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10/07/2006 - 18h25

Conheça a Amsterdã que "Páginas da Vida" vai esconder

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SÉRGIO RIPARDO
Editor de Ilustrada da Folha Online

Já imaginou o Rio sem o Cristo e sem o bondinho do Pão de Açúcar? É natural o turista associar a imagem da cidade a essas referências. No caso de Amsterdã, nada mais comum do que lembrar dos canais por onde navegam barcos --outros atracados servem de casa para descolados, artistas e hippies endinheirados. "Páginas da Vida", nova novela das 21h da Globo, vai tentar retratar a capital holandesa, mas deixará de fora traços culturais relevantes (e polêmicos) da cidade, como o consumo de maconha nos "coffee shops", lugares com aparência de um bar, com a diferença de que o cardápio traz vários tipos de maconha e haxixe, vendidos livremente, dentro da lei.

Sérgio Ripardo/Folha Online
Região da praça Rembrandt tem diversos coffee shops para público diverso
Região da praça Rembrandt tem diversos coffee shops para público diverso

Por 10 euros (quase R$ 30), qualquer adulto compra uma porção de erva suficiente para enrolar dois cigarros (ou "baseados", como se diz na gíria). O cardápio traz maconha cultivada em várias partes do planeta, como Jamaica e Tailândia. O cliente escolhe o tipo, e o atendente abre uma gaveta de alumínio onde está o produto, já separado e guardado em plásticos transparentes.

Em vez de catchup, mostarda ou canudinhos, nas mesas do "coffee shop", há papel (seda) disponível para o cliente, com pedaços de cartão branco, a ser usado para espalhar a erva em fileira. Para acender, existem também caixas de fósforos, item de colecionador. Em grupo ou sozinho, os freqüentadores preparam seu cigarro e fumam ainda no "coffee shop". Outros levam para casa.

Praticamente em cada quadra da área turística de Amsterdã há um "coffee shop". Em algumas ruas, há mais de um. Alguns são franquias, como o Betty Boo. Na Reguliersdwarsstraat, uma das ruas bastante freqüentada pelo público "fashion" e GLS, próxima da praça Rembrandt, há mais de quatro "coffee shops". Um deles mostra que esses lugares buscam se diferenciar no visual e atrair determinados públicos: o "Otherside" tem paredes em cor rosa, lustres de cristal e sempre tocando música eletrônica (DJ Tiësto é um rei), além de freqüentadores descolados, com cabelos de todo tipo e cor (carecas, moicanos, punks, emos e outros).

Sérgio Ripardo/Folha Online
Garotas de programa se exibem em vitrine no "bairro da luz vermelha", à espera de clientes
Garotas de programa se exibem em vitrine no "bairro da luz vermelha", à espera de clientes
Ao caminhar pelas principais ruas da cidade, o cheiro de canabis é bastante comum, o que torna ainda mais chocante a novela "Páginas da Vida" fechar os olhos para essa realidade. Evita-se fumar em lugares públicos, mas é possível encontrar gente preparando seu cigarro de maconha em praças. Os "coffee shops" são invadidos por turistas --alguns nativos dizem que preferem comprar maconha por vias mais baratas. Citam, por exemplo, que há um comércio ilegal em áreas das estações de trem.

Diversas lojas especializadas também vendem todo tipo de produtos relacionados à maconha, como papel, cachimbos, máquinas para triturar a erva, e também souvenirs, como camisetas e pirulitos. É impossível visitar a cidade sem ver uma referência à canabis. Turistas de todas as idades, de crianças a idosos, olham com curiosidade e entram nessas lojas. Até no aeroporto de Amsterdã (Schiphol), são comercializados souvenirs com a temática da erva.

Sérgio Ripardo/Folha Online
Souvenirs em Amsterdã exploram a imagem da cidade de paraíso da maconha e do sexo
Souvenirs em Amsterdã exploram a imagem da cidade de paraíso da maconha e do sexo
Há ainda os "smart shops", que vendem os chamados "cogumelos mágicos", alucinógenos, que ainda são minoria em relação aos "coffee shops". Esse negócio --ilegal em países como o Brasil-- está integrado a outras atividades comerciais da cidade. É comum ter uma pizzaria ou restaurante ao lado de cada "coffee shop". Na vitrine, um pedaço de pizza convive naturalmente com uma barra de chocolate com a imagem de uma folhinha de maconha na embalagem. Tudo para matar a "larica" (fome intensa após o fumo).

Conversando com nativos, se descobre que os cidadãos holandeses não querem saber se o governo deveria ou não acabar com os "coffee shops". São direitos adquiridos, da esfera privada, da liberdade de cada indivíduo, em que o poder público não deve se intrometer, dizem. A preocupação atual deles é com os imigrantes. O debate é se um estrangeiro tem o direito de pagar o mesmo aluguel que um holandês nativo ao ocupar o centro de Amsterdã. Políticos de direita e de esquerda perdem mais tempo discutindo questões pragmáticas como essa, do que regulando comportamento individual.

Sérgio Ripardo/Folha Online
Turistas caminham no "bairro da luz vermelha", onde se concentram casas de sexo explícito
Turistas caminham no "bairro da luz vermelha", onde se concentram casas de sexo explícito
Além de visitar jardins de cultivo de maconha e o museu dedicado à canabis, o visitante pode acompanhar a história da sexualidade humana no museu do sexo em Amsterdã. Seria um ótimo cenário para a estudante de história da arte Nanda (Fernanda Vasconcellos) visitar em "Páginas da Vida".

Há imagens, ilustrações, esculturas, peças e bonecos reproduzindo a riqueza da sexualidade, em todas as suas versões (heterossexuais e homossexuais). As salas que mais impressionam os visitantes --a julgar pelos comentários e olhares de choque dos visitantes-- mostram imagens de exageros sexuais, como um homem com um pênis de mais de 30 centímetros, além de fotografias de zoofilia.

No "bairro da luz vermelha", mulheres e travestis se requebram atrás do vidro das portas, enquanto clientes trafegam nas calçadas, alguns se aproximam para negociar preços, outros entram para consumar o ato. Câmeras fotográficas não são bem-vindas. Quando avistam um abelhudo, as garotas fecham as cortinas.

Mas claro que "Páginas da Vida" não vai entrar nessa seara, de difícil abordagem para o público noveleiro. A terra do pintor Rembrandt (1606-1669), que comemora 400 anos de nascimento do artista, só será retratada por seus aspectos mais inofensivos: o charme arquitetônico à beira dos canais, suas bicicletas estacionadas nas pontes, seus campos de tulipas e moinhos no interior.

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