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16/12/2008 - 14h15

ILUSTRADA 50 ANOS: 2006 - Pina Bausch equilibra a tristeza do mundo

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"Pina Bausch equilibra a tristeza do mundo", assinado por Fabio Cypriano, foi publicado originalmente quinta-feira, 03 de agosto de 2006.

Há já pelo menos uma década a coreógrafa alemã Pina Bausch tem dado aos seus espetáculos um tom mais feliz, numa estratégia que busca fazer sua arte "contrabalançar a tristeza do mundo", como por diversas vezes afirmou. Tal estratégia ganhou ares de manifesto com "Para as Crianças de Ontem, Hoje e Amanhã", peça que estreou em 2002, foi criada após o impacto do 11 de Setembro e será exibida por seis dias em São Paulo, a partir do próximo dia 28, e depois no festival Porto Alegre em Cena, em 7 e 8 de setembro.

A escolha da apresentação de "Para as Crianças..." -o Tanztheater Wuppertal de Bausch tem em seu repertório mais de 20 peças- coube à própria coreógrafa. "Ela fez questão de trazer esse espetáculo, disse que queria que ele fosse visto no Brasil", conta Emilio Kalil, produtor que traz a companhia.

Federico Gambarini/Efe
A bailarina alemã Pina Bausch
A bailarina alemã Pina Bausch

É a sexta vez que Bausch se apresenta no Brasil, a quinta em São Paulo, algo raro na apertada agenda do grupo. O motivo é o forte vínculo da alemã com o país -até suas férias passa por aqui, às vezes.

"Amo o Brasil, adoro sua gente, sua tranqüilidade dentro de uma situação tão adversa", disse ela à Folha, numa entrevista em duas etapas. Um gravador, as perguntas, fitas e pilhas foram enviados à coreógrafa, durante sua estada em Paris, no mês passado, que respondeu ao aparelho e o enviou à reportagem. Leia a seguir o resultado.

FOLHA - "Para as Crianças de Ontem, Hoje e Amanhã" foi criada após o 11 de Setembro. A peça possui relação com essa tragédia?
PINA BAUSCH - Sim, mas tem a ver com todas as tragédias, em como vivemos num tempo dolorido, de desamparo. Existem certos momentos que não sei como criar um espetáculo, não sinto nada, é muito difícil continuar criando. Então o que podemos fazer? É muito complicado. É usar algo que está dentro de nós, mas não só. No fundo, todas as nossas criações possuem uma relação estreita com o que acontece no mundo.

FOLHA - A peça é, já no nome, dedicada às crianças. Por quê?
BAUSCH - Porque creio que é um título muito importante. O que pode ser mais importante do que esse título? A peça aborda certos sentimentos que todos nós temos, como a fragilidade, a ingenuidade que perdemos. Não se trata apenas de abordar como estão as crianças hoje, mas que todos já fomos crianças. Creio que o título diz tudo o que eu gostaria de dizer.

FOLHA - Nessa peça, a sra. utiliza textos como "Harmonia Caelestis", do escritor húngaro Péter Esterhazy, ou ainda fábulas infantis norte-americanas recolhidas por Michael Caduto und Joseph Bruchac. Por que usar esses textos?
BAUSCH - Oh, nós sempre lemos muitos textos e estamos buscando por certas questões. Também conheço Péter muito bem, já li diversos livros dele, ele tem um humor muito especial. É uma forma de construir o espetáculo. Usamos textos como usamos movimento ou música. A mesma coisa para os textos de Michael. É a forma como trabalhamos.

FOLHA - Em seus espetáculos, há sempre a natureza presente. Água, terra, plantas ou areia, como em "Para as Crianças...". Por que a natureza é necessária em suas peças?
BAUSCH - Porque ela é de fato importante. Mas há outra razão. Trabalho a maior parte do tempo dentro de um estúdio sem janelas, em Wuppertal. Era um antigo cinema, que usamos como sala de ensaios. Mas eu coloco minha fantasia lá dentro também. Eu tenho o nascer do sol, a areia. Para mim, tudo pode estar lá. E, normalmente, nós não vemos apenas esses elementos da natureza em nossas peças, nós os vivenciamos, eles interferem em nosso movimento, seja a grama ou folhas... Isso traz uma nova experiência para o corpo, para o som. Há tantas coisas também sensoriais para tratar. Se eu não posso ir lá fora, eu trago tudo isso para dentro [risadas].

FOLHA - Outro elemento constante é a interação com o público, servindo vinho, café, dando abraços... A sra. gostaria que não houvesse limites entre palco e platéia?
BAUSCH - Eu sou muito tímida, há sempre um limite. O que é bonito sobre encenar um espetáculo é que cada performance é diferente da outra. Ela nunca pode ser repetida novamente, sempre será única. E eu acredito que público e dançarinos são apenas uma coisa, por isso adoro performances ao vivo. Ao mesmo tempo, é sempre um recomeço. Depois que fazemos com que ela tenha acontecido, precisamos conseguir torná-la viva novamente no dia seguinte. Uma vez feita, há sempre que recomeçar. E eu gosto de vir aqui e sentir cada um, mas de uma maneira muito respeitosa. E eu sempre sinto algo especial nesse tipo de relação. Há algo muito mais além do que simplesmente servir vinho. Vinho ou café são símbolos de proximidade, além de haver também um certo humor disso ocorrer num teatro. Mas eu mesma tenho meus limites, sou mesmo muito tímida.

FOLHA - O que a motiva a criar uma peça de dança atualmente?
BAUSCH - É a única maneira que eu consigo me expressar de fato. É a minha linguagem, é como eu sei dizer o que acho que devo dizer -e não em palavras apenas. O que espero, do que gostaria. É através das peças que as pessoas me conhecem de verdade.

 

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