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01/03/2002 - 19h05

Pirataria será fantasma permanente na internet

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FRANCISCO MADUREIRA
Editor de Informática da Folha Online

Ilusão seria imaginar um mundo sem pirataria, em que todos os usuários de computadores tivessem capacidade financeira —e moral— para comprar os programas que usam e as músicas que ouvem.

Não vou discutir os méritos da pirataria ou os motivos que levam as pessoas a isso. Uns podem dizer que é o preço. Outros, que é a facilidade que alguns países oferecem na política de repreensão à prática. Quem sabe ambos tenham um pouco de razão.

Quero sim recordar uma notícia dessa semana, publicada pela revista Wired. Um adolescente norte-americano entra numa loja de computadores do Texas com um toca-MP3 iPod, da Apple, no bolso. Ele se aproxima de um monitor em exposição. Conecta-o a seu aparelho de som com um cabo. Baixa um programa de 200 MB em alguns segundos.

(Caso você não tenha lido a notícia, clique aqui, leia e depois volte a ler esse texto).

É um procedimento fácil esse de "roubar" software com um toca-MP3? Nem tanto quanto chegar até os estandes da av. Paulista ou na rua Santa Ifigênia, em São Paulo, ambos redutos dos programas piratas na cidade.

Mas não foi a pirataria em si o que mais me chamou atenção na atitude do jovem. Ele mais me pareceu um ícone da geração que cresceu na frente do computador. É uma geração que tem bem mais "liberdade" —se é que podemos chamá-la assim— do que a geração que cresceu na frente da televisão.

Isso porque a liberdade que a televisão dá ao telespectador é mínima —você tem um controle remoto e um punhado de canais. No Brasil, então, são apenas dois ou três canais que ilustram a tela normalmente.

Mesmo a TV a cabo é limitada. Como diz meu pai, que assinou recentemente um desses serviços, "repete tudo!". Parece que depois de três meses você já viu toda a programação.

Para essa geração dos computadores, a internet fez diferença. No início da rede, não havia grandes portais que não os buscadores. E eles davam a chave para universos completamente diferentes —nessa época, dava para conseguir qualquer coisa de graça. Até mesmo as músicas MP3 do Napster, cuja troca foi barrada pela Justiça dos EUA, podiam ser encontradas em sites comuns.

Mas, com o tempo, os grandes armazéns de sites proibiram a prática —por pressão das gravadoras, é claro— e começaram a barrar páginas que colocavam esse tipo de arquivo no ar. Depois apareceu o Napster. Depois o Morpheus, o KaZaA etc.

Quem só entrou na web depois da consolidação dos grandes portais perdeu tudo isso. Desde então, a internet é para muitos como é a televisão —um par de sites que são visitados todo dia e pronto. Só duas fontes de informação, só dois sites, para uma rede mundial que possui mais de dois bilhões de páginas, segundo o buscador Google.

Mas voltemos ao jovem do iPod. Ele não conhece os limites do controle remoto. Ele não engole o que duas ou três emissoras de informação transmitem aos seus olhos. Ele vai além disso, ele quer mais.

Talvez seja esse um grande tiro na culatra do capitalismo moderno, do liberalismo. Um desejo tão grande de liberdade individual que coloca a própria pessoa acima de tudo o que a cerca —governo, empresas, associações etc.

Pagar por software quando posso tê-lo de graça? O que interessa é o meu desejo, não o trabalho de horas do programador, a extensa pesquisa do escritor cujo livro vou xerocar, as horas e horas de produção de uma música que acabei de baixar de graça pela internet.

Ao mesmo tempo, é irrefutável considerar os cartéis e a "coisificação" como algo terrível em nosso tempo. Parece que querem vender tudo o que nos cerca, tudo é publicidade, tudo é comércio. A cultura passou a ser indústria de consumo.

Esse artigo, por exemplo, leitor. Ele é vendido para você. O clique que você deu sobre ele contará para a publicidade do jornal.

Com os CDs é a mesma coisa. Vamos publicar novos álbuns. Se eles terão sentimento, coração, técnica... pouco importa. Precisamos produzir e vender coisas. A arte virou "coisa".

A ânsia de vender e controlar o consumo então se choca contra o desejo de liberdade individual. Quem vencerá? Pago (não pirateio) para ver.

Escreva para o autor da coluna @usuário.com
 

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