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20/03/2003 - 05h10

Presidente George W. Bush herda influências do pai

FERNANDO CANZIAN
da Folha de S.Paulo, em Washington

Uma porta giratória entre o público e o privado. Entre interesses difusos em relação ao Oriente Médio e lucros, participações e fortunas construídas em negócios com empresas de petróleo.

Assim críticos vêem o chamado gabinete de guerra do republicano George W. Bush, máquina montada à sombra do pai, o ex-presidente George Bush (89-92).

Por outro lado, o time de Bush filho é visto também como um exemplo bem acabado da América corporativa. De homens de sucesso preocupados com a hegemonia e a segurança dos Estados Unidos, especialmente após os ataques terroristas de 2001. Seriam patriotas duros e inquietos, a ponto de estarem dispostos a repetir, agora, uma guerra considerada não terminada há 12 anos.

Bush filho e Bush pai têm muito em comum: vocação para os negócios com petróleo, a preferência pelo mesmo tipo de assessores bem-sucedidos e uma grande sensibilidade em relação a Saddam Hussein e ao Oriente Médio.
Além de ter seguido o pai nos negócios há dez anos, Bush filho herdou do progenitor a parte mais influente de seu governo.

O vice-presidente, Dick Cheney, e dois dos mais importantes colaboradores, o secretário de Estado, Colin Powell, e a assessora de Segurança Nacional, Condoleezza Rice, trabalharam para Bush pai. Assim como o atual secretário-adjunto de Defesa, Paul Wolfowitz, considerado o mais ''linha-dura'' da atual administração.

Como o pai, George W. Bush empreendeu grande parte de sua vida empresarial trabalhando em empresas do ramo de petróleo. No início dos anos 90, foi diretor da Harken Energy, no Texas, terra natal do óleo e da família Bush nos EUA. Dos seus negócios à época, o mais polêmico veio a público recentemente, quando foi revelado que o presidente vendeu, há dez anos, US$ 848 mil em ações dois meses antes de a Harken reportar um inesperado prejuízo.

O petróleo irriga também a biografia empresarial de Cheney. O vice-presidente era o secretário de Defesa de George Bush pai quando os EUA atacaram o Iraque na Guerra do Golfo, em 1991.
Embora tenha ganho a guerra, Bush pai perdeu a eleição mais à frente, emaranhado em números ruins na economia doméstica.

Imediatamente após a derrota do chefe, Cheney partiu para a iniciativa privada, na direção de companhias que tinham interesse no petróleo do Oriente Médio.

Em 1995, tornou-se presidente da Halliburton, a maior companhia do mundo em serviços relacionados a petróleo, também com sede em Dallas, no Texas. Coincidentemente, a Halliburton foi uma das empresas que mais se beneficiaram dos contratos para a reconstrução do Kuait libertado do Iraque pela máquina de guerra do então secretário Cheney.

Entre 96 e 99, a Halliburton também obteve contratos diretos do Pentágono que somaram cerca de US$ 1,8 bilhão para a construção de infra-estrutura dirigida a intervenções americanas no Haiti, na Bósnia e no Kosovo. Por seu trabalho de cinco anos na Halliburton, Cheney teria acumulado US$ 39 mi entre salário e ações.

Condoleezza Rice, assessora de Segurança Nacional, teve trajetória semelhante. Embora pertença a Colin Powell o cargo de secretário de Estado de Bush filho, é Condoleezza quem leva a fama de ter acesso aos ouvidos do presidente. Depois de Cheney, é a pessoa com mais influência sobre Bush, ocupando escritório na Casa Branca bastante próximo ao Salão Oval.

Para Bush pai, Condoleezza serviu no mesmo departamento que agora comanda, dando conselhos sobre Rússia (ela fala a língua fluentemente) e Leste Europeu. No setor petrolífero, trabalhou de 91 a 93 na Chevron Oil, que recentemente batizou orgulhosamente com o nome Condoleezza um de seus maiores petroleiros.

Também envolvido em negócios lucrativos e egresso do governo Bush pai, o atual secretário de Estado, Colin Powell, saiu com fama de herói da guerra contra o Iraque em 91. Soldado profissional por 35 anos até chegar a general de quatro estrelas e comandar as Forças Armadas americanas, de onde gerenciou a guerra contra os iraquianos, Powell é considerado um exemplo de ''afro-americano'' que subiu na vida.

