Livraria da Folha

 
19/01/2010 - 07h00

Escritor David Grossman pede "criatividade" para difundir ideia da paz

da Livraria da Folha

No programa "Roda Viva" (TV Cultura), exibido na noite de ontem (18), o escritor israelense e pacifista David Grossman, autor do premiado "A Mulher Foge", disse que escritores, intelectuais e professores têm de ser muito criativos e insistir em contar a história de forma a permitir que as pessoas abram o coração para a ideia da paz. Ele destacou o poder transformador da educação, mas fez ressalvas quanto a seu alcance no caso do conflito no Oriente Médio.

"Infelizmente, a paz não será atingida através da educação das crianças, mas da decisão de líderes israelenses e palestinos e de negociadores duros que se sentarão para elaborar acordos possíveis para ambas as partes. Mas a questão da educação é muito importante. E é difícil educar as pessoas a acreditar no outro, a serem menos desconfiadas, a correr riscos, a respeitar o outro quando se está em uma guerra. Estamos fazendo o melhor possível em Israel", disse o escritor.

Na sua avaliação, a situação na Palestina não é melhor do que em Israel. "Há uma constante lavagem cerebral dos dois lados."

Grossman também falou do teor político da literatura israelense. "Como escritor israelense, estou acostumado a esse fenômeno de qualquer texto criado em Israel ser logo interpretado como somente político, o que é, certamente, um erro. Creio que há esse aspecto em tudo o que vem sendo escrito em Israel, em qualquer texto sério, mas não é o único. A literatura é um pouco mais complexa e condensa o que temos recebido da mídia."

Divulgação
Uma mãe viaja por Israel temendo ter notícias da morte do filho
Uma mãe viaja por Israel temendo ter notícias da morte do filho

O escritor perdeu o filho Uri, morto em combate no Líbano em 2006. Durante a entrevista, ele falou do drama da Israel contemporânea relatado em "A Mulher Foge" por meio do sofrimento de Orah, que percorre o país para não correr o risco de receber em casa a notícia de que seu filho caçula morreu na guerra do Líbano. Ela passa a anotar tudo o que lembra sobre ele, como se palavras pudessem protegê-lo.

Questionado se os conflitos podem ser resolvidos com palavras, disse: "O que sei é que não pode ser resolvido pela força. Durante mais de cem anos judeus e árabes, nessa área atormentada do mundo, lutam e tentam se matar. E um lado não consegue eliminar o outro. Eles precisam viver juntos, coexistir, fazer concessões dolorosas. E para que isso aconteça, precisamos de palavras, inclusive para lembrar de que não estamos fadados a viver e morrer pela espada, de que não há um decreto divino que dite que todos os israelenses e palestinos devam matar uns aos outros."

Sobre uma possível forma de solucionar as diferenças entre palestinos e israelenses, o escritor lembrou do futebol: "Nosso conflito não é uma partida de futebol. Em um jogo você deve torcer por um time e, em geral, odeia-se o outro. Quando se trata do nosso conflito, de qualquer conflito humano, é preciso apoiar as duas equipes. É preciso compreender e estar comprometido com a complexidade dos dois lados. Essa é a única maneira de resolver a questão."

Grossman falou ainda do presidente americano Barack Obama. "O senhor Obama é abençoado com uma qualidade que George Bush não tinha. Por sua natureza, o senhor Obama é abençoado com um olhar multifocal da realidade. Ele vê as coisas de uma forma muito elaborada e complexa. Essa é a maneira de solucionar nosso problema."

O "Roda Viva" com o escritor foi gravado em setembro do ano passado, quando Grossman esteve no Brasil, participando da 14ª Bienal do Livro do Rio.

 
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