Livraria da Folha

 
18/12/2009 - 19h31

Luc Ferry conta e interpreta os mitos centrais da cultura grega; leia trecho

da Livraria da Folha

Divulgação
Luc Ferry interpreta os mitos centrais da cultura grega em novo livro
Filósofo interpreta os mitos centrais da cultura grega em novo livro

Após vencer o prêmio Aujourd'hui 2006, um dos mais conceituados de não-ficção contemporânea da França, com o livro "Aprender a Viver", Luc Ferry lança neste ano "A Sabedoria dos Mitos Gregos", continuação da série.

Na obra, voltada a iniciantes e aficionados de todas as idades, o filósofo conta e interpreta os mitos centrais da cultura grega. A abordagem instiga o leitor a examinar sua própria vida e suas crenças, para entender melhor seu lugar no cosmos e os desafios da vida humana.

A mitologia grega é a raiz da filosofia. As questões persistem ao longo dos milênios, mas Ferry chega a respostas surpreendentes e provocadoras. Ele leva o leitor, mesmo o não familiarizado com o assunto, a entender o sentido e o propósito da mitologia grega. Confira abaixo um trecho do livro.

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O nascimento dos deuses e do mundo

No começo do mundo, foi uma divindade bem estranha a primeira a emergir do nada. Os gregos a chamam de "Caos". Não é uma pessoa, nem mesmo um personagem. Imagine que essa divindade primordial nada tem de humano: não tem corpo, nem rosto, nem traços de personalidade. Na verdade, é um abismo, um buraco negro, no meio do qual ser algum se encontra que se possa identificar. Nenhum objeto, coisa alguma que possa ser distinta nas trevas absolutas que reinam nomeio daquilo que, no fundo, é uma total desordem. Aliás, no início dessa história, não existe personagem algum para ver o que quer que seja: não há animais, não há homens, nem mesmo deuses. Não só não há seres vivos, animados, como também não há céu, não há sol, não há montanhas nem mar, nem rios, nem flores, nem florestas. Enfim, nesse buraco escancarado que é o caos, reina a total escuridão. Tudo é confuso, desordenado. Caos parece um gigantesco precipício obscuro. É como nos pesadelos: se você cair dentro dele, a queda é infinita. Mas seria impossível, pois nem você, nem eu, ser humano algum se encontra nesse mundo!

Depois, de repente, uma segunda divindade surge desse caos, sem que se possa realmente saber por quê. É uma espécie de milagre, um acontecimento original e fundador que Hesíodo, o primeiro poeta a nos contar essa história, há muito tempo, no século VII a.C., não explica e por boa razão: ele também não tem a menor explicação à disposição. Algo surge, só isso, sai do abismo, e esse algo é uma deusa formidável, chamada Gaia - o que, em grego, significa terra. Gaia é o chão firme, sólido, o chão nutriz em que plantas muito em breve vão poder crescer,rios vão correr, animais, homens e deuses vão poder andar. Gaia, a terra, é ao mesmo tempo o primeiro elemento, o primeiro pedaço de natureza literalmente tangível e confiável - nesse sentido, é o contrário de Caos: ali não se cai infinitamente, pois ela nos ampara e carrega -, mas é também a mãe por excelência, a matriz original da qual todos os seres futuros, ou quase todos, vão em breve sair.

Porém, para que rios, florestas, montanhas, céu, sol, animais, homens e, principalmente, outros deuses um dia surjam a partir de Gaia, a deusa terra, ou até mesmo daquele estranho Caos - pois também a partir dele brotam algumas criaturas divinas -, será preciso ainda uma terceira divindade - terceira porque já tínhamos duas: Caos e Gaia. Trata-se de Eros, o amor. Como Caos, é sem dúvida um deus, mas não de fato uma pessoa. Trata-se mais de uma energia expansiva que faz os seres brotarem e se desenvolverem. É, por assim dizer, um princípio de vida, uma força vital. Não se deve de forma alguma confundir esse Eros, que não pode ser visto nem identificado como um ser particular, com o pequeno deus que mais tarde vai aparecer, usando o mesmo nome - aquele que os romanos vão chamar Cupido. Esse "segundo" Eros, se assim o podemos tratar, em geral representado como uma criança rechonchuda munida de asinhas e de um arco, disparando flechadas que provocam a paixão, é um outro deus, independente desse Eros primordial, princípio ainda abstrato que tem como principal missão fazer com que todas as divindades futuras passem das trevas para a luz.

Será, então, a partir dessas três entidades primordiais - Caos, Gaia e Eros - que tudo vai se pôr em seus lugares e o mundo, progressivamente, se organizar. Por isso a questão primeira e fundamental dentre todas: como se faz para passar da absoluta desordem das origens para o mundo harmonioso e belo que conhecemos? Em outras palavras, que em breve serão as usadas pelos filósofos, como se passa do caos inicial ao "cosmos", isto é, à ordem perfeita, à organização bela e justa de uma natureza magnífica e generosa em que tudo está maravilhosamente bem-disposto sob a suavidade do sol? É esta a primeira história, a narrativa das origens de todas as coisas e de todo ser, dos elementos naturais, dos homens e também dos deuses. É a narrativa fundadora de toda a mitologia grega. E é com ela, então, que devemos começar.

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"A Sabedoria dos Mitos Gregos"
Autor: Luc Ferry
Editora: Objetiva
Páginas: 312
Quanto: R$ 39,90
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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