Criado no sul do Bronx, em Nova York, e filho de imigrantes jamaicanos, Powell revelou sua saga em 1995 na biografia ''My American Journey" (Minha Jornada Americana). O livro alcançou um sucesso de vendas digno do desempenho de seu autor no mundo dos negócios.

Powell trabalhou durante anos como membro da direção da gigante de serviços de internet America Online (AOL), onde teria começado a acumular uma fortuna estimada em US$ 50 milhões em ações de empresas de comunicação e tecnologia.

Além do próprio cargo, Powell tem no governo Bush seu filho, Michael, como presidente da Comissão Federal de Comunicação. Embora a controvertida fusão entre a AOL e a Time Warner tenha sido aprovada em 2000, antes do início do governo Bush, muitos democratas vêem a influência de Michael Powell em decisões regulatórias que favoreceram a AOL recentemente.

No campo de batalha, Powell ajudou a comandar também a invasão do Panamá em 89, para depor e prender o ditador Manuel Antonio Noriega, que os próprios EUA haviam ajudado a subir ao poder.

Mas é o secretário de Defesa de George W. Bush quem tem o papel mais controvertido dentro do atual gabinete de guerra dos EUA.

Também com passagens bem-sucedidas no setor empresarial, Donald Rumsfeld presidiu duas das 500 maiores companhias listadas pela ''Fortune'', a farmacêutica G.D. Searle e a empresa de tecnologia General Instrument.
Com uma fortuna pessoal estimada em quase US$ 150 milhões em ações e participações em empresas de energia, internet e biotecnologia, Rumsfeld mantém o padrão do governo. Mas, ironicamente, pesa contra ele o fato de ter ajudado a criar o Saddam Hussein que agora planeja destruir.

Trabalhando como assessor especial para o ex-presidente Ronald Reagan (1981-89) no início dos anos 80, Rumsfeld visitou pelo menos duas vezes o Iraque do então chamado ''presidente'' Saddam Hussein.

O objetivo era estreitar relações e dar suporte ao país durante a guerra Irã-Iraque (80-88), com americanos a favor de iraquianos.

Documentos revelados há um mês mostram que Rumsfeld sabia dos planos de Saddam para construir armas químicas e biológicas e que nada fez para impedi-lo. Depois de trocar sorrisos e apertos de mãos com o agora ditador, os EUA reatam, em 1984, relações diplomáticas com o Iraque _rompidas desde 67.

Ao final da guerra com o Irã, os iraquianos receberam ainda ajuda financeira e aval dos americanos para conseguir empréstimos. O objetivo declarado dos EUA no episódio todo foi o de ''manter a presença americana no Oriente Médio e resguardar as reservas de petróleo na região''.

Essa é a segunda passagem de Rumsfeld pelo Pentágono. No governo de Gerald Ford (1974-77), assumiu a defesa do país com a missão de reerguer o moral das tropas após o fracasso no Vietnã.

Conhecido por sua preferência por equipamentos militares caros e sofisticados, Rumsfeld é um dos maiores incentivadores de projetos como o escudo antimísseis conhecido como Guerra nas Estrelas e de controvertidos caças-bombardeiros para a Força Aérea americana. Entre seus feitos, há ainda o fato de ter ajudado a acabar com as ''limitações infligidas aos EUA'' pelo tratado antimísseis balísticos conhecido como ABM, de 72, que previa a redução do arsenal atômico no mundo.

A possível deposição de Saddam Hussein terá um gosto especial, no entanto, para outro personagem do gabinete de guerra de Bush filho saído das hostes do pai.

Paul Wolfowitz, secretário-adjunto de Defesa, é tão discreto quanto belicoso em relação a países suspeitos de abrigar terroristas. Foi um dos maiores incentivadores da guerra contra o governo Taleban do Afeganistão em 2001 e um dos únicos a defender publicamente, em 1991, a invasão de Bagdá e a deposição cabal de Saddam Hussein.

Na época, as idéias de Wolfowitz, então assessor de Cheney no Departamento de Defesa, foram contidas pela ação diplomática interna do general Colin Powell, então chefe das Forças Armadas.

Powell temia uma ebulição descontrolada nos países árabes vizinhos ao Iraque caso isso ocorresse. O maior temor não era em relação à retirada de Saddam, mas à ocupação maciça de tropas norte-americanas em uma das regiões mais sensíveis do mundo, de resto completamente dominada pelo islamismo.

Ao que tudo indica, desta vez Colin Powell terá finalmente a sua tese colocada à prova.

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