Livraria da Folha

 
05/05/2010 - 12h15

Romance "tempera" relações de amor e amizade em escola de culinária

colaboração para a Livraria da Folha

Divulgação
Narrativa leve trata de paixões e amizades construídas na mesa
Narrativa leve trata de paixões e amizades construídas na mesa

A norte-americana Erica Bauermeister afirma em seu site pessoal que decidiu ser escritora porque acredita que os livros podem pegar pequenas partes da vida das pessoas que são consideradas irrelevantes e enchê-las de beleza, dando brilho aos seus significados.

Em seu primeiro romance, "Escola dos Sabores", a busca da autora começa na arte de conquistar o leitor pela boca. São nove personagens, que dentro de uma aula semanal de culinária, aprendem não só receitas, mas abusam de sabores e sentidos para compreenderem e desenvolverem suas relações pessoais, cada qual com suas angústias e dilemas distintos.

A protagonista é Lillian, amante da gastronomia desde criança e dona do restaurante onde todas as segundas-feiras recebe oito pessoas para as aulas de culinária. Nessa brecha de sua rotina de chef de cozinha, Lillian procura ser um espelho de sua criadora dentro do romance, estimulando o tal brilho em cada um de seus alunos por meio de aromas e gostos cuidadosamente planejados.

Erica está escrevendo seu segundo livro, provisoriamente intitulado Salto (Leap, em inglês). Antes de acompanhar este novo pulo na carreira literária da autora, leia o trecho inicial do prólogo de "Escola dos Sabores" abaixo.

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O momento de que Lillian mais gostava era aquele, logo antes de acender as luzes. De pé no vão da porta da cozinha, com o ar encharcado de chuva atrás de si, deixava os aromas virem até ela: a pungência do fermento fresco, o cheiro adocicado de terra do café e o odor do alho, que ficava mais suave com o passar do tempo. Por baixo deles, surgiam os toques mais suaves, difíceis de serem percebidos, de carne fresca, tomate, melão e alface lavada. Lillian respirava fundo, sentindo os cheiros se agitarem e invadirem seu corpo, ao mesmo tempo que procurava detectar algum que pudesse sugerir uma laranja podre no fundo de uma pilha ou revelar que a subchefe continuava dobrando a medida de curry nos pratos. E continuava mesmo. A moça era filha de uma amiga e bastante hábil com facas, mas, em alguns dias, Lillian pensava com um suspiro, lidar com ela era como tentar ensinar um vendaval a ser sutil.

Mas era segunda-feira à noite. Nada de subchefes, nada de clientes em busca de conforto ou celebração. Era segunda-feira, noite da aula de culinária.

Após sete anos lecionando, Lillian sabia como os alunos chegariam para o primeiro dia de curso - passariam pela porta, sozinhos ou em grupos de dois ou três, formados de improviso no caminho que levava ao restaurante quase às escuras, mantendo a conversa nervosa e em voz baixa, comum entre desconhecidos que em pouco tempo iriam tocar a comida uns dos outros. Uma vez na cozinha, alguns se aproximariam dos colegas, ensaiando os primeiros passos em direção a um vínculo, enquanto outros passeariam por ali, alisando com os dedos panelas de cobre ou pegando uma pimenta vermelha reluzente, como crianças atraídas pelos enfeites mais baixos de uma árvore de Natal.

Lillian adorava observar os alunos nessa hora: elementos que se tornariam mais complexos e intrigantes à medida que se misturassem uns com os outros, mas cujas essências, agora no início, claramente se distinguiam naquele ambiente pouco familiar. Um homem bastante jovem estende o braço para tocar o ombro da mulher ainda mais nova ao seu lado - "Qual é o seu nome?" -, enquanto ela abaixa a mão até a bancada de aço inox e con torna a superfície lisa. Outra moça em pé, sozinha, a mente ainda distraída por talvez um filho? Um amante? De vez em quando aparecia um casal, apaixonado ou em crise.

Os alunos de Lillian tinham motivações diversas, alguns deles eram atraídos por um desejo ainda não reconhecido de ouvir elogios a seus talentos culinários, outros queriam apenas conhecer um chef, não se tornar um. Uns poucos participantes não tinham vontade nenhuma de aprender a cozinhar e chegavam trazendo vales-presentes como se estivessem sendo obrigados a marchar rumo ao fracasso certo - sabiam que seus bolos sairiam sempre solados, seus molhos cremosos, cheios de pequenas e desconcertantes bolotas de farinha, como contas que aparecem na caixa de correio quando se espera uma carta de amor.

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"Escola dos Sabores"
Autor: Erica Bauermeister
Editora: Sextante
Páginas: 224
Quanto: R$ 24,90
Onde comprar: 0800-140090 ou na Livraria da Folha

 
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