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01/04/2007 - 15h40

Diário de Curitiba: Fecham-se as cortinas do 16º FTC

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da Folha Online

A seguir, a repórter Carmen Pompeu, enviada especial da Folha Online a Curitiba, descreve suas impressões sobre o 16º FTC (Festival de Teatro de Curitiba).

Último dia

Termina hoje. Já estou de malas prontas. Não que esteja com pressa de voltar para a desvairada paulicéia. Pelo contrário: arrumei logo as tralhas para aproveitar melhor o último dia deste 16º FTC (Festival de Teatro de Curitiba). Na bagagem da memória, levo as lembranças da diversidade temática das peças apresentadas ao longo destes dez dias.

Divulgação
Última chance para ver "A Sobrancelha é o Bigode do Olho", hoje, no FTC
Última chance para ver "A Sobrancelha é o Bigode do Olho", hoje, no FTC
À noite, ainda pretendo ver "A Sobrancelha é o Bigode do Olho", que será encenado, às 20h, no Teatro Uninter. É uma comédia carioca de 70 minutos que faz parte do Fringe, mostra paralela. A peça conta a história do Barão de Itararé. Na sinopse diz: "convidado a explanar sobre otimismo, o Barão de Itararé acaba por destilar seu humor crítico acerca dos temas mais improváveis do cotidiano". Vou conferir.

Ontem à noite, fui ver "Apareceu a Margarida" e "Ópera". Os dois espetáculos me fizeram tirar uma série de conclusões sobre o teatro brasileiro.

A primeira delas é a de que há uma crise de identidade. Talvez, reflexo do momento político mundial. É que a arte de encenar sempre foi meio maniqueísta: o bem contra o mal; o vilão e o mocinho.

E nós não temos mais vilões. Mocinhos, muito menos. Não de uma forma concreta. Tudo é abstrato: a violência urbana, o terrorismo. Não há um rosto definido. Um inimigo palpável. Um exemplo a ser seguido.

As histórias dos ídolos e dos mitos duram apenas os 15 minutos de fama conquistados no "Big Brother" da vida. Hoje, são a Siri e o Alemão. Alguém lembra quem eram os do ano passado?

E assim o então excelente e revolucionário texto de Roberto de Athayde, encenado pela primeira vez em 1973 por Marília Pera, perdeu o vigor e saiu do contexto histórico. Da professora autoritária, dona Margarida, que representava a dura ditadura militar restou apenas uma caricatura distante, louca, destemperada. Mas, ainda assim, engraçada. A platéia riu muito. Os jornalistas não.

Dona Margarida "encaretou". Pelo menos, foi esta a conclusão tirada por meus colegas depois de assistir ao espetáculo, que tem como diretor o ator pernambucano Bruno Garcia. Aliás, olhá-lo sentado na platéia puxando a claque foi, para mim, a parte mais divertida da noite. Ele ria, aplaudia. Era como um desses alunos que gostam de sentar lá no fundão da sala de aula, na geral. Ao final, as meninas fizeram questão de pedir autógrafos, e de tirar fotos ao lado dele.

A verdade é que os temas abordados por dona Margarida perderam-se nesses mais de 30 anos. Questões que eram tabus para os jovens daquele período hoje são tão corriqueiros que discuti-los no teatro ficaram sem sentido. Óbvias demais.

Por exemplo, há 30 anos, era o pior dos xingamentos chamar o outro de "viado", como o faz dona Margarida na peça. Era o pior dos palavrões. E era engraçado e fazia bem a alma dizer que "nos Estados Unidos --os inimigos dos revolucionários-- só tem viado".

Hoje, é constrangedor. Graças a Deus, mesmo diante de algumas resistências, estamos aprendendo a lidar com as diferenças e em algum lugar, como ontem na platéia, há casais gays de "Apareceu a Margarida" dividindo o mesmo espaço com os heterossexuais.

Talvez dona Margarida precise de um curso de reciclagem. Trocar os dramas e desafios de 30 anos atrás pelos de hoje: a violência nas escolas; ir além do mero consumo ou não das "drugas" --como ela se refere às drogas na peça--; trocar o vestido amarelo por um vermelho, mais sedutor, mais atual. Tornar-se mais engraçada e menos histérica, como as professoras devem ser senão perdem o emprego.

Ópera

Saí do Paiol de "Apareceu a Margarida" e fui para o Teatro José Maria Santos assistir à "Ópera", escrita pelo também pernambucano Newton Moreno, e encenada pela companhia Coletivo Angu de Teatro.

Dela, tirei a segunda --e a que considero mais importante-- conclusão sobre o teatro nacional. A saída está em ser simples. E fazer o mesmo que os grandes clássicos mundiais: registrar com maestria os dramas e conflitos de nossa época. Hoje em dia, na minha visão, seria o de levantar a bandeira contra a intolerância em nome de uma cultura de paz.

Com uma boa dose de humor, o texto de "Ópera" traz uma radiografia da realidade brasileira, uma contundente crítica social que estimula o espectador a questionar os valores e as dificuldades do nosso tempo. Isso tudo, de uma forma leve, engraçada.

Leva à reflexão de um jeito tão divertido e despretensioso que, sem perceber, a gente vai se envolvendo com as luzes, os efeitos, o colorido, com a alegria dos atores em cena. E, não mais que de repente, somos levados à intenção da montagem, que é o cruzamento estético entre o homoerotismo/sexualidade e teatro.

Embora cheio de clichês, tem uma temática gay bem resolvida. Agrada também a heterossexuais, pois tem como pretensão projetar reflexões não apenas na dimensão do tema homoerotismo, mas principalmente na afirmação das diferenças que compõem a nossa identidade.

"Ópera" é um drama engraçado. Como pede o mundo atual: sem extremos, na busca do equilíbrio harmônico entre todas as energias que envolvem a humanidade. Gostei. Com alguns ajustes, é verdade. Porque não há nada perfeito.

Agora, é hora de fechar as cortinas e desligar as luzes. Fico por aqui.

A jornalista viajou a convite do FTC

Especial
  • Acompanhe a cobertura do 16º Festival de Teatro de Curitiba
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