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02/09/2001 - 08h52

Delegação brasileira faz críticas ao governo em conferência

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FERNANDA DA ESCÓSSIA
da Folha de S.Paulo, em Durban

Integrantes da delegação brasileira se reuniram ontem de manhã em Durban, na África do Sul, e fizeram críticas ao que chamaram de "contradição" entre a atuação internacional e as políticas internas do governo brasileiro. A principal cobrança feita ao ministro José Gregori (Justiça), presente à reunião, foi pela implementação efetiva de políticas de combate à desigualdade.

A reunião aconteceu horas antes do discurso de Gregori no plenário da Conferência das Nações Unidas contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância Correlata, que começou anteontem.

"A postura internacionalmente ativa do governo é louvável, mas queremos que as leis saiam do papel. Estamos cansados de leis para inglês ver", disse Marcelo Paixão, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Ivanir dos Santos, do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas, pediu apoio às políticas de ação afirmativa para a população negra: "Queremos ação. E queremos lembrar também que, se há hoje um avanço nas posições do governo, isso se deve às cobranças da sociedade civil".

Uma das reivindicações é a implantação das propostas apresentadas pela sociedade civil na Conferência Nacional contra o Racismo, realizada em julho no Rio.

O coordenador de políticas públicas do Ibase (Instituto Brasileiro de Análises Socio-Econômicas), Átila Roque, disse que a reunião colocou pela primeira vez, frente a frente, um ministro de Estado e tantos membros da sociedade civil.

"O que seria só uma reunião burocrática, de informes sobre vôos e hotéis, acabou se transformando em um momento de debate, de revelação de discordâncias", afirmou. Para Roque, a reunião serviu como uma espécie de "banho de realidade" sobre a condição do Brasil.

A vice-governadora do Rio de Janeiro, Benedita da Silva (PT-RJ), pediu
unidade ao grupo, lembrando que as conquistas obtidas resultaram de mobilização da sociedade civil. "Já lavamos a roupa suja", afirmou Benedita.

O ator Milton Gonçalves, membro da delegação, fez uma intervenção emocionada: "Estou cansado de ser chamado de crioulo, preto, pretinho. Sou um afro-descendente. Por que não eleger um presidente negro?". Parte do movimento negro brasileiro adota o termo afro-descendente, influência da denominação "afro-americano", usada nos EUA.

Os militantes negros colocaram uma bandeira do Brasil sobre a mesa e cantaram o hino nacional. Alguns choraram. Participaram da reunião cerca de 200 pessoas, entre membros da delegação oficial e representantes de organizações não-governamentais.

Representantes indígenas também cobraram do governo a implementação do novo Estatuto do Índio, regulamentando o fim da condição de relativa incapacidade civil dos povos indígenas.

O presidente do grupo homossexual Arco-Íris e secretário de Direitos Humanos da Associação de Gays, Lésbicas, Travestis, Transexuais e Bissexuais, Claudio Nascimento, afirmou considerar um avanço o apoio do Brasil à discussão sobre a discriminação contra homossexuais.

Alguns parlamentares da delegação brasileira em Durban, como o vereador Edson Santos (PT-RJ), estudam, porém, elaborar uma moção de repúdio pela ausência do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Gregori
O ministro Gregori afirmou que as críticas são naturais numa democracia pluralista. Disse no plenário da conferência que o Brasil "ainda não é o país socialmente justo que queremos e merecemos ter" e que políticas afirmativas deverão ser adotadas no Brasil.

"Do esforço promovido pelo governo e pela sociedade civil resultou um relatório-síntese dos problemas e propostas de solução que certamente se traduzirá em ações e políticas afirmativas."

Gregori citou como questões prioritárias para o desenvolvimento melhorar a situação dos afro-descendentes, dos povos indígenas e das vítimas de discriminação por gênero, orientação sexual ou deficiência física.
O discurso do ministro foi contra a condenação nominal de um povo ou de um país por prática de racismo.

"Somos, ao mesmo tempo, cúmplices e vítimas. O que nos une é o reconhecimento de um problema comum no qual ninguém é mais culpado do que ninguém. Esta conferência não é um tribunal", disse.

O secretário de Estado de Direitos Humanos, embaixador Gilberto Saboia, afirmou que, nas negociações do encontro de Durban, é preciso manter as conquistas alcançadas até agora. De acordo com ele, no plano interno, é o momento de partir para a elaboração dos planos nacionais contra a desigualdade.

Leia mais no especial sobre a conferência da ONU



 

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