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12/11/2005 - 17h20

Autor de Asterix se defende de críticas

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MARCO AURÉLIO CANÔNICO
da Folha de S.Paulo

No alto da capa, ao lado do nome do personagem principal do livro, ainda é possível ver dois outros --R. Goscinny e A. Uderzo-- que estão lá há 44 anos, desde que o primeiro álbum, "Asterix, o Gaulês" (1961), foi publicado. Mas, ao descer os olhos pela capa de "O Dia em que o Céu Caiu", a recém-lançada aventura do baixinho e irredutível gaulês, o leitor se depara com outra inscrição --"Texto e desenhos de Albert Uderzo"-- que define a situação do personagem nos últimos 25 anos: é órfão de um pai.

Criado em 1957, como tirinha de jornal, pelos franceses René Goscinny (texto) e Albert Uderzo (ilustrações), Asterix sobreviveu à morte do autor de seus roteiros em 1977, vítima de um ataque cardíaco aos 51 anos. Desde 1980, Uderzo dá prosseguimento, sozinho, à série de aventuras da vila gaulesa que resiste à invasão dos romanos, no ano 50 a.C..

Ainda que o sucesso do personagem só tenha crescido desde então, criando um império próprio --com inúmeras animações, dois filmes, um parque temático e uma vasta coleção de produtos licenciados--, os fãs das velhas histórias escritas por Goscinny e, principalmente, a crítica acusaram uma acentuada queda de qualidade do texto.

A inserção de alienígenas e naves extraterrestres na aventura recente foi a gota d'água, e a suspeita de que o álbum poderia ser o último de Uderzo (um senhor de 78 anos), reforçada pela semelhança entre as capas do primeiro livro e deste último (como que fechando um ciclo), se transformou quase em torcida, em prol da memória das histórias clássicas de Asterix.

Em entrevista à Folha por telefone, Uderzo admite a má vontade dos críticos com seu texto e parece desprezá-los ("os críticos são os críticos"), brandindo a todo instante a enorme quantidade de leitores que a série ainda atrai, o que, a seu ver, justifica seu trabalho e lhe dá um selo de qualidade.
Sobre os conflitos que incendeiam a França, ele prefere não se manifestar, alegando não se envolver em questões políticas. Mas fala sobre sua carreira, sobre as críticas e deixa conselhos para os jovens quadrinistas.

Folha - Há comentários de que "O Dia em que o Céu Caiu" seria o último livro de Asterix. É verdade?

Albert Uderzo - Espero que não e não desejo que seja. Adoro meu trabalho, é uma paixão que já tenho há 60 anos, não há razão para parar agora. A menos que os leitores não se interessem mais, o que seria uma indicação de que o trabalho envelheceu.

Folha - Quanto tempo o senhor gasta para fazer cada livro?

Uderzo - Não há uma regra geral. Pode ser dois meses, nove, é difícil calcular. Há um planejamento quando é decidida a data de lançamento, mas antes disso não há um tempo determinado.

Folha - O novo álbum critica principalmente o gênero dos mangás japoneses. O senhor não aprecia a animação e os desenhos orientais?

Uderzo - [risos] Não tenho nenhuma simpatia pelos mangás, é verdade, e faço uma pequena crítica através do Asterix. Mas já encontrei editores de mangás que me disseram não ter também qualquer simpatia pelo gênero de quadrinhos franco-belgas do qual Asterix faz parte. Não é uma guerra, mas, como há uma invasão do mercado europeu por esses produtos japoneses, assim como já houve pelos americanos, eu fiz uma caricatura divertida deles. Mas não é uma declaração de guerra. Se os mangás continuam vendendo, deve ser porque eles têm alguma qualidade.

Folha - O senhor gostou dos filmes ("Asterix e Obelix contra César", 1999, e "Asterix e Obelix: Missão Cleópatra", 2002) feitos a partir de seus personagens?

Uderzo - Sim, com certeza. É claro que estou numa posição ruim para falar sobre eles, pois não sou produtor ou diretor dos filmes, mas, tendo em vista o número de espectadores que eles tiveram, diria que ficaram bons, razão pela qual já estamos em negociações para fazer um terceiro em 2008.

Folha - A popularidade de Asterix, que cresceu além dos limites dos quadrinhos, era algo que vocês almejavam ou imaginavam?

Uderzo - Nunca. Estávamos longe de prever tal sucesso. Repito com freqüência que, se tivéssemos imaginado isso tudo, teríamos sido mais prudentes na criação dos personagens porque eles foram feitos muito rapidamente, para sair no jornal. Tínhamos pressa para criar algo novo a cada dia, mas havia, talvez, uma espontaneidade na criação que gerava certa regularidade.

Folha - A importância e a popularidade dos quadrinhos em geral também aumentaram bastante. O senhor acredita que as HQs desempenhem um papel educativo?

Uderzo - Sim, ainda que não substituam a literatura. Quando criança, eu só lia livros clássicos, nada de quadrinhos. Mas acredito que eles sirvam para introduzir as crianças na leitura, porque a HQ é mais fácil de ler do que o livro, as imagens ajudam na compreensão. Temos uma instituição na França chamada Ler e Fazer Ler, para alfabetizar crianças, e usamos quadrinhos para, depois, levá-las à leitura dos clássicos.

Folha - Quais são as diferenças entre as aventuras de Asterix que o senhor escreve sozinho e aquelas que criou com Goscinny?

Uderzo - Não cabe a mim dizer, é uma pergunta que deve ser feita aos leitores. A resposta também não cabe aos críticos, que não têm sido simpáticos a mim desde que comecei a criar as histórias sozinho. Meu critério é a satisfação que os leitores obtêm com as histórias desde que as crio sozinho, há 25 anos. Se os leitores não gostassem, já teriam abandonado Asterix há muito tempo.

Folha - O senhor costuma reler as histórias antigas?

Uderzo - Não, não é meu estilo olhar para o que já passou. Há uma evolução nítida desde a criação, sobretudo no aspecto gráfico da obra, porque, como já disse, criávamos muito rapidamente no começo. Se eu pudesse refazer os primeiros álbuns, eu o faria, mas mantendo os textos de Goscinny, que têm muita qualidade.

Folha - E o que o senhor considera qualidade em quadrinhos?

Uderzo - Há muitas qualidades nos quadrinhos, a principal é agradar ao leitor, porque ele é o juiz. Se ele não gostar, não vai comprar. É simples assim.

Folha - E que conselhos o senhor daria aos quadrinistas iniciantes?
Uderzo - Atualmente as HQs movimentam muito dinheiro e a carreira adquiriu um status que não tinha antes, quando a profissão era praticamente inexistente e muito mal remunerada. Para os jovens desenhistas, eu diria que não entrassem na profissão para ganhar dinheiro, mas por amor, pois o leitor vai notar. Desenhistas não são máquinas de fazer dinheiro; o iniciante não pode se preocupar se sua obra vai funcionar ou não, em termos de vendas. Esses são o pior erro e a pior decepção que um jovem pode ter. É preciso tentar livremente.

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