Livraria da Folha

 
15/07/2010 - 13h42

Drummond defendeu "Dicionário do Palavrão", censurado pelos militares nos anos 70

da Livraria da Folha

Reprodução
Autor teve seu glossário censurado pelos militares nos anos 1970
Autor teve seu glossário censurado pelos militares nos anos 1970

Obscena, grosseira, imprópria. Certas palavras adquiriram certa pecha ao longo do tempo. Considerados como "palavrões", que reportam à ideia de palavras crescidas demais, esses termos possuem fama, mas não luxo gramatical.

Interessado nesse universo léxico especial, o folclorista pernambucano Mário Souto Maior (1920-2001) decidiu percorrer várias regiões do país em busca dos palavrões mais impossíveis da língua portuguesa. O resultado pode ser encontrado na nova edição de "Dicionário do Palavrão e Termos Afins".

Na última quarta-feira (14), data em que Souto Maior completaria 90 anos, o volume foi relançado por sua família em parceria com a Fundação Joaquim Nabuco e a Editora Leitura, no Museu da Fundação Joaquim Nabuco, em Recife.

Para ajudar o brasileiro a entender a origem dos vocábulos impróprios, o autor se empenhou em mais de cinco anos de pesquisas. Reuniu mais de 3.000 verbetes, tidos como chulos, entrevistou várias fontes e leu mais de 200 romances para finalizar o exemplar.

Divulgação
Folclorista pesquisou mais de cinco anos e leu mais de 200 romances
Folclorista pesquisou mais de cinco anos e leu mais de 200 romances

Do palavrão típico do Amazonas ao usado pela população do Rio Grande do Sul, o leitor também encontra sinônimos para determinados léxicos, como "prostituta", "homossexual" e "órgãos sexuais".

Souto Maior distribuiu 8.000 formulários para penetrar em todas as regiões brasileiras. Seu intuito era consultar todas as camadas sociais, pessoas de diferentes níveis intelectuais, das mais variadas idades e condições econômicas.

Publicado originalmente em 1974, com prefácio assinado pelo sociólogo Gilberto Freyre (1900-1987), o dicionário sofreu censura dos militares. Foi lançado somente na década de 1980, durante o governo de João Figueiredo (1918-1999). A primeira edição esgotou rapidamente.

O escritor Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) defendeu o glossário publicamente na edição de 20 de março de 1980 do "Jornal do Brasil". Leia um trecho:

"A carga de tais preconceitos é tamanha que o "Dicionário do Palavrão e Termos Afins", de Souto Maior, levou anos trancado em gavetas de censura, porque certo ministro da Justiça considerava atentatória aos costumes uma obra que tem similares de nível universitário na Alemanha, na França e outros países. Foi necessário que a opinião pública forçasse os governos militares à abertura democrática, embora tímida mas já hoje irrecusável, para que esse livro conquistasse direito de circulação e, portanto, de ser criticado. Seu autor, julgado sumariamente em sigilo de gabinete, seria assim um pornógrafo, quando na realidade se trata de um dos mais qualificados estudiosos da cultura nacional em seu aspecto de criação popular, de riquíssima significação."

 
Voltar ao topo da página