Livraria da Folha

 
25/03/2010 - 21h20

Psicanalista estilhaça desejos e angústias em livro de contos "Amores e Tropeços"

da Livraria da Folha

Divulgação
Capa traz obra do designer italiano Vincenzo Scarpellini (1965-2006)
Capa traz obra do designer italiano Vincenzo Scarpellini (1965-2006)

"Amores e Tropeços" é o novo livro de contos da psicanalista Sylvia Loeb. Com ilustração de Vincenzo Scarpellini na capa, a obra traz histórias curtas, fragmentadas e rápidas sobre relações amorosas e seus obstáculos.

São principalmente mulheres em situações do cotidiano e reflexões aguçadas sobre seus relacionamentos, angústias e tragédias. Em "O que ela mais queria", a única menina de uma família só de irmãos fala sobre o desejo de ter um pênis ("Pois eu queria mijar bem longe, mãe!").

Em "Querido, Bobby", a autora escreve uma carta com erros de português ("Sempre seráz querido para mim"), deixando para o final a explicação para o mistério.

Leia um conto de Sylvia, também autora de "Contos do Divã".

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Gosto de experimentar a vida,

gosto muito de experimentar a vida.

Minha mãe sempre dizia que eu mamava sem gula, mas com determinação, até ficar com a barriga cheia, regurgitar, e depois, repleto de leite, dormia feito um anjo, minha mãe me dizia. Gosto das coisas arrumadas, detesto agitação. Se por um lado a vida numa metrópole me estressa, por outro, me possibilita o que mais valorizo: não ter limites. Restaurantes, bares, boates, clubes de todos os tipos, saunas, casas de massagem. Aprecio homens fortes, mulheres opulentos, comidas condimentadas, álcool, tabaco, drogas de todos os tipos.

Adoro também fazer regimes e desfalecer de fome. Gosto de sentir a gordura de meu corpo virar líquido que escorre pelo ralo dourado do chuveiro. Pratico ioga sete vezes por semana, duas horas por dia, faço jejuns prolongados que me levam ao delírio. Sou também capaz de comer dias inteiros sem parar; é quando engordo e vejo as fronteiras do corpo crescerem. Sinto prazer em fazer amor ininterruptamente até perder os sentidos, assim como entro em privação voluntária por meses.

Adoro fumar e nesses períodos fumo um cigarro atrás do outro até ficar confuso. É quando penso melhor. Sou capaz, também, e isso me dá um prazer inominável, de parar de fumar e entrar em crise de abstinência.

Adoro gastar o que não posso, a aflição de não poder pagar as contas. É como pular de paraquedas, o que fiz no último final de semana. O vento frio, a queda livre, o barulho do ar sendo cortado por meu corpo desprotegido me fez desmaiar de deleite. Fui acordar perto do solo, num estremecimento que me machucou, apesar de habituado a prazeres extremos.

Gosto muito de ficar só, é quando aproveito para me recuperar. Sei que o corpo tem limites, infelizmente, precisa de cuidados. É quando me alimento de muita proteína, carne crua preferivelmente, que como com as mãos, deixando escorrer o sangue pela boca, pelo queixo. Gostaria de fazer isso em companhia de alguém, mas de modo geral as pessoas têm nojo.

Comer carne crua, depois fazer amor e lamber o outro e ser lambido por ele, numa mistura de nossas carnes com a carne crua, me causaria satisfação imensa. Sei que essas coisas podem ser malvistas, mal interpretadas, por isso tomo cuidado para não me expor. Mas tudo que é desmedido me dá prazer, me excita. Comer demais, comer de menos, desmaiar de fome, vomitar por excesso seja do que for.

Os banquetes romanos seriam o meu cenário ideal. Comida, bebida, sexo, barulho - o que fosse- sem limites, até a exaustão.

Gosto muito de experimentar a vida.

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"Amores e Tropeços"
Autora: Sylvia Loeb
Editora: Terceiro Nome
Páginas: 168
Quanto: R$ 33,00
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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