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14/03/2006 - 15h16

Bienal de São Paulo tem personagens "de livro"

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PAULO SAMPAIO
da Revista da Folha

É sábado, 11, e a 19ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo está fervilhando: público, títulos e também histórias de gente que quer virar livro. Aspirante a personagem, o boliviano Reginaldo Arze, 65, comanda um curioso estande na rua A.

Ele se apresenta como cardiologista, gosta de ser reconhecido como jornalista revolucionário e explica a poucos interessados que foi o responsável pela revelação de que Che Guevara morreu assassinado e não em combate.

"Percebi depois que fizeram a autópsia que Che não tinha rigidez cadavérica; ele ainda estava quente, e denunciei a marca de um tiro próximo do abdômen. Foi um furo brutal de reportagem, que ocasionou a minha fuga imediata do país", conta.

O estande de Arze vende biografias, revistas e souvenirs de Guevara, e é decorado com uma foto em preto-e-branco, mega-vintage, do guerrilheiro já morto, observado por quatro homens, entre eles o próprio boliviano (destacado por um círculo em volta da cabeça), apontando a marca do tiro.

Arze diz que fez a pose com o dedo indicador, na hora da foto, propositalmente, para que não houvesse dúvidas de que era o autor da revelação.

Como pode o senhor não ter entrado para a história, doutor?

"Essa pergunta é interessante", diz ele, sorrindo e inclinando ligeiramente a cabeça para trás. "O que houve foi que a repressão perseguiu o médico errado, em uma cidade chamada Vallegrande; eu tinha fugido para Comarapa."

Auto-ajuda quem?

São 200 mil visitantes estimados só no fim de semana, 320 expositores, 10 mil títulos diferentes, 3.000 lançamentos. Entre as obras mais procuradas estão as de auto-ajuda, denominação que parece mais destinada aos autores do gênero que a seus leitores. No "salão de idéias", Roberto Shinyashiki fala a uma platéia de cerca de 400 pessoas sobre o relançamento de seu best-seller "Será que Amar ainda Pode Dar Certo?", que em 18 anos vendeu 1,5 milhão de cópias.

Na primeira fileira, a maioria é de mulheres. Elas sorriem à toa, assentindo com a cabeça para o palavrório sem rumo, pontos ou virgulas, de Shinyashiki.

"(...) tenho visto muitas pessoas (ele balança afirmativamente a cabeça, com os olhos muito abertos) e aí de novo falo com as mulheres (aponta indefinidamente para a platéia) que jogam suas carências em cima de um parceiro (arqueia as sobrancelhas) carência de pai; aí elas encontram um pobre coitado no qual jogam todas essas carências (imita com os braços uma caçamba de caminhão virando); ele vai morrer sem oxigênio (risos); os homens estão interessados SIM (ele grita) em amar (pausa longa); se os homens me procuram e dizem, "Roberto, qual o segredo de um amor legal (lábios comprimidos, indicando situação delicada)?", eu respondo (de chofre): é o tudo ou o nada."

Há poucos metros dali, uma assessora de imprensa surge na frente da reportagem e diz. "Estou divulgando a Bíblia traduzida para o caingangue."

Ahã. "É a segunda maior comunidade indígena do Brasil, com 30 mil habitantes. A primeira é a guarani", informa. Não sei se interessa...

Nesse momento, repórter e fotógrafo são atraídos pelos gritos de um sujeito que expõe fórmulas matemáticas em uma lousa.

"Tirem Pitágoras da cabeça!", diz o engenheiro Márcio Barbosa, 43, que propõe uma revolução nos cálculos matemáticos. Mais conhecido por dar aulas nas praças da Sé e da República, ele está ali para atrair público para o estande de uma editora. A um pequeno grupo, ele ensina uma maneira nova de calcular, por exemplo, a raiz quadrada de 961:

"Elimine o penúltimo algarismo (6) e calcule a raiz dos das pontas (9 e 1). Resultado, 3 e 1. Juntos? 31", diz, com ares de mágico, enquanto aciona a máquina de calcular para demonstrar à platéia que o resultado é aquele mesmo.

Gente famosa

As celebridades pululam nos corredores da Bienal. O alagoano Parral, que já esteve "no Jô e também umas 15 vezes na Luciana Gimenez", assiste pelo telão a mais uma palestra lotada no "salão de idéias". Parral diz ter vendido pessoalmente 12 mil livros em mesas de bares da Vila Madalena.

Escreve sobre o quê? "Filosofia é minha principal referência. Descobri Nietzsche no lixo, quando morava debaixo da ponte da Pompéia."

Jogaram Nietzsche embaixo da ponte? "Quer dizer, ele eu li na casa de um amigo. Debaixo da ponte foi o Sidney Sheldon."

Na reta final da exposição, a equipe dá uma passada no estande de esoterismo, na esperança de um descarrego. Em vez disso, leva um pito do professor de ioga Rui Afonso, 27, cabelos enrolados, calça de agasalho, camiseta e mochila: "Não sou bicho-grilo".

Afonso faz pós-graduação em psicobiologia na Unifesp, diz que pretende unir tradição e ciência e que meditação, massagem e aromaterapia não têm nada a ver com o ele chama de "enrolação". Sua "grande questão" é: "Por que a tradição está na mesma prateleira que o esoterismo?"

Por quê?

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