Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
23/08/2004 - 11h04

Livro mostra por que vale a pena mergulhar na ficção brasileira

Publicidade

MARCELO PEN
Crítico da Folha de S.Paulo

Ferréz é hip hop, gueto, mano e mina, retrato da periferia, drogas, sexo, sangue e violência. Clarice Lispector (1925-1977) é burguesia carioca, introspecção, densidade, abismo, vertigem, Deus e a barata.

O autor paulistano, de "Capão Pecado" e "Manual Prático do Ódio", e a autora de "A Paixão Segundo G.H." e "A Hora da Estrela" --que nasceu na Ucrânia, mas veio bebê para o Brasil-- parecem tão diferentes quanto água e vinho.

Mas, segundo a crítica literária Marisa Lajolo, eles também têm semelhanças --e a principal talvez seja que os dois constituem excelente razão para a gente notar, ler e apreciar o romance brasileiro.

Marisa mostra que literatura é diferente daquela coisa chata de leitura obrigatória. Em "Como e Por que Ler o Romance Brasileiro", ela confessa: "Leitora apaixonada, fã de carteirinha, me envolvo com os romances de que gosto: curto, torço, rôo as unhas, leio de novo um pedaço que tenha me agradado de forma particular".

Além dos escritores consagrados do passado, como Euclydes da Cunha e Machado de Assis, ela inclui na sua análise vários livros e autores atuais. Na verdade, muitos podem estar escrevendo suas obras no exato momento em que você lê esta resenha, como Paulo Lins, de "Cidade de Deus"; Jô Soares, de "O Xangô de Baker Street", Luiz Ruffato, de "Eles Eram Muitos Cavalos" e, é claro, Ferréz.

Lajolo também dá destaque às escritoras e, mais uma vez, não examina apenas as obras famosas de Clarice Lispector, Rachel de Queiroz (de "Memorial de Maria Moura") ou Lygia Fagundes Telles (de "As Horas Nuas").

Uma curiosidade do livro, por exemplo, é o fato de ele pôr em evidência duas autoras do século 19, hoje desconhecidas. Uma delas é Ana Luíza de Azevedo Castro, que publicou o romance "Dona Narcisa de Villar" (1859) sob o pseudônimo de Indígena do Ypiranga.

Outra é Júlia Lopes de Almeida, que escreveu "A Falência", romance lançado em 1901, que mostra a cidade do Rio de Janeiro de uma forma totalmente desglamourizada, às vezes feia mesmo, na qual as figuras humanas não se conhecem pelos nomes, mas pelas ocupações: o carroceiro, os carregadores etc.

Do sertão aos pampas

O romance brasileiro dá vida a todas as regiões do país, dos canaviais de Pernambuco ao sertão de Minas Gerais, das fazendas da Bahia aos pampas gaúchos. Não está apenas no interior, mas também nas cidades (São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre), e representa todas os setores sociais --da classe dominante às favelas.

Além disso, mergulha no tempo, trazendo para os nossos dias, como se fosse num filme palpitante, lances que remetem à história nacional, como a condição dos negros nas senzalas, a situação da mulher no Brasil colonial e os conflitos durante a ditadura militar das décadas de 1960 e 70.

Pois o que Lajolo sugere é que o romance, ao contemplar tantos aspectos da vida brasileira, no fundo faz com que o leitor se identifique com as histórias narradas. "Além da história", acrescenta, "o leitor encontra nos bons romances a sua pessoa, em torno da qual o romancista lança seu charme e tece suas teias".

Por isso Lajolo propõe que o leitor estufe o peito, mire-se no espelho e exclame: "Eu, sim, é que sou o herói do romance!". Quem se habilita?

COMO E POR QUE LER O ROMANCE BRASILEIRO. Análise de livros e de autores atuais e também de clássicos da literatura brasileira. Autora: Marisa Lajolo. Lançamento: editora Objetiva. Quanto: R$ 31,90 (176 págs.)

Especial
  • Arquivo: veja o que já foi publicado sobre livros de ficção brasileira
  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página