Livraria da Folha

 
02/05/2010 - 20h05

"Mães em Guerra" narra as loucuras que as mães fazem pelos filhos; leia trecho

da Livraria da Folha

Divulgação
Engraçadas loucuras que uma mãe pode fazer para proteger os filhos
Engraçadas loucuras que uma mãe pode fazer para proteger os filhos

A cronista norte-americana Jill Kargam aposta em um novo gênero com "Mães em Guerra", seu primeiro livro publicado no Brasil: o mom lit, subgênero que versa sobre maternidade, gravidez e educação das crianças. A partir de uma história ficcional, a autora narra, com texto bem humorado, as loucuras que as mães costumam fazer para defender os filhos.

O livro narra o cotidiano de Hannah Allen, mãe de uma garotinha de dois anos e esposa de Josh, um homem muito atraente. Ao mudar-se para um dos bairros mais elegantes de Nova York, ela se depara com um estilo de vida completamente distinto do que está acostumada.

E se vê em meio a uma "guerra de mães": as novas vizinhas mostram-se cruéis e paranóicas, prontas a destruir qualquer uma que possa ser melhor mãe do que elas.

Lançamento da editora planeta, "Mães em Guerra" deverá ser publicado em mais oito países.

Abaixo, leia um trecho da obra:

*

Três

No entanto, havia outro humanoide da raça chique que acrescentava uma dose adicional de estresse à minha mudança - um estresse que me dava frio na espinha. Eu mal havia acabado de instalar nossa secretária eletrônica digital (aquela porcaria era tão difícil de ligar que praticamente exigia um diploma do M.I.T.) quando recebemos O telefonema. Eu estava trocando a fralda de Violet; era um Alerta Marrom de grandes proporções e eu não tinha como atender o telefone. Voltei para a sala com minha filhota, já de fralda limpa, e vi um "1" vermelho piscando na secretária. Apertei play e senti um arrepio no momento em que um timbre de voz venenoso reverberou pelo apê. Era a Senhora Lila Allen Dillingham - também conhecida como "a mãe do Josh".

Eu sei, eu sei: quase todo mundo odeia a própria "S". Essa é a regra, e não a exceção. Todas as "S" irritam as "N". Elas metem o bedelho. Elas dizem que sabem o que é melhor para os filhos. A lista é interminável. Mas essa mulher não era apenas uma pedra no meu sapato: ela era uma mala completa, sem alça e sem rodinha. Ela realmente fazia o tipo que veio de uma família tradicional. Apaixonada, casara-se aos 21 anos com o pai de Josh, um homem carinhoso e doce. Mas, para uma mulher que nasceu em Greenwich e circulava nas mais altas rodas, a paixão não é o suficiente para pagar a conta do Country Club. O pai de Josh, cujos olhos brilhantes e o sorriso alegre enfeitavam porta-retratos na nossa casa, falecera quando o filho tinha oito anos sem deixar quase nenhum dinheiro.

À semelhança dos meus pais, ele era um professor apaixonado pelo que fazia. A despeito de uma conta bancária cada vez mais minguada - graças a três gerações de jogadores de tênis que herdavam uns os nomes dos outros e se achavam "acima" desse negócio de trabalhar -, os pais de Lila tinham um sobrenome respeitável. E se opuseram radicalmente ao casamento da filha, porque o noivo era judeu. Por mais que ela o amasse de verdade (todo mundo conta que ele era um homem muito divertido e afetuoso), o rancor causado pelo que amigas de Greenwich tinham e pela pressão de não ser deixada para trás foi aumentando à medida que os valores materialistas herdados dos pais ganhavam terreno. Segundo Josh, depois que o marido morreu, Lila foi ficando cada vez mais maluca com o passar dos anos. Estava tão obcecada que, meses depois da morte do pai, levava o filho para passear de carro por Lauder Way e dizia para o menino que queria "encontrar o próximo marido". Mais tarde, os dois acabaram voltando para Nova York.

