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17/08/2004
-
04h41
TIAGO MATA MACHADO
crítico da Folha
Os extras (sessões comentadas, entrevistas e materiais de arquivo) acompanham, em seu frenesi verborrágico, o pacote dos seis filmes que os irmãos Marx fizeram na MGM.
Pena que todo o palavrório não venha com tradução à altura: no que depender das legendas, o público brasileiro vai ficar sem entender o essencial do humor dos Marx, seus trocadilhos.
Talvez seja exigir demais do mercado brasileiro de DVDs, mas os Marx continuam a merecer uma tradução mais inventiva. A cada trocadilho, seria preciso colocar entre parênteses o segundo sentido: quando Groucho fala, em "Uma Noite na Ópera" (1935), por exemplo, em "sanity clause" (cláusula de sanidade), seria preciso colocar entre parênteses "Santa Claus" (Papai Noel).
Nos filmes dos Marx, o duplo sentido está por todo lado, até nas mímicas de Harpo. Não são apenas as palavras que escorregam para um outro sentido, mas a própria identidade dos personagens. Eles nunca são o que parecem, um pouco como os móveis multifuncionais de "A Grande Loja".
"Afinal, o que você é? Detetive, gerente ou poeta?", pergunta a Groucho o vilão dessa comédia de 41. "Os três, e ainda bom de cama", responde, piscando para a parceira Margaret Dumont.
Eterno impostor, Groucho continua a bancar, nos filmes da fase MGM, a falsa autoridade que seduz, explora e esculhamba as viúvas (des)respeitáveis encarnadas por Dumont, vítima preferencial da verve antiestablishment dos Marx desde 1925.
A diferença para os filmes dos Marx na Paramount, feitos na era pré-Código Hayes (de censura) de Hollywood, é que Groucho passa a ter de responder por sua farsa, sendo a todo momento inquirido. Seja como for, Groucho se vira: em sua esquizofrenia verborrágica, antecipa as conversas tresloucadas das "screwball comedies", auge do cinema falado norte-americano.
Harpo Marx continua a compor, com Chico, a tropa de choque do grupo, sempre no papel do criado de fidelidade duvidosa, mas deixa de ser, nos filmes da Metro, um perseguidor de loiras.
Os Marx da fase na Metro são, de modo geral, menos livres e gratuitos do que na fase da Paramount. Tiveram de se conformar tanto ao Código Hayes quanto ao padrão MGM, mas não deixaram de demonstrar gratidão para com o responsável por essa conformação, o produtor Irving Thalberg.
O nome de Thalberg não consta nos créditos. Ele achava que alguém que estivesse na posição de dar créditos a si mesmo não tinha o direito de fazê-lo, mas, não fosse ele, os Marx teriam, provavelmente, botado as barbas de molho depois do fracasso de público de "Diabo a Quatro" (1933).
Sob a tutela de Thalberg, as comédias caóticas dos Marx ganham a linearidade dos pequenos dramas hollywoodianos: são sempre histórias de jovens casais cujo casamento é ameaçado pela ganância de um terceiro. Ganham também aquele aspecto suntuoso e um tanto "démodé" das grandes produções da Metro, figurinos e cenários classudos, números musicais grandiloqüentes.
Os filmes dos Marx na MGM envelheceram mais do que os da Paramount. "Um Dia nas Corridas" menos do que "Uma Noite na Ópera".
Depois de reconciliar os Marx com o público (e um sucesso que eles só conheceram na Broadway), Thalberg morre (aos 37 anos), deixando os irmãos órfãos e à sanha do chefão da Metro, Louis B. Mayer. São desse período "No Tempo da Onça", "A Grande Loja" e "Irmãos Marx no Circo". "Uma Noite em Casablanca" encerra a aventura dos irmãos.
