Livraria da Folha

 
20/03/2010 - 10h15

Noel Rosa ajudou a levar o samba do morro para "asfalto"

BENEDITO TEIXEIRA
colaboração para a Livraria da Folha

Divulgação
Com 60 páginas, livro em capa dura traz tudo sobre Noel Rosa, além de CD com 14 faixas
Com 60 páginas, livro em capa dura traz tudo sobre Noel Rosa, além de CD com 14 faixas

Foram cerca de 200 composições em apenas 26 anos, quatro meses e 23 dias de uma vida curta, mas de intensa produção artística. Noel de Medeiros Rosa, nascido e criado no bairro de Vila Isabel, subúrbio do Rio, entre 1929, quando começou a compor, e 1937, quando morreu vítima da tuberculose, foi um dos responsáveis pelo que hoje representa o samba para a arte brasileira.

O aclamado "Poeta da Vila" e "Filósofo do Samba" subiu o morro e trouxe para a cidade (classes médias e para a rádio) a música nascida nos quintais dos imigrantes afro-baianos, que formavam o Rio do início do século 20. O samba se legitimava como gênero musical e deixava de lado o estigma de música feita apenas para negros. O malandro vira boêmio, e as letras se transformam em crônicas do Rio dos anos 20 e 30.

"Ninguém o superou na legitimidade de sua poesia", afirmou Carlos Heitor Cony, em artigo na Folha, em 1964.

Amante dos botequins, da noite e da boemia, o que aliados à sua já fragilidade física -nasceu de um parto a fórceps, o que provocou afundamento do maxilar e paralisia na face, prejudicando sua alimentação- Noel Rosa poderia ter sido médico, mas preferiu ser sambista.

Envolvidos com a música, o pai, o comerciante Manuel de Medeiros Rosa, que tocava violão, e a mãe, a professora Martha Azevedo, no bandolim, foram decisivos para adentrar o então adolescente Noel, com 13 anos, na arte de tocar. Começou no bandolim, mas foi no violão que encontrou seu talento.

A música para Noel Rosa, apelidado de Queixinho na escola, foi também uma forma de compensar as restrições que lhe causavam a deficiência na face. Em 1925, com 14 anos, já fazia serenatas junto com irmão Hélio Rosa, quatro anos mais novo, e começava a abusar do álcool, do cigarro e das farras.

Em declaração à imprensa da época, confessou: "A menina do lado cravava em mim uns olhos rasgados de assombro. Então eu me sentia completamente importante. Ao bandolim confiava, sem reservas, os meus desencantos e sonhos de garoto que começava a espiar a vida."

Iniciou sua carreira compondo canções com inspirações nordestinas, entre emboladas e cateretês, no grupo Flor do Tempo, que depois passou a se chamar Bando dos Tangarás. O conjunto era formado por ele e outros nomes da música na época: Almirante, Braguinha (João de Barro), Alvinho e Henrique Brito. Contudo, foi no samba que Noel consolidou sua arte. Em 1931, compôs seu primeiro grande sucesso, o samba "Com que roupa?", sucesso no Carnaval daquele ano.

Compôs sozinho ou com mais de 50 parceiros canções como "Palpite Infeliz", "Com que Roupa", "Último Desejo", "Fita Amarela", "O Orvalho Vem Caindo", "Até Amanhã", "Três Apitos", "O X do Problema", "João Ninguém", "Quem Ri Melhor", "Dama do Cabaré", "Quando o Samba Acabou", "Conversa de Botequim", "Feitio do Oração", "Feitiço da Vila", "Cem Mil Réis".

Entre seus parceiros, dois se sobressaem: Ismael Silva e Vadico. Duas cantoras também foram destaques na interpretação de suas canções: Marília Baptista e Aracy de Almeida.

Em dezembro de 2010, Noel Rosa faria 100 anos. Morreu cedo, mas deixou um legado que influenciou e continua influenciando as gerações posteriores de músicos, como Tom Jobim e Chico Buarque.

Identidade musical brasileira

Quando Noel Rosa começou a compor, no fim da década de 20, o samba carioca dava os primeiros passos rumo ao status de gênero que representava a identidade musical brasileira. Saído das festas de fundo de quintal nas casas das tias baianas, nos arredores da nova cidade que começava a ser "reconstruída" pelo governo, o samba ainda guardava características que o deixavam à margem da elite social: era feito por negros, marcado pelo improviso, fazia apologia à malandragem e era dotado de sentido lúdico e religioso.

Da periferia do novo centro carioca e dos morros que começavam a ser ocupados pelo povo expulso da área brotavam os primeiros compositores do samba, como Sinhô, Donga, João da Baiana e Pixinguinha. Os bares e cabarés da cidade recebiam as primeiras apresentações, ainda sob perseguição da polícia.

Noel Rosa, influenciado pelos sambistas do morro, foi um dos responsáveis pela inserção definitiva do samba na cidade. O impulso dado pelo rádio também foi de grande importância. Ao lado de nomes da música como Orestes Barbosa, Nássara, Mário Lago e Ary Barroso, Noel participou do grupo de compositores responsáveis pelo novo padrão estético do samba.

O momento, no início da década de 30, coincidiu com a política de valorização da cultura brasileira promovida pelo governo do presidente Getúlio Vargas. Em 1931, surgiu o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), que estabelecida regras para os artistas e reforçava a censura a produções que atentassem contra a ordem estabelecida. Essa política nacionalista acabou beneficiando a nascente produção da música popular brasileira, liderada pelo samba.

Segundo dados levantados por Zuza Homem de Melo e Jairo Severiano, em "A Canção no Tempo", entre 1931 a 1940, o samba tornou-se o gênero mais gravado, ocupando 32,45% do repertório gravado em disco.

Obras consultadas: "Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira", "Noel Rosa: Uma Biografia" (Carlos Didier e João Máximo), "A Canção no Tempo" (Zuza Homem de Mello e Jairo Severiano)

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"Folha Raízes da Música Popular Brasileira - Noel Rosa (Vol. 1)"
Páginas: 60 mais um CD com 14 faixas
Quanto: R$ 14,90
Brinde: livro-CD "Lamartine Babo (Vol. 2)"
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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