tortuosos, assimétricos, alternando momentos de serenidade com outros cheios de acentos, quando um corpo passa pelo outro quase sem se tocar. Fica no ar o risco de uma revelação que não se dá. Quase uma alegoria sentimental da bossa nova como projeto brasileiro, um ideal interrompido de civilidade.

Na dança isso leva também às narrativas de um encontro que nunca acontece, nutrido pelas provocações e tentativas mútuas de novos relacionamentos. No fundo, vê-se o vídeo-cenário de uma sala de espera, outra imagem que, no contexto, não pode não ser lida como símbolo.

No desenvolvimento da peça os movimentos se desdobram criando estruturas novas e repetições com variantes. São solos, duos, trios. Tudo muito engenhoso e charmoso. Um crítico mais duro dirá que o sentido maior do conjunto escapa à peça: a dramaturgia tem suas fraquezas, especialmente nas tiradas visuais e sonoras. A bossa nova é uma outra bossa, mas sempre corre o perigo de se diminuir em acrílico, o que é parte da ironia de Rodovalho, decerto, mas talvez nem sempre vença seu próprio humor.

Um caso bem-sucedido é o duo de Luiza Meirelles e Yasser Diaz, ao som de "Só Danço Samba", ela num samba e ele num break, que deságua no samba na passagem de um pelo outro. Aqui está tudo em evidência: braços, pernas, corações, no ar picante e leve de uma intimidade nova, uma nova bossa.

"É, você que é feita de azul/ Me deixa morar neste azul", canta Elis acompanhada pelo piano de Tom Jobim, e nesses momentos não se sabe mais até que ponto a azulada acrílica sala de espera não serve, afinal, de cenário certo para as irresoluções brasileiras, cujo ponto de fuga será uma felicidade inusitada, joão gilbertiana, mas cujo ponto de chegada parece sempre triste, para não dizer comicamente além de onde se está. "Quem ouvir o hô-ba-la-lá..."

Avaliação:

Balé da Cidade
Onde:
Teatro Municipal (pça. Ramos de Azevedo, s/nº; tel. 223-3022)
Quando: hoje, às 21h; amanhã, às 11h; 27/7, às 21h
Quanto: de R$ 10 a R$ 15

Especial
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