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14/11/2006 - 10h46

Em NY, Marisa Monte fala de política e da paixão por Roberto Carlos

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VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
da Folha de S.Paulo, em Nova York

Marisa Monte atingiu a maioridade musical. Após 18 anos de carreira, a cantora carioca quer dividir o palco com Roberto Carlos, no especial de fim de ano da Rede Globo. A novidade foi revelada à Folha durante a turnê "Universo Particular" nos EUA. Nesta terça-feira ela canta no Beacon Theatre, em Nova York. Ingressos esgotados há dois meses, a venda no mercado negro por US$ 600 (R$ 1.300).

"Sou fã do Roberto Carlos. Para mim é uma referência histórica. Sempre que posso vou aos shows do Roberto Carlos. Já fui a vários. É uma coisa que realmente me emociona. Acho ele um grande cantor. Ele canta muito, canta muito", diz.

A parceria depende de negociações contratuais entre a emissora e as gravadoras. "Ainda estamos esperando definições, que não são da minha parte. Eles estão decidindo quem ia ser, quem não ia ser."

Vinícius Queiroz Galvão/FI
Cantora carioca quer dividir o palco com Roberto Carlos no especial da Rede Globo
Cantora carioca quer dividir o palco com Roberto Carlos no especial da Rede Globo
Ainda sob o eco da reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência, Marisa diz ser eleitora histórica do petista, mas que "está tudo errado". "Quando vejo que o Maluf se elegeu, que o Clodovil se elegeu, tudo isso é muito decepcionante."

Leia abaixo a íntegra da conversa sobre política, criação musical, pirataria e música brasileira.

Folha - Que novidades você traz para esta turnê nos EUA?

Marisa Monte - É o mesmo show que eu fiz no Brasil e na Europa. Trago o mesmo aparato cênico, o palco, a banda, o repertório é bem parecido. O repertório é de 30 músicas, e o show tem 23. Sempre há um rodízio que acontece naturalmente. Mas é basicamente o mesmo universo. Algumas músicas de cada um desses discos novos, dos "Tribalistas", do "Cor-de-rosa" tem várias. Tem também um música inédita do Seu Jorge. São dez músicos comigo. Toco vários instrumentos, a formação é muito versátil, generosa, que serve bem a sonoridade.

Folha - Qual o diferença de cantar para o público americano?

Marisa - Sinto uma diferença mais em relação ao lugar: se é um teatro, se é um ginásio, se está todo mundo em pé, se é uma praça, uma praia, isso muda muito o público. Mas posso encontrar público diferente até mesmo dentro da mesma cidade. Em São Paulo, o Credicard Hall é completamente diferente do Ibirapuera. É uma pergunta difícil porque o que define o comportamento do público não é só o país, a nacionalidade, a cidade. É também a atmosfera que cerca. Se o cara está em pé, se o cara está sentado numa mesa, meio vendo de lado. Tem várias coisas que determinam o comportamento do público que não é só a nacionalidade dele.

Folha - Mas nos EUA o público não entende a letra...

Marisa - Isso faz com que eles tenham uma relação mais intuitiva com a música. Talvez eles percebam mais coisas que o cara que ouve a letra e entende as palavras em português. Pelo menos para mim, como ouvinte, isso é uma coisa em primeiro plano. Quero ouvir as palavras, quero entender o sentido daquilo. Mas quando fica relativo, a atenção vai para a musicalidade. E tem também o fato de que os caras não têm as referências. Eles não sabem o que é um samba.

Vinícius Queiroz Galvão/FI
Marisa Monte diz que Tribalistas é um projeto de parcerias e não prevê turnês
Marisa Monte diz que Tribalistas é um projeto de parcerias e não prevê turnês
Folha - Ficar quatro anos fora do palco te fez bem?

Marisa - Eu adoro o palco. O que realmente inviabilizou uma turnê nesses anos foi o filho, a dedicação à pesquisa e a gravar dois discos. É incompatível viajar muito e fazer essas outras coisas. Um disco meu é conseqüência da vida normal, de andar na rua, de encontrar os parceiros, de ir ao cinema, de ver show dos outros. Isso é inspirador. Foi importante para mim esse distanciamento. Até para ter um olhar crítico em relação ao que fiz.

Folha - Hoje você é mais focada musicalmente e menos teatral. Por quê?

Marisa - Nos show hoje eu fico boa parte do tempo com as mãos no instrumento. Isso já limita de certa maneira os meus gestos. Usar as mãos é uma expressão muito natural para mim, como complemento do discurso. O que mudou é que, através desses anos todos, e da prática musical, minha forma de atuar através da música se diversificou.

Folha - Quais são os planos para a parceria com Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown. Vai ter show dos tribalistas?

Marisa - Agora não tem nenhum plano. A evolução e a continuidade natural do trabalho dos Tribalistas é em parcerias. Nunca nos imaginamos como um grupo, até porque os três têm carreiras individuais. Sempre achamos que Tribalistas era nome de um projeto. Não temos planos de turnê.

Folha - Qual a previsão de gravação de novos clipes?

Marisa - Fizemos alguns clipes. "Bonde do Dom", "Vilarejo" e "Até Parece". Também estamos fazendo um registro em longo prazo da turnê. Já fizemos algumas filmagens e gravações.

Folha - Como é o processo de escolha de um clipe?

Marisa - Em geral escolhemos uma música que possa inspirar uma idéia cinematográfica.

Folha - Qual o seu clipe preferido?

Marisa - Gosto muito das coisas dos Tribalistas. É um registro muito honesto, de um momento muito fértil, muito feliz. Quando assisto, gosto de me ver. Traz uma sensação boa. Não me sinto muito formal, muito profissional, me sinto à vontade. Ai, que bom, estou ali, pessoa. Eu, fazendo música com meus amigos. Isso é legal.

