Livraria da Folha

 
14/09/2010 - 19h10

Em livro, ex-diretor da Record conta como Louis Armstrong quase apanhou no Brasil

da Livraria da Folha

Divulgação
Saboreie, veja como tudo começou, e porque tudo ficou e como ficou
Saboreie, veja como tudo começou, e por que tudo ficou e como ficou

A história do rádio e da televisão brasileira é muito rica. Fatos curiosos, personagens únicos e muita ousadia e improvisação marcaram os tempos de cultura efervescente e o nascer de novos talentos.

Dos tempos da rádio e TV Record, da gestão da família Carvalho, astros do quilate de Hebe Camargo, Jô Soares, a Jovem Guarda e músicos da então promissora MPB desfilaram suas qualidades aos ouvidos atentos de Paulo Machado de Carvalho Júnior, o irmão responsável por contratar artistas, bolar programas e planejar novas sensações do público.

Boa parte desta trajetória está registrada no livro "Histórias... Que a História Não Contou", de autoria do próprio Paulo Machado, ou "Paulinho", como também era conhecido. Ele morreu nesta quarta-feira (14), aos 86 anos, em decorrência de um câncer de próstata.

Entre muitas desaventuras que relembram episódios hilários com Adoniran Barbosa, Pixinguinha e Nat King Cole, o autor arranja espaço para contar das horas de aperto que passou com o músico Louis Armstrong, que se recusava a subir no palco para sua apresentação.

Leia trecho:

*

Divulgação
Satchmo, como o músico Louis Armstrong também é conhecido, emocionou o público, depois de alguma confusão
Satchmo, como o músico Louis Armstrong também é conhecido, emocionou o público, depois de alguma confusão

- O que aconteceu, Paulinho?
- Estou com um baita problema e muito deseperado, o Louis Armstrong não quer cantar.
- O quê? Como é que é isso?
- É uma longa história, só sei que ele não quer cantar e eu preciso que ele cante, o Paramount está lotado, com o público impaciente e vaiando muito.
- Onde ele está?
- Sei lá, deve estar trancado lá em cima.
- Vamo lá na suíte falar com ele, vamos resolver isso.

Chegamos ao apartamento, batemos várias vezes na porta, tocamos a campainha insistentemente e nada, ninguém queria abrir. Lá dentro estavam Lococo, Armstrong e sua mulher. Vavá, aproveitando seu porte físico avantajado, meteu os dois pés na porta, arrombando-a. Dentro da situação, para nós trágica, a cena que vimos dentro do quarto foi hilária. Armstrong estava com uma máscara de jogador de beisebol, tendo ao seu lado a esposa, de penhoar, e Lococo tentando convencê-lo a ir para o teatro.

Falando em inglês, eu e meu amigo tentávamos convencê-lo. Não demorou muito para Vavá perder a paciência e dizer-lhe que, se não fosse ao teatro naquele momento, iria apanhar, e muito. Armstrong, bastante assustado, aceitou o convite na hora.

Eram vinte para as dez. Voltei correndo para o teatro e comuniquei ao público que, devido ao desgaste do artista, faríamos uma sessão às dez horas e outra à meia-noite. Às dez em ponto, Armstrong subiu ao palco sob vaias intensas, só ouvidas anos depois nos festivais de MPB.

Ao colocar seu lenço no trompete e iniciar a música "St. Lous Blues", o Paramount veio abaixo. Eu não tive tempo para lembrar o que tinha acontecido uma hora antes, a distância entre o inferno e o paraíso ficou curta demais. A agonia, o desespero e o nervosismo foram esquecidos em minutos.

Devido ao grande sucesso e à fabulosa acolhida do público, fui obrigado a fazer um espetáculo extra, no ginásio do Ibirapuera, a preços populares, convidando a estrela da voz do momento: Ângela Maria.

No fim, o mito do jazz gostou tanto da temporada que me presenteou com o primeiro relógio de ouro que ganhei na vida.

Mais valiosa que o relógio de ouro foi a certeza da conquista da confiança que meu pai depositou em mim.

*

"Histórias... Que a História Não Contou"
Autor: Paulo Carvalho Filho
Editora: Companhia Editora Nacional
Quanto: R$ 9,90
Onde comprar: Pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha

 
Voltar ao topo da página