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20/01/2001
-
06h24
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Folha de S. Paulo
Última febre de multidão a domar o mundo no século passado, a leva dos artistas teens parece consumar, na música popular do século 20, uma jornada rumo ao útero. A malfadada noite teen do Rock in Rio 3, coalhada de shows sofríveis, prova e contraria essa impressão de uma só vez.
Nos 1001 golpes que a música foi sofrendo desde a invenção de fonógrafos e gravações, vários deles foram de rejuvenescimento. No Brasil, por exemplo, samba e canção antiga, mas também a revolução bossa-novista, ainda ligavam música à idade adulta, quanto muito à juventude.
Veio o rock'n'roll, que promoveu a primeira ascensão dos jovens mais tenros e, especialmente, dos adolescentes. No equivalente nacional ao rock e, pouco depois, na jovem guarda, Celly Campello e Wanderléa, muito precoces, faziam as vezes de Sandy e Britney Spears do início dos 60. Roberto Carlos, o ídolo maior, não era nenhuma criança quando cantou "Quero Que Vá Tudo pro Inferno" (65).
A cultura hippie, o psicodelismo e, no Brasil, o tropicalismo rejuvenesceram mais um tanto a canção popular -nascia o pop- , ao mesmo tempo em que encenavam a fonte da juventude como algo consequente, cerebral. Era feita por homens e mulheres que, por vezes, beiravam os 30 anos.
Exceções sempre houve, é claro, do genial Jackson Five a efemeridades como Nikka Costa e Jordy, hahaha. Nunca, porém, houve uma geração formada e consumida quase totalmente por quase-crianças, recém-adolescentes.
Vários dos líderes dessa geração estiveram juntos na noite de quinta-feira do Rock in Rio, a mais maquiavélica de todas elas.
Antes, o bisonho já perpassava o rodízio de entrevistas coletivas dos meninos, que pareciam comparecer ao abate de flashes fotográficos e perguntas invasivas feito animaizinhos acuados, feito coelhos assustados. Só se safavam os rapazes do Five e do 'NSync, mais crescidinhos que eram.
Os pais sertanejos de Sandy e Júnior espreitavam a entrevista dos filhos apreensivos, mas orgulhosos feito pavões. Não lhes passa pela cabeça o semblante de exploradores baratos que expõem publicamente, nessa época sombria de xuxas e sashas. Fabricam monstrinhos dentro de casa. Por consequência, os fabricam aos milhões, em cada adolescente que se espelha no exemplo inconvincente de bom-mocismo, virgindade e correção política idiotizada veiculado em cada sandy, em cada júnior e em cada britney.
Fora isso, parece não ocorrer, a ninguém que luta por esse tal mundo melhor, o que há de cruel na exposição cavalar da pobre Britney ao fiasco coletivo. A geração "oops" terá de passar por isso: ou voltará para sempre ao útero, infantilizada e abobalhada além do limite do suportável, ou romperá com o mito de que um mundo justo se construa sem traumas e sem rupturas.
Se se der a segunda das alternativas, o Rock in Rio 3 terá passado à história como mais uma dessas farsas sonsas que acontecem a toda hora no mundo do pop, em que rolam mais dólares do que pedras. Festival brasileiro de rock no novo século com SNZ, Patrícia Coelho e Papa Roach, mas sem rappers, cybermanos e funkeiros da periferia -que não têm gravadora grande por trás- não é festival que se preze.
Leia mais notícias do Rock in Rio 3
Análise: Pop adolescente vive jornada final rumo ao útero
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da Folha de S. Paulo
Última febre de multidão a domar o mundo no século passado, a leva dos artistas teens parece consumar, na música popular do século 20, uma jornada rumo ao útero. A malfadada noite teen do Rock in Rio 3, coalhada de shows sofríveis, prova e contraria essa impressão de uma só vez.
Nos 1001 golpes que a música foi sofrendo desde a invenção de fonógrafos e gravações, vários deles foram de rejuvenescimento. No Brasil, por exemplo, samba e canção antiga, mas também a revolução bossa-novista, ainda ligavam música à idade adulta, quanto muito à juventude.
Veio o rock'n'roll, que promoveu a primeira ascensão dos jovens mais tenros e, especialmente, dos adolescentes. No equivalente nacional ao rock e, pouco depois, na jovem guarda, Celly Campello e Wanderléa, muito precoces, faziam as vezes de Sandy e Britney Spears do início dos 60. Roberto Carlos, o ídolo maior, não era nenhuma criança quando cantou "Quero Que Vá Tudo pro Inferno" (65).
A cultura hippie, o psicodelismo e, no Brasil, o tropicalismo rejuvenesceram mais um tanto a canção popular -nascia o pop- , ao mesmo tempo em que encenavam a fonte da juventude como algo consequente, cerebral. Era feita por homens e mulheres que, por vezes, beiravam os 30 anos.
Exceções sempre houve, é claro, do genial Jackson Five a efemeridades como Nikka Costa e Jordy, hahaha. Nunca, porém, houve uma geração formada e consumida quase totalmente por quase-crianças, recém-adolescentes.
Vários dos líderes dessa geração estiveram juntos na noite de quinta-feira do Rock in Rio, a mais maquiavélica de todas elas.
Antes, o bisonho já perpassava o rodízio de entrevistas coletivas dos meninos, que pareciam comparecer ao abate de flashes fotográficos e perguntas invasivas feito animaizinhos acuados, feito coelhos assustados. Só se safavam os rapazes do Five e do 'NSync, mais crescidinhos que eram.
Os pais sertanejos de Sandy e Júnior espreitavam a entrevista dos filhos apreensivos, mas orgulhosos feito pavões. Não lhes passa pela cabeça o semblante de exploradores baratos que expõem publicamente, nessa época sombria de xuxas e sashas. Fabricam monstrinhos dentro de casa. Por consequência, os fabricam aos milhões, em cada adolescente que se espelha no exemplo inconvincente de bom-mocismo, virgindade e correção política idiotizada veiculado em cada sandy, em cada júnior e em cada britney.
Fora isso, parece não ocorrer, a ninguém que luta por esse tal mundo melhor, o que há de cruel na exposição cavalar da pobre Britney ao fiasco coletivo. A geração "oops" terá de passar por isso: ou voltará para sempre ao útero, infantilizada e abobalhada além do limite do suportável, ou romperá com o mito de que um mundo justo se construa sem traumas e sem rupturas.
Se se der a segunda das alternativas, o Rock in Rio 3 terá passado à história como mais uma dessas farsas sonsas que acontecem a toda hora no mundo do pop, em que rolam mais dólares do que pedras. Festival brasileiro de rock no novo século com SNZ, Patrícia Coelho e Papa Roach, mas sem rappers, cybermanos e funkeiros da periferia -que não têm gravadora grande por trás- não é festival que se preze.
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