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11/10/2000 - 09h15

Bush mostra fraqueza em política externa no primeiro debate

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da Folha de S.Paulo
do "THE NEW YORK TIMES"

Falemos sem rodeios: o candidato republicano à Presidência dos EUA, George W. Bush, não ficou em segundo lugar nos debates da semana passada.

Ficou em quarto, porque qualquer pessoa que tenha assistido aos debates na TV terá percebido que Al Gore (o candidato democrata) e os candidatos a vice Dick Cheney (republicano) e Joe Lieberman (democrata) tinham domínio melhor das questões discutidas do que Bush e pareciam ser mais feitos de "matéria presidencial" do que ele.

O fato de os eleitores terem se dado conta disso é inquestionável. Mas se vão preocupar-se com isso no dia da eleição é inteiramente outra questão.

Será que os eleitores vão atribuir mais importância à inteligência de Gore ou a sua tendência irritante de contar mentirinhas sem importância e dizer coisas que agradam aos ouvintes? Vão castigar Gore por sua arrogância intelectual ou premiar Bush por sua afável ignorância? Quem os eleitores vão preferir? Um candidato que não consegue falar a verdade ou um que não consegue pronunciá-la? Um candidato que às vezes diz qualquer coisa ou um que às vezes parece não saber nada?

Todas essas são perguntas em aberto. Mas ainda há mais dois debates nos quais Bush poderá se refazer. A área na qual ele mais precisa melhorar hoje é a da política externa.

As respostas que Bush deu às perguntas sobre política externa foram tão profundamente superficiais que não pudemos deixar de nos indagar: será que ele está tão pouco familiarizado assim com a matéria e pouco à vontade com as questões ou será que seus assessores de política externa simplesmente não o prepararam para o debate porque eles próprios não estão preparados para lidar com o mundo? Acho que a resposta seria "um pouco das duas coisas".

Considere o momento em que Bush foi indagado sobre como reagiria ante a outra crise financeira global inesperada. Ele disse: "Eu chamaria Alan Greenspan (presidente do banco central) e estudaria os fatos".

Fantástico! Minha mãe faria o mesmo -mas ela não acha que deve ser a presidente. A política externa de Bush se resume a isso: "eu ligaria para Colin Powell (ex-comandante militar), ligaria para Alan Greenspan".

Mas o que ele perguntará a esses assessores? E o que vai acontecer se eles discordarem? Para isso, Bush precisa realmente saber alguma coisa, ele mesmo, e ele parece ser um homem dotado de pouca curiosidade intelectual.

Bush parece acreditar que já tem uma política externa pelo simples fato de mencionar o nome de Colin Powell quando se fala no assunto. Se Bush tivesse dado ouvidos a Powell no caso de Kosovo, provavelmente nunca teria havido guerra aérea dos EUA contra Slobodan Milosevic, que ainda estaria no poder na Iugoslávia.

As respostas que não são respostas dadas por Bush refletem o nível superficial do pensamento generalizado no Partido Republicano de hoje em relação à política externa.

O fato é que a maior parte do partido, que, durante décadas, pautou sua atuação no exterior pela Guerra Fria e pelo sentimento anti-soviético, simplesmente sofreu morte cerebral desde o fim do confronto com Moscou.

Ela vem sobrevivendo baseada nas gafes do presidente Bill Clinton e nos insultos contra sua equipe.

Os únicos esforços originais vistos no Partido Republicano para adequar-se ao fim da Guerra Fria foram o nacionalismo americano de isolacionismo exacerbado de Pat Buchanan (hoje no Partido da Reforma) ou o nacionalismo americano de intervencionismo exacerbado articulado por William Kristol e Robert Kagan.

Como Bush não está interessado em nenhum dos dois, não surpreende que, quando questionado sobre a política externa, simplesmente recorra à menção de nomes ou a uma espécie de espírito de neo-Guerra Fria, conforme visto em sua promessa de "reconstruir o poderio militar", que "começa com um aumento salarial de US$ 1 bilhão para os homens e mulheres que vestem a farda".

Não seria problema se ainda estivéssemos travando a Guerra Fria e se a ameaça atual aos EUA fosse a força militar de Rússia, China, Paquistão ou Indonésia.

Mas o fato é que o que realmente ameaça nossa segurança e a estabilidade do mundo em que vivemos hoje é a fraqueza e a potencial queda desses Estados pós-Guerra Fria, por causa da ausência de instituições sólidas e da corrupção total.

Deveríamos, isso sim, estar gastando US$ 1 bilhão para atualizar nossas ferramentas diplomáticas, tais como os bancos internacionais de desenvolvimento, para reestruturar a assistência externa e o alívio da dívida, para ajudar os países a erguer as instituições democráticas necessárias para governar e para fortalecer a ONU, exatamente para que ela possa encarregar-se dos trabalhos de manutenção da paz e construção de nações que nós queremos evitar.

O melhor que se pode dizer a respeito de Bush é que ele refletiu sobre o mundo e concluiu que ainda vivemos na década de 80. Portanto, ele pretende resolver os problemas da era de seu pai (o ex-presidente George Bush) com os velhos assessores de seu pai.

O pior que se pode dizer é que, numa fase adiantada da campanha eleitoral à Presidência, ele ainda não conseguiu decorar o conteúdo de seu caderno de "briefings" em política externa e manifestou interesse zero em repensar o que ele tem a dizer sobre o mundo.

Como Bush pode ser o nosso próximo presidente, ambas as alternativas são preocupantes.




  • Leia mais no especial Eleições nos EUA.
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