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"Brasil interfere demais no cinema", diz presidente da rede Cinemark
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ANA PAULA SOUSA
da Folha de S.Paulo
Sob os 40 ºC do verão de Dallas, no Estado do Texas (EUA), o engenheiro químico Valmir Fernandes, 48, decide o tratamento que "Harry Potter e o Enigma do Príncipe" receberá em mais de 4.846 salas espalhadas por 13 países. Ele decide também quanto você pagará pelo ingresso na maior rede de cinemas do Brasil.
Responsável pela implantação do Cinemark no país, em 1997, Fernandes é, desde o final de 2006, o presidente internacional da rede conhecida pelos enormes sacos de pipoca e pela predominância de blockbusters em suas telas instaladas em shoppings centers.
Apesar da fala cautelosa, comum aos executivos encarregados de cuidar, a um só tempo, do cofre e da imagem das empresas, Fernandes expõe detalhes de um negócio que nada tem a ver com a sua formação. Antes de assumir o Cinemark, Fernandes trabalhou na indústria química e participou do processo da privatização dos polos petroquímicos do país. Não entendia de cinema. Mas entendia de gestão.
Sua principal missão, ao assumir o novo posto, era dar novas feições às salas de exibição. A rede norte-americana iniciou a ocupação da América Latina por Chile, México e Argentina. Só então veio ao Brasil. "Entramos num momento propício. O mercado brasileiro vinha do pior ano da sua história", diz o executivo. Num ambiente frágil, o Cinemark impôs novas regras para o jogo e, rapidamente, o caso brasileiro tornou-se o mais bem-sucedido da empresa no mundo.
Cabe lembrar que remonta à chegada do complexo no Brasil o fim das salas de rua e a expansão do conceito de multiplex. O modelo, voltado aos shoppings, concorreu para o fim do circuito destinado às classes C e D e para certa uniformidade na programação _com um pequeno número de blockbusters ocupando boa parte do circuito. "A melhoria do padrão de salas forçou outras empresas a mudarem sua atuação", diz Fernandes. "Somos uma empresa de capital aberto e temos a obrigação de ser claros sobre a nossa atividade. Exibo filmes comerciais, e não filmes de arte. É essa nossa natureza. Os filmes brasileiros de entretenimento, como 'Se Eu Fosse Você 2', estão em nossas salas."
A política e o mercado
No início desta década, quando a política cinematográfica brasileira pegou fogo e criou-se um novo marco legal para o setor, Fernandes esteve no centro de embates duros. O principal deles dizia respeito à cota de tela, que obriga os cinemas a exibir filmes nacionais por certo número de dias no ano. "O Brasil, de todos os países nos quais atuamos, é o que tem as mais intensas discussões sobre a política do cinema e o maior nível de interferência no nosso negócio", argumenta.
Além de países da América Latina, a rede de cinemas está em Taiwan. "Em nenhum outro país existem tantas regras. Nenhum tem uma lei que defina a meia-entrada. Há preços especiais para estudantes, mas as definições cabem ao mercado, não ao Estado."
Chega-se assim a um tema inevitável: o preço dos ingressos. "O preço é artificialmente elevado em decorrência da lei da meia-entrada", repete, feito mantra. "Por que minha filha, que vai para a Disney todo ano, paga meia, e minha empregada paga inteira? O ingresso não vai baixar enquanto não for regulada a lei da meia-entrada."
Fernandes explica, em tese, que, para ter um preço médio de R$ 15, deve cobrar, no Brasil, R$ 20 pela inteira. Insiste que, se não houvesse carteirinha de estudante, poderia cobrar R$ 12. Será? "Claro. Se o ingresso fosse mais barato, mais gente iria ao cinema e, ao invés do preço médio de R$ 15, eu poderia trabalhar com um valor de R$ 12. No Brasil, não podemos abrir salas em municípios com menos de 100 mil habitantes, porque, simplesmente, o negócio não se paga."
No decorrer da conversa, por telefone, de Dallas, Fernandes fez outras contas na ponta do lápis. Uma delas responde à seguinte pergunta: como se define o preço do ingresso? De acordo com ele, a instalação de um multiplex de dez salas custa cerca de R$ 12 milhões. Esse dinheiro precisa voltar para os investidores em um prazo de cinco a sete anos.
"Eu decido o preço do ingresso, da pipoca e do refrigerante a partir disso. Tenho custos fixos altos e preciso de uma margem para mostrar ao investidor que ele vai recuperar o seu dinheiro. A margem de lucro é muito pequena. O filme roda mesmo com um só espectador na sala. Também acho que o ingresso tem de baixar, mas a conta não é simples."
O presidente do Cinemark admite que, do Brasil a Taiwan, as reclamações sobre os preços são idênticas. E não só do ingresso. "Também falam que a pipoca é cara. Mas pipoca come quem quer."
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