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15/01/2003 - 03h29

Lula quer liderar negociações sobre a crise venezuelana

ELIANE CANTANHÊDE
Diretora da sucursal da Folha de S.Paulo, em Brasília

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva almoça hoje com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, no Equador, numa demonstração explícita de que o Brasil se contrapõe aos EUA e quer liderar as negociações na crise venezuelana.

Enquanto o Brasil defende as posições do governo constitucional, os EUA dão guarida às oposições. Ambos tentam definir hoje o formato e os países do "grupo dos amigos da Venezuela", que atuará junto à OEA (Organização dos Estados Americanos) para a resolução do impasse.

A idéia da criação do grupo é brasileira, os EUA acabaram aderindo e estão enviando hoje para Quito o assessor da Casa Branca para América Latina, John Maisto, com a missão de conversar com a delegação brasileira. Além de Lula, irão o chanceler Celso Amorim, o assessor de Lula para a área internacional, Marco Aurélio Garcia, e o embaixador brasileiro em Caracas, Ruy Nogueira.

A iniciativa do encontro partiu dos EUA. No domingo (12), a embaixadora norte-americana em Brasília, Donna Hrinak, entrou em contato com Amorim para agendar o encontro com Maisto.

Há fortes diferenças de visão entre Brasil e EUA sobre a crise e sobre como o "grupo de amigos" deve agir. "Os EUA têm uma pressa maior [para uma solução], mas o Brasil acha que a pressa é a inimiga da perfeição, pode atrapalhar uma solução adequada e consistente", disse ontem à Folha de S.Paulo Marco Aurélio Garcia.

Segundo ele, os EUA têm pressa porque, em havendo uma guerra contra o Iraque, eles não vão poder prescindir do petróleo venezuelano. O Brasil também está preocupado com os efeitos econômicos, mas prefere um acordo bem acertado entre as partes.

A intenção é levar Lula à condição de líder desse acordo, afirmando uma posição emergente no cenário internacional. O primeiro cuidado, porém, é, como disse Garcia, convencer os EUA "de que não queremos tirar nenhum proveito político da crise".

Quem é quem
Segundo Garcia, que já se encontrou com Maisto em dezembro, a tese dos que apóiam a participação americana é que "os EUA, estando nas negociações, são uma espécie de garantia de que os resultados serão acatados internamente na Venezuela".

O grupo idealizado pelo Brasil teria até Portugal e Espanha, mas principalmente países latino-americanos, como Chile, México, Colômbia e, talvez, Peru.

As duas questões mais difíceis de fechar num acordo para a Venezuela são quanto a prazos e a adaptações legais e institucionais. Pela atual Constituição, haverá em agosto um "referendo advocatório" que poderá interromper o mandato de Chávez, caso ele não tenha um voto a mais de apoio do que os 57% que teve ao ser eleito.

Para antecipar esse referendo ou convocar eleições gerais a curto prazo, seria necessário reformar a Constituição que foi elaborada já no mandato de Chávez. A OEA, com o apoio do Brasil, não admite uma antecipação que não seja rigorosamente legal.

Lula desembarca em Quito, oficialmente para a posse do novo presidente do Equador, Lucio Gutiérrez, disposto a tentar um meio-termo entre a posição de Chávez, que quer esperar até agosto, e das oposições, que exigem a renúncia já ou a antecipação de eleições.

Vários outros dirigentes latino-americanos, entre eles o ditador de Cuba, Fidel Castro, também estarão presentes à posse do coronel esquerdista Gutiérrez _que, assim como Chávez, participou de um golpe de Estado, em 2000.

O embaixador Ruy Nogueira foi acionado pelo Itamaraty para pegar uma carona com Chávez e participar do almoço dos dois presidentes. Ontem, ele defendeu a ajuda do Brasil à Venezuela para contornar os efeitos da greve geral, iniciada no dia 2 de dezembro.

"O risco é o desabastecimento, porque os supermercados já estão ocos. Isso significa forte ameaça de saques e violência", disse, por telefone, contando que desde sexta-feira (10) há racionamento de combustíveis dentro de Caracas. Há casos de carros que dormem em filas durante mais de 24 horas para conseguir 30 litros de gasolina.

Diálogo com a oposição
O governo brasileiro reagiu ontem à oposição venezuelana, que pediu nos EUA a exclusão do Brasil do "grupo de amigos".

"Eu não tenho nenhuma restrição a falar com ele, no lugar e no momento adequados", disse Celso Amorim, aludindo a Timoteo Zambrano, um dos oposicionistas que pediram o veto ao Brasil.

Mais ainda: a intenção da diplomacia brasileira ao trabalhar o "grupo de amigos" é não só a de dialogar também com a oposição, mas a de oferecer a ela um horizonte. A avaliação que a Folha de S.Paulo obteve junto ao governo Lula é a de que um dos motivos para a radicalização da oposição é o fato de que ela não acreditam que Chávez cumpra qualquer acordo.

O aceno à oposição não quer dizer que o Brasil tenha mudado de posição em relação ao respaldo que dá a Chávez. Continua dizendo que ele é o presidente legítimo e constitucional, daí o apoio. Mas insiste, ao mesmo tempo, em que Chávez negocie com a oposição.

"A solução da crise não pode configurar capitulação de uma das partes ou confronto", diz Amorim. Ele enfatiza também as condições fixadas pela OEA para um eventual acordo: a solução teria de ser constitucional, pacífica, democrática e eleitoral.

Todas essas boas intenções colidem, no entanto, com a inflexibilidade das posições das partes.

O caso de Zambrano é ilustrativo: quando Marco Aurélio Garcia esteve na Venezuela, no final do mês passado, ouviu de autoridades "chavistas" que um dos interlocutores oposicionistas que ele deveria ouvir seria Zambrano. Era considerado um moderado.

Marco Aurélio bem que tentou o contato, mas Zambrano, como medo do patrulhamento dos radicais da oposição, refugou. Depois, Zambrano tornou-se uma das vozes mais críticas às posições do governo Lula na crise.

Colaboraram Clóvis Rossi, colunista da Folha de S.Paulo, e André Soliani, da Sucursal de Brasília

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