Vinícius Queiroz Galvão/FI
Música espanhola de Enrique Morente, Estrella Morente e Bebo Valdéz influencia Marisa
Música espanhola de Enrique Morente, Estrella Morente e Bebo Valdéz influencia Marisa
Folha - O que você tem ouvido? O que tem te influenciado?

Marisa - Muitas coisas. Tenho ouvido muita coisa espanhola: Enrique Morente, Estrella Morente, que é a filha dele, uma cantora inacreditável, linda, Bebo Valdéz, um pianista cubano já de 90 anos com quem trabalhei. E depois o disco novo de Henri Salvador.

Folha - Você canta no especial de fim de ano de Roberto Carlos?

Marisa - Ele adorou "Eu te amo, eu te amo, eu te amo". Ainda estamos esperando definições, que não são da minha parte. Eles estão decidindo quem ia ser, quem não ia ser. Eu sou fã do Roberto Carlos. Não tenho planos de gravar um disco só com músicas dele, como a Maria Bethânia, até porque ela já fez. Mas já cantei várias coisas deles. Para mim é uma referência histórica. Desde pequena, Roberto Carlos... Outro dia peguei um songbook. É incrível. A gente conhece tudo. Tudo. O cara fez a trilha sonora das nossas vidas. Sempre que posso vou aos shows do Roberto Carlos. Já fui a vários. É uma coisa que realmente me emociona. Acho ele um grande cantor. Ele canta muito, canta muito.

Folha - Por falar em Bethânia, ela vai lançar dois discos. Isso é uma tendência? É mercado, criação? Por quê?

Marisa - Nem sabia que ela ia lançar dois discos. Não sou a primeira, e também não serei a última. Vários lançaram antes de mim e vários depois. É uma coisa excepcional, mas pode acontecer. O que rege esse ritmo é a inspiração. Ter alguma coisa para registrar, para mostrar. Artistas como eu e como a Bethânia fazemos as regras para a indústria do jeito que realmente sentimos, com legitimidade, com honestidade. Tendência mesmo é lançar música na internet, fazer singles, em vez de álbuns.

Folha - CD é obsoleto, então?

Marisa - Vivemos numa era de transformação, pode ser. É possível que daqui a dez anos não exista mais CD. Ou exista para um público muito específico. Sinto várias opções crescendo, como compra de música on-line, download. A tecnologia digital é uma revolução.

Folha - E como isso muda a maneira de conceber a música, o processo de criação?

Marisa - Por enquanto não mudou nada, mas é possível que daqui a alguns eu possa olhar para trás e dizer o que mudou. Antigamente, quando não havia LPs, havia aqueles 78 rotações, eram duas músicas por lado, e o artista lançava vários discos por ano. Já foi diferente também. Nem sempre foi assim como é hoje. É possível que em alguns anos as pessoas lancem música por música na internet, em seus sites. Não tenho noção do que vá acontecer. É uma pergunta difícil. Por enquanto, ainda estamos correndo atrás das transformações, que acontecem mais rápido do que nossas reações a elas. Houve uma retração grande do mercado por causa de uma pirataria incontrolável. Não existe nenhuma tecnologia eficaz de controle. Mas isso não transforma em nada a criação em si. Quer dizer, a inspiração. Faço música independentemente de gravar, de lançar, se vou ter disco. Isso nunca regeu meu ciclo de criação. Faço as músicas que tenho vontade de fazer. Tenho inspirações, idéias. E isso não vai mudar. É uma questão de espírito, de ligação com a música.

Folha - Você já gravou um clipe aqui em Nova York. Qual a sua percepção hoje da cidade em relação àquela época?

Marisa - Minha percepção daquela época era uma percepção minha daquela época. Hoje tenho mais intimidade com a cidade, já vim aqui várias vezes. Na época do clipe era a segunda vez que eu vinha. Era uma fase de descobertas. Eu adoro Nova York. É uma cidade de muitas possibilidades. Não são exatamente os EUA, é uma coisa muito cosmopolita. É uma cidade que tem gente do mundo inteiro. Isso é muito interessante culturalmente, tem muita informação. É uma cidade boa para aprender. Nunca morei aqui, mas sempre venho, ao menos duas vezes ao ano. Gosto muito da andar nas ruas, de ver as pessoas.

Folha - Como você vê a reeleição do presidente Lula?

Marisa - Sempre votei no Lula. Não sou do time das superdecepcionadas porque nunca acreditei que um governo possa ser tão transformador como as mudanças individuais possam ser. Acho que precisamos fazer uma reforma política. Está tudo errado, até a forma de eleger. Existe um questionamento grande que o país tem que passar. De uma certa maneira acredito que existam coisas que são endêmicas da classe política brasileira. Isso atrai um certo tipo de gente, o fato de ter essa concentração de poder, que é um esquema viciado. Talvez nenhum presidente, seja Lula, seja Alckmin, consiga realmente fugir disso. É complicado. Quando vejo que o Maluf se elegeu, que o Clodovil se elegeu, tudo isso é muito decepcionante. Agora as pessoas vão aprender, e tal. Aí se vê Maluf como deputado mais votado. O presidente vai governar junto com aquele Congresso. A discussão muito centralizada na figura do presidente não é construtiva. E ele tem de fazer aquelas alianças todas, o que for possível para conseguir, e aí entra no esquema. Então se vê que não há diferença entre um presidente ou outro na hora em que a conjuntura toda não ajuda. Tem de ter uma moralização grande. É preciso mais cobrança das pessoas.

Folha - Marisa Monte para presidente?

Marisa - Deus me livre, aquilo é um corpo sem alma (risos).

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