Ela era uma socialite loira e fria, e foi a única que não ficou exultante quando anunciamos que iríamos nos casar. Depois que contamos para ela, fui chorar no ombro de Josh. A mandíbula travada, no melhor estilo Tom Cruise, me deu certeza de que ela ficou arrasada: seu único filho, seu príncipe, seria desperdiçado com uma menina de classe média como eu - e eu sabia que ela vivia cercada por um batalhão de cisnes da alta sociedade, que considerava esposas muito melhores para ele. Ela sempre fora fria - gelada - comigo (na Máfia do Rolinho Primavera, grupo de amigas de São Francisco com quem eu jantava num restaurante chinês todos os domingos, ela era conhecida como A Pedra de Gelo). Lila sempre me examinava da cabeça aos pés, e obviamente detonava meu guarda-roupa em pensamento. Tenho certeza de que nem mesmo Christy Turlington seria aprovada por sua inspeção do tipo ressonância magnética, já que nenhuma solteira dentre todas as mortais era digna do seu "anjiiiiiiiiiiiiinho". Não quero bancar a metida, mas as mães de todos os meus namorados sempre me adoraram. Sou super educada, atenciosa, respeitosa; na hora de tirar a mesa ou dar um jeito na cozinha, sempre pulo da cadeira como se o salto dez da minha bota fosse uma mola e vou ajudar imediatamente. Sou super mulherzinha. Sou extrovertida, assisto novela, sorrio, faço amigos. E entendo totalmente essa relação mãe e filho, essa coisa "coitadinho do meu bebê".

Mas infelizmente este caso era completamente diferente, eram outros quinhentos. A mãe de Josh idolatrava o filho de um jeito meio bizarro, como se ele fosse a garantia da preservação da "pureza" da linhagem social que ela interrompera com seu primeiro casamento; se Josh fizesse um bom casamento e permanecesse na alta roda, ela poderia corrigir os erros do passado e assegurar aos netos um lugar no clube da elite. E, evidentemente, ela não queria que ele repetisse os erros cometidos por ela. Ela mesma não cometeu o erro novamente: seu segundo ca$amento foi um golpe do baú descarado. Watson Dillingham era um milionário britânico, ex‑campeão de polo, que comprou uma mansão em Conyers Farm, Greenwich, para a mulher; além de uma cobertura na Quinta Avenida, debruçada sobre as árvores bucólicas do Central Park - era como se o parque fosse o quintal da casa. Ele tinha quase oitenta anos, vinte a mais do que ela. E, enquanto ela aproveitava a vida descendo a mão no cartão de crédito, Watson (ou "Watts") tinha duas filhas na Inglaterra que sem dúvida ficariam com o grosso da grana quando o velho fosse jogar a partida final de polo, lá no andar de cima. Talvez por isso ela estivesse tão desesperada para que Josh se casasse com uma ricaça. Talvez ela simplesmente achasse que eu não estava à altura dele. Talvez ela fosse me atormentar até eu pirar de vez. Mas meu marido era um presente de Deus.

Josh era o máximo. Pencas de mulheres têm problemas com a sogra- é claro que, mesmo com a minha "S" dura na queda, eu não sou a única. E a única coisa capaz de nos fazer aturar isso tudo é a forma como o marido lida com a situação. O pior esquema é aquele lance Édipo-Jocasta: o cara defende o comportamento da mamãe, ou então fica "dividido". Não era o caso do Josh. Ele sempre me disse que conhecia muito bem as maluquices da mãe - convivera com elas desde a infância: a preocupação permanente em fazer parte dos círculos certos, a conversa sobre as fortunas das outras famílias, as fofocas incessantes sobre o divórcio de Fulano e Fulana, sobre o filho de não-sei-quem
que não foi aceito na escola nao-sei-das-quantas, sobre as ações da empresa de algum figurão, que estavam despencando na bolsa. "Não caia nessa conversa, ela é louca", dizia ele para me acalmar. "Hannah, você é a mulher da minha vida." E era verdade. Pelo menos quando estávamos no nosso refúgio californiano, a quilômetros de distância da Pedra de Gelo. Até o momento em que ouvi aquela voz esganiçada saindo da secretária eletrônica. Aí meu sangue congelou mais uma vez.

