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17/08/2004 - 08h12

Simplicidade é o principal mérito de "O Encontro das Águas"

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SERGIO SALVIA COELHO
crítico da Folha

A simplicidade é talvez a conquista mais difícil em teatro. Despojar uma fábula de qualquer tentação de clichê ou demonstração técnica, dar conta do seu essencial de modo desarmante atingindo a todos simultaneamente é uma façanha que em geral marca a maturidade de um criador. É o caso de "O Encontro das Águas".

Antes de tudo, o texto de Sérgio Roveri lida com temas delicados sem perder o humor e a poesia nem cair em uma idealização automistificadora.

Retrata, quase em tempo real, o encontro casual entre Marcelo, desesperado por ter causado a morte daquele por quem começava a se apaixonar, e Apolônio, que o encontra em cima da ponte, pronto para se jogar.

A simplicidade no tom e na narrativa garante que o espetáculo não caia nunca no melodrama. A intensidade da situação dramática faz com que mesmo um personagem do qual temos poucas pistas, como Apolônio, acabe ganhando uma aura de fábula: estaria ele ali como um anjo guardião, ou um "justo" da tradição judaica, para dissuadir os suicidas?

No entanto, ele não tem nada de herói; recita poesias famosas como se fossem suas e talvez seu único objetivo consciente seja vender as pulseiras que fabrica.

Marcas da direção

O grande mérito da direção de Alberto Guzik é o de se fazer invisível. No exíguo espaço cênico dos Satyros, um corredor entre duas arquibancadas concebido originalmente para a apresentação de "Kaspar", em cartaz no local, as marcas às vezes se fazem repetitivas, mas nunca roubam a cena.

A experiência de Guzik vale sobretudo para orientar os jovens atores na incorporação das marcas e na interiorização dos tempos --e ele tem sólidos aliados para isso na delicada trilha de Tunica Teixeira e nos figurinos de Leopoldo Pacheco e Carol Badra.

José Roberto Jardim faz Apolônio com grande carisma, ameaçador na sua força, sedutor na exposição de sua fragilidade. Pedro Henrique Moutinho, no papel de Marcelo, tem o grande mérito de expor um amor que por acaso é homossexual, sem nenhuma caracterização desnecessária, denunciando apenas de quando em quando sua inexperiência com uma leve recitação nas falas.

Fábula sem moral clara e com final aberto, tem o curioso mérito de dar impressão de pessimismo aos tristes e otimismo aos esperançosos, o que é sinal de grande elegância.

Dá conta, sobretudo, de um momento sempre gratificante para o público, que é o de testemunhar um encontro transformador entre duas pessoas que mal se conhecem, mas que por isso mesmo são responsáveis por dar mutuamente sentido às suas vidas, essa profissão humana, como diria Camus.

A falta de arrogância, na simplicidade de intenções do projeto, acaba se constituindo em uma ambição tácita plenamente realizada na montagem.

"O Encontro das Águas", sem alarde, acaba marcando profundamente: é uma peça para levar um grande amigo ou um grande amor.

Avaliação:

O Encontro das Águas
Texto:
Sérgio Roveri
Direção: Alberto Guzik
Com: José Roberto Jardim e Pedro Henrique Moutinho
Quando: às ter. e qua., às 21h30; até o final de setembro
Onde: Espaço dos Satyros (pça. Franklin Roosevelt, 214, República, SP, tel. 0/xx/ 11/ 3258-6345)
Quanto: R$ 10

Especial
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