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29/04/2006 - 10h47

"Primeira Página" passa como filme da história

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MARCO ANTONIO VILLA
Especial para a Folha de S.Paulo

Passar por 85 anos dá uma sensação estranha: as ideologias políticas, os grandes fatos (muitos ficaram pequenos no futuro), os grandes personagens (alguns esquecidos e bem esquecidos) vão passando como se fossem um filme. Lá estão Adolf Hitler, Josef Stálin, Mao Tse-tung, Getúlio Vargas, mas também Balbino José dos Santos, o primeiro passageiro do metrô paulistano, que chegou às 5h na estação Jabaquara, para, uma hora depois, ser o primeiro a atravessar a catraca naquela sexta-feira fria de setembro de 1975.

Um menino saúda com o polegar erguido um carro transportando tanques em um subúrbio de Buenos Aires. Era o golpe militar de março de 1976 que derrubou a presidente Maria Estela Martinez de Perón, a Isabelita, e que instituiria a ditadura mais sanguinária da história portenha. Quem era o menino? Estará vivo? Se estiver, será que mantém o polegar erguido para os golpistas?

Enquanto São Paulo foi marcado pelos grandes incêndios (Volkswagen, 1970; Andraus, 1972; Joelma, 1974), na Polônia, em 1970, o Exército à bala --e com dezenas de mortos-- tomou os estaleiros de Gdynia, onde milhares de operários protestavam contra o aumento do custo de vida. Já no Brasil, o general Siseno Sarmento, comandante do 1º Exército, garantia que a normalidade do país não estava abalada e o presidente Médici dizia que foi "o maior dia da minha vida" o domingo em que a seleção brasileira venceu a Itália e conquistou o tricampeonato. Entusiasmado, saiu do Palácio e foi ao encontro dos populares que o aguardavam. Fez embaixadas e depois foi carregado pelos torcedores. Parecia que Sarmento tinha razão, porém, o Congresso Nacional tinha ficado fechado meses e embaixadores eram seqüestrados para que, em troca, fossem libertados presos políticos.

Nos últimos 25 anos, o país foi varrido por momentos de grande euforia política. A campanha das Diretas-Já foi um dos maiores. O ato da praça da Sé dava o tom do que seriam os próximos meses. Diz a Folha: "O povo se manifestou, cantou, dançou; trouxe bandeiras, vestiu camisetas. Vaiou, aprovou. E nem a chuva, que por três horas fustigou o comício, consegui dispersá-lo". Três meses depois, no vale do Anhangabaú, encerrou-se a campanha com o maior comício da história do Brasil. Mas o regime resistia.

Se a emenda foi derrotada, o desejo de restabelecimento da democracia permanecia ainda mais forte. A candidatura Tancredo Neves, a vitória no Colégio Eleitoral, dava o tom de euforia. Enfim iria acabar a ditadura. E veio a surpresa da internação, das cirurgias e da morte, em 21 de abril. Dez meses depois, nova euforia: o Plano Cruzado. Após as eleições de novembro, nova decepção. Dois anos passam, e mais euforia: a promulgação da Constituição. O presidente Sarney proclamou juras à Carta, mas antes contratou dezenas de funcionários públicos sem concurso e criou centenas de cargos de confiança. Tão Brasil.

Em 85 anos, os conflitos mundiais foram mudando: as ideologias políticas laicas foram perdendo importância e a presença do fundamentalismo religioso foi assumindo o primeiro plano da cena. Já a política interna brasileira, pouco mudou. O general Figueiredo, ainda candidato à Presidência, em entrevista para a Folha disse: "A opinião pública não existe, vocês [os jornalistas] é que a formam. Se vocês quiserem, vocês mudam a opinião pública".

Ouvíamos algo parecido nestes tristes dias que vivemos. Mas foi no futebol que a história ficou congelada. Campeonato Paulista, 1978. Corinthians x Guarani: 2 a 2. Jogo equilibrado. Aos 14 minutos do segundo tempo da prorrogação, o juiz marcou um pênalti duvidoso. Para quem? Para o Corinthians, é claro. O lateral Zé Maria bateu e converteu.

É, a história sempre se repete: e como tragédia.

Marco Antonio Villa é professor de história da Universidade Federal de São Carlos (SP) e autor, entre outros livros, de "Jango, Um Perfil" (Globo)

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