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10/08/2002
-
00h09
FRANCISCO MADUREIRA
Editor de Informática da Folha Online
Dia 10. Dia de pagar conta. Só que aquela prestação do carro... ele não queria pagar pela internet. Quinhentos e sessenta reais não é dinheiro que se brinque. Até entrou no site do banco, deu voltas, viu a opção de pagamento de boletos...
Mas o que ele queria mesmo era a autenticação mecânica do banco ali, impressa na ficha de compensação. Aquilo era a prova. O caixa do banco seria testemunha. E se, na internet, o computador travasse bem na hora da transferência? E se a conexão caísse momentos depois de ter pagado a conta, sem que nenhuma confirmação aparecesse na tela? E se ele errasse a digitação daquele número enorme do código de barras? Isso dava arrepios ao internauta.
Muniu-se de coragem, pegou o boleto e desceu do escritório na hora do almoço. Caminhou duas quadras e lá estava ela, a agência do banco. Havia mais ou menos uns dois anos que ele não pisavam numa. Fazia tudo pela internet. Só usava, claro, os caixas eletrônicos —que, cá entre nós, estão bem mais perto de um computador do que de um atendente de banco— para tirar dinheiro.
Atravessou aquela porta girante —sem que o apito soasse, claro, para não atrapalhar a narrativa— e postou-se no último lugar da fila, que, por suas contas, somava nove pessoas, inclusive ele.
Como fazia tempo que não passava por uma situação dessas, encarou a fila do banco como um esporte. Um momento de descontração. Podia aproveitar aqueles instantes para pensar no trabalho, na esposa, nos filhos. Pensar um pouco em si mesmo também, de vez em quando, dizem que faz bem.
Dez minutos se passaram. Lembrou que podia pensar no trabalho, na esposa, nos filhos. Pensar em si mesmo. Mas, como se mergulhado num estado letárgico, não conseguia pensar em nada, ao mesmo tempo em que não tirava os atônitos olhos do relógio, imponente, ao alto de uma coluna que vinha do chão ao teto, no centro da agência.
Ainda havia cinco pessoas na sua frente. Pela internet, em dez minutos ele teria pago a conta e sobraria tempo para checar e-mail e quem sabe até abrir o ICQ para ver se tinha algum colega conectado.
Mas a maldita autenticação mecânica o obrigava a ficar na fila. A maldita autenticação mecânica o fazia esperar. E, enquanto pensava na quantidade imensa de coisas que poderia fazer em vez de ficar parado, não conseguia pensar em mais nada. Era vazio.
Mais dez minutos se passaram até que a atendente introduziu a ficha de compensação naquela leitora e depois concedeu-lhe o prêmio: a bendita autenticação. Agora poderia voltar ao trabalho.
De fato voltou. Mas, como naquele dia as coisas estavam meio devagar, mesmo tendo demorado no banco verificou seu e-mail —só spam— e entrou no ICQ, para ver que, para seu azar, ninguém estava conectado.
A série de crônicas "As aventuras de um micreiro" é publicada na coluna Usuário.com, no primeiro fim de semana de cada mês.
Leia a série:
As aventuras de um micreiro, capítulo 3
As aventuras de um micreiro, capítulo 2
As aventuras de um micreiro, capítulo 1
Escreva para o autor da coluna usuário.com
As aventuras de um micreiro, capítulo 4
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Dia 10. Dia de pagar conta. Só que aquela prestação do carro... ele não queria pagar pela internet. Quinhentos e sessenta reais não é dinheiro que se brinque. Até entrou no site do banco, deu voltas, viu a opção de pagamento de boletos...
Mas o que ele queria mesmo era a autenticação mecânica do banco ali, impressa na ficha de compensação. Aquilo era a prova. O caixa do banco seria testemunha. E se, na internet, o computador travasse bem na hora da transferência? E se a conexão caísse momentos depois de ter pagado a conta, sem que nenhuma confirmação aparecesse na tela? E se ele errasse a digitação daquele número enorme do código de barras? Isso dava arrepios ao internauta.
Muniu-se de coragem, pegou o boleto e desceu do escritório na hora do almoço. Caminhou duas quadras e lá estava ela, a agência do banco. Havia mais ou menos uns dois anos que ele não pisavam numa. Fazia tudo pela internet. Só usava, claro, os caixas eletrônicos —que, cá entre nós, estão bem mais perto de um computador do que de um atendente de banco— para tirar dinheiro.
Atravessou aquela porta girante —sem que o apito soasse, claro, para não atrapalhar a narrativa— e postou-se no último lugar da fila, que, por suas contas, somava nove pessoas, inclusive ele.
Como fazia tempo que não passava por uma situação dessas, encarou a fila do banco como um esporte. Um momento de descontração. Podia aproveitar aqueles instantes para pensar no trabalho, na esposa, nos filhos. Pensar um pouco em si mesmo também, de vez em quando, dizem que faz bem.
Dez minutos se passaram. Lembrou que podia pensar no trabalho, na esposa, nos filhos. Pensar em si mesmo. Mas, como se mergulhado num estado letárgico, não conseguia pensar em nada, ao mesmo tempo em que não tirava os atônitos olhos do relógio, imponente, ao alto de uma coluna que vinha do chão ao teto, no centro da agência.
Ainda havia cinco pessoas na sua frente. Pela internet, em dez minutos ele teria pago a conta e sobraria tempo para checar e-mail e quem sabe até abrir o ICQ para ver se tinha algum colega conectado.
Mas a maldita autenticação mecânica o obrigava a ficar na fila. A maldita autenticação mecânica o fazia esperar. E, enquanto pensava na quantidade imensa de coisas que poderia fazer em vez de ficar parado, não conseguia pensar em mais nada. Era vazio.
Mais dez minutos se passaram até que a atendente introduziu a ficha de compensação naquela leitora e depois concedeu-lhe o prêmio: a bendita autenticação. Agora poderia voltar ao trabalho.
De fato voltou. Mas, como naquele dia as coisas estavam meio devagar, mesmo tendo demorado no banco verificou seu e-mail —só spam— e entrou no ICQ, para ver que, para seu azar, ninguém estava conectado.
A série de crônicas "As aventuras de um micreiro" é publicada na coluna Usuário.com, no primeiro fim de semana de cada mês.
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