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23/01/2007 - 09h31

Filme "Acidente" mostra "escola mineira" no Festival Sundance

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ADRIANA FERREIRA SILVA
da Folha de S.Paulo

Depois da exibição de "O Cheiro do Ralo", de Heitor Dhalia, na sexta-feira, o mais badalado evento do cinema independente do mundo, o Festival Sundance, nos EUA, mostra hoje um outro projeto brasileiro. Não é um filme de ficção nem tampouco um documentário, mas uma narrativa lírica, uma espécie de "poema visual".

Trata-se de uma colagem de pequenas histórias, que reúne imagens registradas em 20 cidades de Minas Gerais.

O filme chama-se "Acidente" e foi realizado pelos mineiros Cao Guimarães e Pablo Lobato. É mais um genuíno produto da "escola mineira" do audiovisual a participar de uma grande competição internacional. Desde a década de 80, quando o videomaker Eder Santos estreou na videoarte, Belo Horizonte se tornou um efervescente cenário de onde despontaram artistas como Cao Guimarães, Lucas Bambozzi, Kiko Goifman e Marcellvs L., entre outros.

Em comum, há o fato de todos eles experimentarem com a linguagem do vídeo e do cinema em obras como "Acidente", que, apesar de estar concorrendo na categoria "documentário" em Sundance, está longe de cumprir as convenções que caracterizam o gênero.

Fama internacional

"Minas Gerais é o principal produtor de artistas que trabalham com um audiovisual expandido, que ultrapassa as barreiras da produção mais convencional", diz a curadora Solange Farkas, criadora do Festival Internacional de Arte Eletrônica Videobrasil. "As obras mineiras são mais reconhecidas fora do Brasil do que as de São Paulo e do Rio de Janeiro", garante ela.

Farkas afirma ter verificado essa realidade durante suas andanças por eventos de cinema, galerias e museus de vários países, coletando obras para serem exibidas no Videobrasil. Segundo ela, a fama da "mineirada" começou com Eder Santos e se perpetua com novatos, como Marcellvs L., artista mais jovem a participar da Bienal Internacional de São Paulo no ano passado.

"Ele [Marcellvs] está despontando internacionalmente. Depois do Eder [Santos], é uma das referências mais importantes do país nessa área", aposta a curadora.

Além de repercutir no exterior, os mineiros também têm sido destaque aqui: Guimarães, Lucas Bambozzi e Kiko Goifman, por exemplo, já foram premiados em eventos como o festival de documentários É Tudo Verdade.

O coletivo Teia ganhou os troféus de melhor filme, fotografia e montagem no Festival de Brasília de 2006 pelo curta-metragem "Trecho", selecionado neste ano para a mostra de Roterdã (Holanda) e a de Tiradentes, em Minas, que começou na última sexta.

Periferia

Parte disso acontece, acreditam os mineiros, pelo fato de os artistas virem da "periferia" da criação audiovisual. "[Belo Horizonte] é a periferia do mundo", brinca Cao Guimarães.

"A cidade não é um centro, como São Paulo, onde há uma estrutura pré-determinada para fazer cinema. Aqui, você quase que reinventa a forma de fazer filmes. Tem de buscar outras maneiras de se expressar no audiovisual", diz ele. "No nosso caso, utilizamos câmeras baratas, versáteis, o super-8, o VHS, o vídeo...".

"BH está longe de ser uma periferia de fato, mas continua sendo um circuito à margem", avalia o criador Lucas Bambozzi.

Esse jeitinho de recriar o cinema, presente no trabalho de diversos artistas, levou Solange Farkas a cunhar o termo "escola mineira", cujas obras caracterizam-se, principalmente, por experimentações na linguagem, como as que Cao Guimarães vem fazendo não só em filmes como "O Andarilho", que abriu a Bienal de São Paulo, em 2006, mas também em fotografias e videoinstalações.

Acidente

Para fazer o filme, a dupla selecionou cidades mineiras com nomes interessantes, como Olhos d'Água, espalhou os títulos anotados em papéis sobre uma mesa e compôs um poema com eles. "Fomos a 20 cidades e o nome "Acidente" veio disso, da idéia de filmar acidentalmente o que acontecesse diante da câmera", diz ele.

Para registrar esses "acidentes", eles criaram um método, que, segundo o diretor, consistia em acordar todos os dias às seis da manhã, dar uma volta pelo local para "sentir" a vizinhança e registrá-la. "É um filme que não requer um roteiro. É uma liberdade absoluta chegar a uma cidade e filmar o que quiser, como se fossem pequenas prosas poéticas."

O resultado foi um painel lírico, com cenas provincianas como uma mulher tomando banho ou um grupo de crianças se preparando para uma procissão. "É um filme bastante despretensioso; talvez disso venha a força dele", acredita Guimarães, lembrando que ele foi bem recebido na sua estréia no festival de Locarno (Suíça).

Assim como outras obras de Cao Guimarães, aclamadas em museus, galerias e no circuito de mostras, "Acidente" não tem previsão de estréia no país. "Depois de tanta badalação, de tanto festival importante, é um absurdo não entrar no circuito de cinema", fala o diretor. "Sei que ele não terá um grande público, mas é um público de cinema de arte que cada vez mais está aumentando no Brasil."

Além de tentar emplacar "Acidente" nas telas daqui, a outra missão de Cao Guimarães para 2007 é dar continuidade à "Trilogia da Solidão", da qual fazem parte os documentários "A Alma do Osso" e "O Andarilho", e que terá seqüência com "O Homem da Multidão", inspirado no conto de Edgar Allan Poe, que será feito em parceria com Marcelo Gomes, diretor de "Cinema, Aspirinas e Urubus".

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