Livraria da Folha

 
25/04/2010 - 21h27

Filósofos discutem o amor e o belo em encontro na Grécia antiga

da Livraria da Folha

Divulgação
Este é um dos mais importantes <br> textos do filósofo grego
Este é um dos mais importantes diálogos escritos pelo filósofo

No século 5 a.C., atenienses eminentes, como Sócrates e Aristófanes, se reuniram para discutir o amor e o belo, conceitos fundamentais para a cultura helênica.

Em forma de diálogo, "O Banquete" registra o encontro e o debate que se estende por diversos temas relacionados, de amizade e amor a decência e mitologia.

Escrito por Platão, aristocrata ateniense nascido por volta do ano de 427 a.C., o volume é um de seus diálogos --forma de narrativa que marca os escritos do filósofo-- mais conhecidos. Foi discípulo de Sócrates e mestre de Aristóteles.

Esta edição da L&PM Editores é bilíngue (grego/português). Abaixo, leia um trecho do livro.

*

O BANQUETE

APOLODORO
Do que querem saber, não estou mal informado, (172a) suponho. Dias atrás, subi de minha casa no porto de Faleron para a cidade. Um conhecido, que me viu de longe, berrou atrás de mim em tom de troça:

"- Ei, Cuca-Polida, falo com você. - Por que tanta pressa?

"Atendi. Parei.

"- O que você quer?

"- Estive à tua procura, falerense, senhor Pelame-Falido, para matar uma curiosidade. Aquele encontro... Agaton, (172b) Sócrates, Alcibíades e outros, reunidos num banquete, discursaram sobre Eros. Disseram o quê? Alguém me informou que, a crer em Fênix, fi lho de Filipe, quem podia orientar-me era você, embora de seguro meu informante não soubesse nada. Esclareça-me, por favor, sigo instruções do meu amigo, fonte mais segura do que você não há. Antes de mais nada, quero saber se você esteve presente naquela reunião.

"- O quê? (172c) Pensas que o encontro de que me falas aconteceu há pouco? Eu, presente? Nunca. Teu informante te deixou no escuro.

"- Repito o que ele me disse.

"- Que equívoco, Glauco! Agaton deixou esta terra há muitos anos. Você não sabia? Meu convívio com Sócrates, preocupado em saber o que ele diz e faz dia após dia, ainda não alcança três anos. (173a) Antes eu andava por aí ao acaso, pensando que fazia algo de útil, embora fosse imprestável como ninguém. Eu não era melhor do que você agora, se pensa que todas as outras atividades são mais importantes do que filosofar.

"- Deixa de deboches. Quero saber quando foi essa famosa reunião.

"- Ainda éramos crianças. Agaton foi vitorioso já com a primeira tragédia. No dia imediato, ele e os coreutas5 celebraram a vitória com um sacrifício.

"- Entendo; pelos fatos faz muito tempo. Quem foi que te contou? O próprio Sócrates? (173b)

"- De maneira alguma. Minha fonte é a mesma de Fênix, certo Aristodemo, um baixinho de Cidateneão, um que anda sempre descalço. Esse participou da festa, erasta de Sócrates, ao que sei, dos mais fervorosos. Não deixei, entretanto, de consultar Sócrates sobre detalhes do que ouvi dele. Sócrates os confirmou.

"- Sendo assim, por que você não me conta? Nada mais adequado do que o caminho a Atenas para uma troca de palavras." (173c)

Enquanto caminhávamos, nosso entretenimento foi esse. Perceberam? Não falam com um desinformado. Se querem ouvir- me, terei grande prazer em satisfazê-los. Aliás, ouvir ou falar sobre filosofia me dá muita alegria, sem mencionar o proveito que a conversa me proporciona. Bens, negócios, assuntos que interessam a vocês, me desagradam. Amigos, tenho pena de vocês. Imaginam que se ocupam de tarefas relevantes? Perdoem-me, isso não vale nada. (173d) Suspeitam de que eu seja um indivíduo de má sorte... Talvez tenham razão. Ouçam-me! Não é suspeita, tenho certeza de que a sorte não está com vocês.

