Livraria da Folha

 
06/08/2010 - 19h21

Conflito israelo-palestino compõe pano de fundo de romance de Yehoshua

da Livraria da Folha

Divulgação
Romance relata sete dias decisivos na vida de um casal israelense
Romance relata sete dias decisivos na vida de um casal israelense

Incansável ativista político na luta pela paz em Israel, A. B. Yehoshua batizou seu último romance de "Fogo Amigo". A expressão, usada em operações militares, indica que um soldado foi ferido ou morto por um tiro de seu próprio grupo. Publicado no Brasil pela Companhia das Letras, o livro põe o dedo na ferida no conflito israelo-palestino, pano de fundo da história. Mas este, seguramente, não é um livro sobre guerras, mas sobre perdas, memórias e descobertas.

A história começa no aeroporto de Tel Aviv, no primeiro dia do feriado de Hanukah, quando os judeus comemoram a reconsagração do Templo de Jerusalém. Uma viagem separa pela primeira vez e por uma semana um casal de israelenses de meia-idade e dá início a duas narrativas onde as falas de marido e mulher se revezam e se completam. Em um vai-e-vem, os dois personagens fazem sua reflexão e constatações sobre a vida em Israel, a família, o distanciamento dos filhos, o amor que sentem um pelo outro.

Ela, Daniela, viaja rumo à África, para um lugar perdido em meio à savana da Tanzânia, em uma visita emocional ao lugar onde viveu e morreu sua irmã. Ele, Yaári, resta em meio à agitação de Tel Aviv, ocupado pela sua atividade de engenheiro de projetos de elevadores e os problemas de família. Agora separados por milhares de quilômetros, o dia a dia real e psicológico dos dois personagens durante estes sete dias mostra o peso e a profundidade de uma vida influenciada inteiramente nos costumes e regras de um país judeu.

As narrativas que A. B. Yehoshua constrói em "Fogo Amigo" foram elogiadas mundo afora. O jornal francês "Le Figaro" saudou o romance como "sutil" e "soberbo". Para muitos críticos de seu trabalho, ele acabou incorporando em seu estilo as inovações narrativas de um dos seus escritores preferidos, William Faulkner. O jornal americano "The New York Times" foi mais longe e o chamou de "um tipo de Faulkner israelense".

Professor de literatura da Universidade de Haifa, em Israel, ele tem, de sua vasta produção, quatro livros já publicados no Brasil pela Companhia das Letras: Shiva (2000), Viagem ao fim do milênio (2001), A noiva libertada (2007), e A mulher de Jerusalém (2008). Ao lado de outros grandes nomes, como Amós Oz e David Grossman, o romancista, contista, ensaísta e dramaturgo Yehoshua é considerado um dos mestres da literatura contemporânea de seu país.

Leia um trecho do livro"Fogo Amigo".

No meio da noite, Tel Aviv clareia por um breve intervalo, e a lua, livre de seu manto cinzento, faz o marido, então no território abandonado da esposa, rolar de volta para o seu lado da cama, e de lá, depois de uma leve hesitação, levantar-se. Yirmiyáhu bem que o avisou para não esperar por provas de vida eletrônica antes do dia seguinte, mas ainda assim ele mais uma vez percorre os canais de televisão para adormecer com a garantia de que nenhum avião caiu ou foi sequestrado, reforçando a certeza com um comprimido para dormir, ainda que fraco. E nesse meio tempo, até que o sangue transmita a notícia para o cérebro, ele tenta, com um esboço apressado num papel quadriculado, sempre a postos na sua mesa de cabeceira, examinar a possibilidade de que o quinto elevador exigido pelo Ministério da Defesa não só tenha um comando em separado, mas também portas abrindo de par em par, a fim de se encaixar no canto sudoeste do poço sem roubar espaços significativos dos quatro elevadores já planejados. O esboço é inicial, inspirado em algum modelo que lhe pisca na memória, talvez de alguma revista técnica antiga, e por força do velho hábito de não atrapalhar o sono da esposa, ele se contenta também esta noite com uma luzinha bem fraca, que se mescla ao brilho avaro da lua.

 
Voltar ao topo da página