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02/11/2000 - 04h46

"Lars é certificadamente louco!", diz Björk

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CLARK COLLIS, do Empire/Planet Syndication

Até mesmo pelos padrões do Festival de Cannes, obcecado por controvérsia, é preciso dizer que "Dançando no Escuro", o filme de Lars von Trier, que tem estréia prevista no Brasil para 24 de novembro, causou enorme confusão no evento deste ano.

Em parte, o problema é o filme em si -um musical em larga medida improvisado e dolorosamente longo sobre uma mulher cega que é meio operária, meio assassina. Alguns críticos choravam abertamente durante as exibições do filme no festival, mas outros eram decididamente menos entusiásticos.

Alguns dos comentaristas detestaram tanto o trabalho que ameaçaram organizar um protesto caso lhe fosse dada a Palma de Ouro, um estado de coisas que não impediu o júri presidido por Luc Besson de fazer exatamente isso.

Tumulto

O maior tumulto, porém, foi causado pelo próprio Von Trier, que descreveu sua protagonista, Björk, como "uma louca" e disse que trabalhar com ela fora uma experiência "terrível".

De fato, Catherine Deneuve, co-estrela do filme, sugeriu que a cantora pop islandesa ficou tão traumatizada com o processo de filmagem que talvez demore uma década antes que ela decida fazer seu segundo trabalho no cinema.

Assim, é uma espécie de surpresa quando, alguns meses mais tarde, Björk liga para o "Empire", aparentemente feliz por discutir o filme.

"Eu sou muito protetora com relação ao processo criativo", explica a cantora, quando questionada sobre sua reticência anterior.

"Acredito que você primeiro cria o filme, e depois espera. Quando sai dele, emocionalmente, é aí que se fala sobre o assunto. É nisso que eu e Lars realmente discordamos. Ele filmava as cenas mais pesadas e logo depois tinha vontade de falar disso diante das câmeras. Acho que o filme dele sobre "Os Idiotas" é mais longo que "Os Idiotas" (1999), sabe? Ele é certificadamente louco!"

Muitas pessoas acharam que ele estava louco ao escalar Björk para o altamente complexo papel de Selma, uma mãe solteira desesperadamente pobre. Até mesmo a cantora demorou um ano a ser convencida, a despeito da reputação de Von Trier como um dos principais cineastas europeus.

"Mas eu não conhecia o trabalho de Lars", diz a srta. Gudmundsdottir (Björk). "Ele me deu "Ondas do Destino" (1996) e eu descobri que gostava de algumas coisas e detestava outras. Não gosto das partes com o Jethro Tull. Dá vontade de apanhar uma chave de fendas e um alicate e consertar
o filme um pouco."

A despeito dessas diferenças musicais, Björk concordou também em escrever a trilha de "Dançando no Escuro", usada nas surrealistas sequências de canto e dança do filme -foram precisos 18 meses para produzir o punhado de faixas, de que Von Trier subsequentemente admitiu ter "aprendido a gostar".

"Eu o avisei", diz Björk, quando relembrada do comentário do diretor. "Disse que minha música era muito idiossincrática e que, se ele quisesse o Abba, era melhor contratar outra pessoa."

E os problemas de Björk não acabaram quando as filmagens começaram de fato. "É verdade que eu abandonei o estúdio de filmagens", diz ela, "porque eles começaram a retalhar minhas canções enquanto eu estava filmando em outro lugar. Era uma loucura. O momento do qual eu mais me orgulhava, uma ascensão emocional com uma orquestra de 80 instrumentos, estava sendo encoberto por duas ovelhas balindo. Eu larguei as filmagens e voltei com um manifesto que tratava puramente de música. Era sobre coisas como a minha necessidade de editar as canções e de cuidar do mix final da música".

No entanto, se bem que problemático, o fruto dessa relação de trabalho é um filme intensamente comovente, que vê Björk mais que sustentando o seu lado de um duelo com atores como Deneuve, David Morse e Udo Kier. Não que ela tenha pressa em repetir a experiência.

"Sempre acreditei que minha missão na vida era a música", diz ela em seu peculiar sotaque meio escandinavo, meio cockney. "Houve momentos, enquanto estava fazendo o filme, em que eu me sentia como se estivesse tendo um caso. Foi estranho perceber o quanto sou religiosa sobre música."

Assim, a despeito de seus muitos desacordos, a estrela pop diria que continua amiga de Von Trier?

"Hummmm.... Acredito que é como pessoas que voltam da Guerra do Vietnã, ou algo assim", conclui. "Eles voltam e têm conversas peculiares e ninguém entende do que falam. E definitivamente houve momentos em que salvamos a vida um do outro, se quiser. Mas houve outros momentos em que havia muita dor, também..."

Tradução Paulo Migliacci

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