Avaliação:
Coleção Irmãos Marx
Lançamento: Warner
Quanto: R$ 129,90 (a caixa)
Especial
Arquivo: veja o que já foi publicado sobre os irmãos Marx
Pacote traz seis filmes dos irmãos Marx da fase MGM
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crítico da Folha
Os extras (sessões comentadas, entrevistas e materiais de arquivo) acompanham, em seu frenesi verborrágico, o pacote dos seis filmes que os irmãos Marx fizeram na MGM.
Pena que todo o palavrório não venha com tradução à altura: no que depender das legendas, o público brasileiro vai ficar sem entender o essencial do humor dos Marx, seus trocadilhos.
Talvez seja exigir demais do mercado brasileiro de DVDs, mas os Marx continuam a merecer uma tradução mais inventiva. A cada trocadilho, seria preciso colocar entre parênteses o segundo sentido: quando Groucho fala, em "Uma Noite na Ópera" (1935), por exemplo, em "sanity clause" (cláusula de sanidade), seria preciso colocar entre parênteses "Santa Claus" (Papai Noel).
Nos filmes dos Marx, o duplo sentido está por todo lado, até nas mímicas de Harpo. Não são apenas as palavras que escorregam para um outro sentido, mas a própria identidade dos personagens. Eles nunca são o que parecem, um pouco como os móveis multifuncionais de "A Grande Loja".
"Afinal, o que você é? Detetive, gerente ou poeta?", pergunta a Groucho o vilão dessa comédia de 41. "Os três, e ainda bom de cama", responde, piscando para a parceira Margaret Dumont.
Eterno impostor, Groucho continua a bancar, nos filmes da fase MGM, a falsa autoridade que seduz, explora e esculhamba as viúvas (des)respeitáveis encarnadas por Dumont, vítima preferencial da verve antiestablishment dos Marx desde 1925.
A diferença para os filmes dos Marx na Paramount, feitos na era pré-Código Hayes (de censura) de Hollywood, é que Groucho passa a ter de responder por sua farsa, sendo a todo momento inquirido. Seja como for, Groucho se vira: em sua esquizofrenia verborrágica, antecipa as conversas tresloucadas das "screwball comedies", auge do cinema falado norte-americano.
Harpo Marx continua a compor, com Chico, a tropa de choque do grupo, sempre no papel do criado de fidelidade duvidosa, mas deixa de ser, nos filmes da Metro, um perseguidor de loiras.
Os Marx da fase na Metro são, de modo geral, menos livres e gratuitos do que na fase da Paramount. Tiveram de se conformar tanto ao Código Hayes quanto ao padrão MGM, mas não deixaram de demonstrar gratidão para com o responsável por essa conformação, o produtor Irving Thalberg.
O nome de Thalberg não consta nos créditos. Ele achava que alguém que estivesse na posição de dar créditos a si mesmo não tinha o direito de fazê-lo, mas, não fosse ele, os Marx teriam, provavelmente, botado as barbas de molho depois do fracasso de público de "Diabo a Quatro" (1933).
Sob a tutela de Thalberg, as comédias caóticas dos Marx ganham a linearidade dos pequenos dramas hollywoodianos: são sempre histórias de jovens casais cujo casamento é ameaçado pela ganância de um terceiro. Ganham também aquele aspecto suntuoso e um tanto "démodé" das grandes produções da Metro, figurinos e cenários classudos, números musicais grandiloqüentes.
Os filmes dos Marx na MGM envelheceram mais do que os da Paramount. "Um Dia nas Corridas" menos do que "Uma Noite na Ópera".
Depois de reconciliar os Marx com o público (e um sucesso que eles só conheceram na Broadway), Thalberg morre (aos 37 anos), deixando os irmãos órfãos e à sanha do chefão da Metro, Louis B. Mayer. São desse período "No Tempo da Onça", "A Grande Loja" e "Irmãos Marx no Circo". "Uma Noite em Casablanca" encerra a aventura dos irmãos.
Avaliação:
Coleção Irmãos Marx
Lançamento: Warner
Quanto: R$ 129,90 (a caixa)
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