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23/10/2000 - 19h44

Crítica: "Palavra e Utopia" distancia público do cinema português

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da Reuters
em São Paulo

A ousadia cinematográfica do diretor português Manoel de Oliveira, que conta a saga do padre Antônio Vieira em "Palavra e Utopia", deixou o público dividido no Festival de Veneza. Na 24ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o resultado não foi diferente.

Apesar de o filme seduzir pela extrema beleza fotográfica, o ritmo lento e a aparente desconexão entre os fatos estão sendo considerados de difícil compreensão para o público brasileiro.

O filme, uma produção de quatro países (Portugal, Brasil, Espanha e França), abriu a 24a. edição da mostra na quarta-feira passada, reservada para convidados. As suas mais de duas horas de projeção não conseguiram segurar a maior parte do público até o final.

"Palavra e Utopia", que em princípio teria tudo para cair no gosto popular dado à sua inserção dentro dos 500 anos de Descobrimento do Brasil e à popularidade do ator principal, Lima Duarte, não empolga.

"Eu me senti realizado trabalhando com o Manoel, único diretor vivo que dirigiu um filme no cinema mudo", destacou Lima Duarte à Reuters no dia da exibição do filme para os convidados.

O ânimo de Lima Duarte, no entanto, não está no filme. Abusando do estilo verborrágico, por meio de longos diálogos de um português intricado e pouco compreensível para o brasileiro, o filme peca no descaso com a comunicação com o público, que fica um tanto perdido na contextualização dos fatos históricos e impaciente com os discursos intermináveis e distantes da realidade contemporânea.

O filme parte de 1663, quando Antônio Vieira comparece diante da Inquisição portuguesa e é obrigado a explicar as suas posições em relação à escravidão e à situação da exploração dos índios pela colônia portuguesa. Vieira, que chegou a ser amigo íntimo de Dom João 4º, transforma-se em alvo de intriga na corte e acaba vendo o seu poder de jesuíta enfraquecido.

"Palavra e Utopia", no entanto, tem qualidades inegáveis, como a exploração de uma bela iluminação dramática que transforma muitas sequências em lentos quadros, um recurso cinematográfico que ao mesmo tempo também contribui para o distanciamento do público.

Em vários momentos, Manoel de Oliveira utiliza desse recurso para trabalhar metáforas ou dar uma dimensão espiritual ao filme, como nas cenas em que a câmera apenas mostra o movimento do mar e a voz do padre Antônio Vieira aparece ao fundo questionando a escravidão e propondo a liberdade.

Oliveira chega a ressaltar a imobilidade de sua câmera ao mostrar um quadro de um jesuíta abaixado beijando as mãos de uma autoridade, uma alusão às delicadas relações existentes no questionamento do poder dominante.

Outro ponto alto da obra de Manoel de Oliveira é sem dúvida a atuação exemplar de Lima Duarte, que interpreta um Vieira mais velho, na sua fase da paixão. O único porém é que Lima começa a atuar já no meio do filme (outros dois atores interpretam o padre na juventude, Ricardo Trepa, e na razão, Luís Miguel Cintra), o que faz com que o público torça para que ele entre em cena logo para injetar ânimo na narrativa.

Manoel de Oliveira é um dos maiores cineastas vivos e considerado um dos pioneiros do neo-realismo com "Aniki-Bobó" (1942), presente na 15ª mostra, onde foi homenageado com "O Ato de Primavera" (1963), "O Passado e o Presente" (1971), "Francisca" (1981) e "Meu Caso" (1986). Em 1995, Oliveira recebeu o Prêmio Especial na 19ª mostra com "O Convento".

Para quem ainda não assistiu ao polêmico filme de Manoel de Oliveira, que esteve em cartaz neste fim de semana no Cinesesc, Cinearte e Sala Uol, na sexta, sábado e domingo, vale dar uma conferida nesta complexa obra no dia 2, no Cinearte, às 18h20.

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