Livraria da Folha

 
10/04/2010 - 09h18

Vencedor de Nobel e vítima do Holocausto faz romance sobre horror do passado

da Livraria da Folha

Divulgação
Jornalista judeu usa hipnose para resgatar os horrores do passado
Jornalista judeu usa hipnose para resgatar os horrores do passado

Com um Prêmio Nobel da Paz no currículo (de 1986) e uma lista extensa de livros publicados, dentre eles, "Uma Vontade Louca de Dançar", Élie Wiesel traz agora seu mais recente sucesso: "O Caso Sonderberg".

O autor traz novamente a sua experiência de sobrevivente do Holocausto --aos 15 anos foi mandado para Auschwitz junto da família-- para criar uma trama reveladora sobre o sofrimento para criar essa narrativa que traz dois personagens centrais: Werner Sonderberg, estudante universitário alemão, acusado de matar o tio durante uma viagem, e Yedidyah, judeu polonês jornalista e crítico teatral, que acaba, devido ao seu talento para interpretação de pessoas, escalado para cobrir o julgamento.

Ao acompanhar os desmembramentos do caso, o jornalista começa a analisar a própria vida e suas escolhas. Quem ele é realmente? Como reencontrar os rostos desaparecidos de um pai, uma mãe e um irmão? Como entender as reais necessidades de sua esposa?

Em certo momento, Yedidyah recorre à hipnose para relembrar as imagens da sua infância e trazer à tona uma história que, até o fim dos tempos, causará vergonha à humanidade.

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O CASO SONDERBERG

Devemos sofrer, depois sentir na nuca o sopro gelado da morte, para compreendermos por que acontece de, após a mais tenra infância, passearmos com uma espécie de onda na alma, próxima da melancolia?

Foi o que senti bem antes do julgamento.

E depois.

Foi o que experimentei no dia em que, com voz doce e lenta, como se estivesse falando com uma criança, o doutor Feldman me explicou que o corpo é capaz de se tornar nosso inimigo implacável.

No que se refere ao julgamento, por muito tempo estive convencido de que nunca conheceria a verdade sobre o que realmente se passara naquele dia, nas altas montanhas dos Adirondacks, entre aqueles dois homens.

Acidente? Suicídio? Homicídio? Podemos permitir que se leve para o túmulo um enigma que se recusa a entregar seu segredo?

Afinal, que diabos tinha levado Werner Sonderberg a interromper seus estudos na Universidade de Nova York para ir passear com seu velho tio calvo e desiludido tão longe do Village?, perguntava-se Yedidyah. O que haviam dito um ao outro para que sua discussão culminasse numa violência assassina? Quem era, afinal, esse tio, cuja morte trágica, longe de todos, foi pairar no pretório de Manhattan, repleto de jornalistas, advogados e curiosos durante horas e dias?

Faz tempo que os meios de comunicação de massa, monopolizados por uma atualidade cambiante, ou simplesmente cansados, já não falam desse julgamento. O destino de um indivíduo conta pouco em relação às agitações das estrelas políticas, financeiras ou artísticas. Mas Yedidyah pensa nele com frequência, talvez até demais; na verdade, continua obcecado por ele. As imagens antigas do julgamento não o abandonam; tampouco seus ecos. A sala iluminada, os jurados com expressão alternadamente impassível ou horrorizada, o juiz que parecia dormitar, sem perder, no entanto, uma palavra sequer do que se dizia, o promotor que se considerava o anjo justiceiro. E o réu, oscilando entre a provocação e o remorso, evitando o olhar triste de sua bela noiva. Às vezes, ao fazer o balanço do seu trabalho, com seus fracassos e suas interrupções, seus triunfos deslumbrantes e suas quedas lentas ou vertiginosas, é esse julgamento que emerge em Yedidyah como um granito preto atraindo o crepúsculo.

Anos se passaram desde então, mas Yedidyah ainda não consegue se pronunciar.

Onde começa a culpa de um homem, e onde ela termina? O que é definitivo, irrevogável?

Um pensamento não para de obcecá-lo desde que, graças ao diagnóstico do doutor Feldman, ele se conscientizou da sua mortalidade: é possível que eu vá embora, é justo que deixe meus filhos, sua mãe Alika e todo esse mundo convulsivo e condenado, sem ter certeza?

Vou me lembrar desse acontecimento até a minha última hora nesta terra que me gerou, carregando-me de uma descoberta a outra, de lembrança em lembrança, de uma emoção a outra, e nunca saberei a verdadeira razão.

Por que esse encontro, essa defrontação com um destino que tocou a superfície do meu, como fruto do acaso?

Eu poderia ter estudado outras coisas, me interessado por música, e não por teatro; poderia ter tido outros mestres, me arrebatado com outra mulher, não ter me apaixonado por Alika; poderia ter sido menos próximo de meu avô, de meu tio Meir, ter feito outros amigos, nutrido outras ambições; em suma: poderia ter nascido em outro lugar, talvez no mesmo país, na mesma cidade de Werner Sonderberg, ter explorado outras lembranças. Poderia ter passado a vida inteira sem saber a verdade a respeito das minhas próprias origens.

Poderia simplesmente não ser, ou já não ser.

Ou não ser eu.

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"O Caso Sonderberg"
Autor: Elie Wiesel
Editora: Bertrand Brasil
Páginas: 208
Quanto: R$ 34,00
Onde comprar: Pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha

 
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