"Joshie! Bem‑vindo de volta, anjinho do meu coração." A voz dela fazia eco na porcaria do alto-falante. "Espero que você venha para meu grande jantar de aniversário em Greenwich no fim de semana. Watts e eu estamos nos divertindo muito. Vou dar um pulo em Nova York amanhã ou depois para resolver alguns compromissos. Ligue para cá de manhã, meu anjo." Nada de "Oi, Hannah". Nenhuma palavra sobre Violet, a única neta que ela tinha. Mas eu sabia que teríamos de ir para lá no fim de semana e dançar conforme a música. Afinal de contas, ela estava fazendo sessenta anos. A ideia me apavorava - quando estávamos namorando, eu me sentia totalmente deslocada em todas as nossas visitas à casa de campo. Era um festival de esnobismo. Se Greenwich era o inferno, a mãe de Josh era o demônio em pessoa, à frente de um mar de lava borbulhante. Mas as coisas iriam piorar de vez dentro de algumas semanas, quando Sua Majestade retornasse em tempo integral para o apartamento que ficava a poucos quarteirões de distância do nosso. De qualquer forma, eu tinha que respirar fundo, deixar minhas frustrações de lado e ser forte. E eu achava que era capaz de fazer isso. Claro! Eu daria conta do recado. Mas toda vez que ela estava com a gente os minutos pareciam horas, e eu me sentia como se estivesse confinada em Alcatraz.

Enquanto isso, num computador a alguns quarteirões dali...

Mensagem Instantânea de: Bee Elliott
BeeElliott: Bonjour - vc tá aí?
Magg10021: Oui, cherie. Como está?
BeeElliott: PÉSSIMA.
Magg10021: Pq?????
BeeElliott: Fui ao dermato e levei a maior bronca pq tomei sol na praia.
*Magg10021: O dr. Phillip? O q ele disse?
BeeElliott: Q entrar no consultório dele c/ uma pele como a minha é a mesma coisa
que ir a uma reunião do AA c/ uma garrafa de Johnnie Walker.
Magg10021: Mto bom!
BeeElliott: Então, Magg... FAVORZÃO.
Magg10021: Claro, diz.
BeeElliott: A mulher de um amigo do Park acaba de se mudar p/ NY e tenho q
Apresentá-la pro pessoal. Q saco. Vc vem?
Magg10021: Claro, sem problemas. Qual é a dela?
BeeElliott: Tanto faz. Morava em SF, cresceu em Seattle, acho; boazinha, mas nada
a ver c/ a gente. Ela se veste de um jeito q parece q a vendedora da C&A
vomitou em cima dela. Não é uma MQEC feito nós.;‑)
Magg10021: Hehehe. Saquei. É claro q vou, td bem.
BeeElliott: Conheço o marido e a "S" dela desde q sou um feto - vc conhece a Lila
Allen Dillingham? Ela é presidente do comitê beneficente do MCG.
Magg10021: Mulheres Contra o Glaucoma? Claro! Tem uma foto dela na Town & Country.
A mulher do Watson Dillingham?
BeeElliott: A própria. Encontrei c/ ela no Swifty's e ela praticamente me implorou
p/ apresentar a nora pro pessoal; está tensa pq a garota é bem São
Francisco, meio nada a ver... Q medo! Preciso de ajuda!
Magg10021: Claro, cherie.
BeeElliott: Te amo, obrigada! Vamos marcar um encontro das crianças. Minha babá
vai ligar pra sua.

*

"Mães em Guerra"
Autor: Jill Kargam
Editora: Planeta
Páginas: 288
Quanto: R$ 39,90
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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