COMPANHEIRO
Você não muda, Apolodoro. Deprecia impiedosamente a si mesmo e aos outros. Parece que na tua opinião todos são desafortunados, a começar por você mesmo. Sócrates é tua única exceção. Delicado, tu? Não sei quem te botou esse apelido, amalucado. Em tuas conversas, és sempre assim, irritadiço contigo mesmo e com os demais. Sócrates... não se salva mais ninguém. (173e)

APOLODORO
Acertou. A opinião que eu tenho de mim mesmo e de vocês é precisamente essa. É por isso que me consideram maluco, destrambelhado?

COMPANHEIRO
Por que brigar por causa disso agora? Vale a pena? Eu te pedi informação sobre os discursos. Vamos, conta. Sem esquivança.

APOLODORO
Será um relatório aproximado. Vou tentar reproduzir o que ouvi, começando pelo princípio. (174a) Aristodemo disse que tinha encontrado Sócrates lavado e de sandálias, o que é raro. Quis saber aonde o levava tanta elegância.

- A um jantar na casa do belo Agaton - teria-lhe respondido Sócrates. - Não participei das homenagens de ontem, detesto multidões. Mas lhe prometi estar lá hoje. Por isso me embelezei. Belo visitarei um homem belo. E tu, me acompanharias mesmo sem convite? (174b)

- Por que não? Estou às tuas ordens.

- Está bem, vem comigo. Ataquemos o provérbio, alterando-lhe o sentido: "Ao festim de um Agaton, acatados afluem espontaneamente". Tudo indica que Homero, além de agredir o provérbio, foi insolente. Pois ele apresenta Agamênon como bravo combatente, exemplar, ao passo que Menelau aparece como um "lanceiro mole". (174c) Quando Agamênon celebrou um sacrifício seguido de banquete, Homero introduziu Menelau. Sem convite, o menos acatado compareceu na festa do mais acatado. Aristodemo reagiu a essa observação, ao que me disse, com esta observação:

- Arrisco a me dirigir sem convite, eu, um homem inferior, à festa de um homem sábio, não como insi nuas, mas como o declara Homero. Se insistes em que eu vá, pensa numa justificativa. Aparecer lá sem convite, não quero. Direi que fui convidado por ti. (174d)

- No trajeto - observou Sócrates -, podemos pensar juntos numa justificativa. Andemos! Segundo Aristodemo, quando partiram a conversa corria assim. Sócrates, absorto nos seus próprios pensa mentos, afrouxou o passo. Pediu a Aristodemo que continuasse a andar sem atribuir importância à demora. Quando Aristodemo chegou à casa de Agaton, encontrou a porta aberta. Aconteceu um incidente engraçado. (174e) Um escravo, um dos lá de dentro, aproximou-se para levá-lo à sala onde os convivas se encontravam reclinados. Agaton, ao botar os olhos nele, saudou-o com alegria:

- Aristodemo! É bom te ver. Festeja conosco. Se outro motivo te trouxe, deixa para depois. Procurei-te ontem, foi inútil, não te encontrei. E Sócrates? Não veio contigo?

"Cheguei a virar a cabeça", me disse Aristodemo.

- Nada de Sócrates. Eu o perdi. E foi Sócrates quem me convidou. De outro modo, eu não teria vindo.

- É assim que se faz - observou Agaton. - Mas esse homem, onde é que se enfiou?

- Ele me seguia. Espantado estou eu. (175a)

- Vai procurar Sócrates, rapaz - ordenou Agaton a um escravo. - Rogo-te, Aristodemo, que te reclines ao lado de Erixímaco.

*

"O Banquete"
Autor: Platão
Editora: L&PM Editores
Páginas: 176
Quanto: R$ 9,60
Onde comprar: pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha

 
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